APOSTILA DO CURSO

 

Introdução à Astronomia,

Estrelas, Galáxias e Cosmologia

  

Florianópolis, setembro de 2004


 

CAPÍTULO 1

A Descoberta do Cosmos

 

Antônio C. de Lucena

Nilton O. Cunha

 

CAPÍTULO 1

PARTE 1

Aspectos Históricos

  

Antônio C. de Lucena


CAPÍTULO 1 - A DESCOBERTA DO COSMOS

1.1. Aspectos Históricos

1.1.1. Introdução

            A Astronomia é uma das mais antigas ciências humanas, senão a mais antiga. A Astronomia, como de resto todas as ciências, surgiu das necessidades práticas do ser humano, notadamente aquelas mais ligadas à sua sobrevivência.

            Desta forma, cedo o homem percebeu que a natureza apresenta ciclos, que se repetem periodicamente: ao dia sucede a noite; a uma época quente sucede uma época fria e assim por diante.

            O homem também percebeu que a parte clara do dia ocorria quando o Sol era visível, enquanto que à noite o mesmo desaparecia. Também notou que na época quente o Sol, no meio do dia, ficava praticamente bem alto no céu, próximo ao topo de sua cabeça, enquanto que na época fria o mesmo se afastava na direção do sul (para os povos do hemisfério norte).

            Praticamente todos os ciclos da natureza são regidos por fenômenos astronômicos. Para o homem primitivo, o conhecimento de tais ciclos era de importância vital, pois dele dependia a sua sobrevivência.

            Assim, estima-se que, há mais de 10.000 anos atrás, os antigos pastores e agricultores já usavam o Sol e a Lua para a marcação do tempo. Da observação dos movimentos diário e anual do Sol o homem primitivo logo notou a conexão existente entre a posição do Sol e a existência do dia e da noite, bem como da existência das estações. As demais divisões do calendário, a semana e o mês, devem-se, provavelmente, a observação do movimento da Lua.

            Como é óbvio, logo o homem percebeu que durante a parte clara do dia, praticamente somente um astro era visível: o Sol.

            Algumas vezes a Lua também era visível.

            Entretanto, durante a noite (parte escura do dia), além da Lua, uma miríade de pequenos pontos luminosos se tornavam visíveis. Praticamente todos esses pontos permaneciam fixos, uns em relação aos outros noite após noite, ano após ano, apesar de no decurso de uma noite todo o conjunto se movesse de uma forma ordenada, que se repetia imutavelmente noite após noite. Estes objetos eram as estrelas.

            Cedo, porém, o homem percebeu que haviam sete pontos luminosos que se deslocavam em relação aos outros (fixos) e tal movimento era perfeitamente detectável num determinado período, um ano digamos. Também percebeu que alguns destes pontos se moviam mais rapidamente do que os outros e que havia dois pares que nunca eram visíveis ao mesmo tempo, além de só  serem visíveis após o pôr ou antes do nascer do Sol. Assim, ora eram visíveis, antes do nascer do Sol, dois destes pontos; ora era visível somente um e as vezes não era visível nenhum. Por outro lado após o pôr do Sol o fenômeno se repetia. Entretanto, nunca se observava ambos os pontos após o pôr do Sol e ambos os pontos antes do nascer do Sol do dia seguinte. A percepção de que estes quatro pontos eram na realidade somente dois marcou um progresso realmente notável nos conhecimentos astronômicos dos antigos. Os cinco pontos restantes eram os planetas que hoje conhecemos como Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno, sendo que os dois primeiros eram os que nunca eram visíveis após o pôr do Sol de um dia e o nascer do Sol do dia seguinte.

            Além dos pontos luminosos, o homem primitivo logo percebeu a existência de uma grande mancha luminosa, de forma alongada que cruzava o firmamento de um lado ao outro e que mudava de posição durante o decorrer do ano, apesar de se manter sempre fixa em relação aos pontos fixos (as estrelas). Esta mancha era o que hoje conhecemos como a Via Láctea, e que é apenas parte da nossa galáxia.

            Também eram perceptíveis pequenas manchas luminosas, com a aparência de pequenas nuvens e que, como as estrelas, também não se movimentavam umas em relação as outras.  Estes objetos eram o que hoje se conhece por nebulosas.    

            Ocasionalmente apareciam corpos luminosos, de aparência nebulosa e geralmente apresentando uma espécie de cauda e que, como os planetas, se movimentavam pelo céu mas, ao contrário destes, desapareciam após serem visíveis por algum tempo. Eram os objetos que hoje conhecemos como os cometas.

            Finalmente, e bastante freqüentemente, muitas vezes em diversas ocasiões numa mesma noite, eram visíveis pequenas bolas luminosas que riscavam o céu em alta velocidade, deixando atrás de si um risco incandescente que se desvanecia rapidamente. Eram o que atualmente se conhece como os meteoros.

1.1.2. Astronomia Antiga

            Nos tempos antigos, quando ainda não havia a ciência, na concepção que temos hoje em dia, o homem era dominado totalmente por superstições e por mitos.

            Da observação continuada do céu, o homem antigo não tardou a perceber certas configurações que lhe lembravam certas figuras, mitológicas ou não. Nasceram assim as constelações, ou asterismos. Esta primeira classificação, de caráter direcional, pode ser considerada uma primeira tentativa de se estudar o céu de uma maneira científica. Cada povo criou suas próprias constelações. Os antigos também perceberam que certas estrelas são mais brilhantes que outras, o que levou a uma classificação pelo brilho aparente. Apesar de seguramente os antigos terem notado que as cores das estrelas não são todas iguais, não se tem notícia de uma classificação pela cor. Entre os povos antigos que deixaram registros de seus estudos astronômicos temos os chineses, os hindus, os árabes, os egípcios, os babilônios e os gregos, entre outros de menor expressão.

 

1.1.2.1. Chineses

            As primeiras observações sistemáticas de que se tem registro pertencem à antiga civilização chinesa. Muitas observações de cometas e de eclipses, tanto do Sol quanto da Lua, estão registradas. Os conhecimentos astronômicos dos chineses eram bastante grandes para a época, uma vez que seus astrônomos eram capazes de prever com exatidão a ocorrência dos eclipses tanto do Sol quanto da Lua.

1.1.2.2 Hindus e árabes

            Suas contribuições à Astronomia, nos tempos antigos, não foram muito grandes, mas deram grandes contribuições à matemática

1.1.2.3 Egípcios e babilônios

            Os antigos egípcios adquiriram conhecimentos astronômicos bastante avançados para a época. Assim, por exemplo, além de serem capazes de prever a ocorrência de eclipses, já usavam a estrela Sírius (a estrela mais brilhante do céu) para determinar a época das cheias do rio Nilo. Muitos dos deuses egípcios eram ligados aos astros.

            Os sacerdotes babilônios, de modo similar, também possuíam conhecimentos astronômicos bastante grandes, uma vez que, além de preverem a ocorrência dos eclipses com uma antecedência de vários anos, descobrirem o que hoje se chama de período metônico, de aproximadamente 18,6 anos, e que rege a ocorrência dos eclipses. Também descobriram a precessão dos equinócios.

1.1.2.4 Gregos

            Foi na antiga Grécia que a astronomia teve o maior avanço dos tempos antigos.

            Assim, além de elaborarem um dos primeiros catálogos de estrelas, juntamente com um mapa celeste, os antigos gregos constataram que a Terra era esférica, inclusive estimando as dimensões desta esfera.

            Houve também um grande estudo dos movimentos dos astros, dos eclipses, dos cometas e dos meteoros. A elaboração dos calendários também teve um grande avanço.

            Foi também na antiga Grécia que surgiram as primeiras tentativas de explicar o Universo de um modo racional (filosófico e/ou científico), sem a necessidade de se apelar para divindades. Como resultado dessas tentativas, surgiram duas teorias antagônicas: o geocentrismo e o heliocentrismo.

            O geocentrismo teve sua origem no século IV a.C., e um de seus principais artífices foi Eudóxio de Cnidos. Segundo a teoria geocêntrica, a Terra ocupava o centro do Universo, ao redor do qual tudo o mais girava. Esta concepção está muito alicerçada no que se observa e, apesar de sabermos hoje em dia que ela não é correta, ainda hoje ela é utilizada para determinados fins práticos. Esta teoria foi defendida e aperfeiçoada por Aristóteles e seu discípulo Apolônio. Finalmente, esta teoria atingiu o seu ápice com Ptolomeu e manteve-se até o século XVI d.C.

            O heliocentrismo, por outro lado, teve sua origem no século II a.C., por meio de Aristarco de Samos. Segundo a teoria heliocêntrica, o Sol é que ocupava o centro do Universo, ao redor do qual giravam todos os outros planetas, inclusive a Terra, bem como a chamada esfera das estrelas fixas. A Lua, segundo esta teoria, giraria em torno da Terra. Apesar de hoje sabermos que este sistema, embora não sendo totalmente correto, pois o Sol não ocupa o centro do Universo e nem existe uma esfera das estrelas fixas, é mais correto do que o sistema geocêntrico, o mesmo não encontrou aceitação, sendo relegado ao esquecimento, até ser ressuscitado quase 1.800 anos depois.

1.1.3. Astronomia Medieval

            Durante a Idade Média, que foi a época que se seguiu à queda do Império Romano, no ocidente a ciência em geral e a astronomia em particular sofreram uma interrupção em seu desenvolvimento, em alguns casos tendo havido até um retrocesso. Esta época foi marcada pela preponderância do pensamento religioso sobre o pensamento filosófico e científico, principalmente sobre este último.

            Durante esta época, a astronomia continuou sendo estudada entre outros povos que não os da Europa. Entre estes povos, se sobressaem os árabes, que nesta época deram a sua maior contribuição ao estudo da astronomia em particular e da ciência de um modo geral. Esta é uma das principais razões pela qual os nomes próprios da grande maioria das estrelas que os possuem são nomes de origem árabe.

1.1.4. Astronomia Renascentista

            O Renascimento, que começou na Europa no decorrer do século XV, marcou, entre outras coisas, uma nova atitude do homem frente à natureza em geral e aos fenômenos celestes em particular.

            Assim, em 1543, ano de sua morte, Nicolau Copérnico publica o seu livro, no qual expõe um sistema heliocêntrico, ressuscitando assim o sistema proposto por Aristarco quase 2.000 anos antes.

            Ao trabalho de Copérnico, seguiu-se os trabalhos de Tycho Brahe e os de Johannes Kepler, sendo que este último estabeleceu as leis do movimento planetário, leis essas que até hoje levam o seu nome.

            Os trabalhos de Galileu, além de fornecerem muitas evidências em favor do modelo heliocêntrico, estabeleceram firmemente as bases do método científico. Por esta razão, Galileu é considerado o pai da ciência moderna em geral e da física moderna em particular. Galileu também utilizou pela primeira vez a luneta para perscrutar o céu e com isso inaugurou uma nova era nas observações do céu, uma vez que até então as mesmas eram feitas a olho nu.

            No século XVII, Isaac Newton, que é por muitos considerado um dos maiores gênios, senão o maior, que a humanidade já produziu, estabeleceu as suas famosas leis (princípios) do movimento, bem como a lei (princípio) da gravitação universal e assim unificou, numa única teoria, a mecânica do céu com a mecânica da terra.

            O próximo grande passo ocorreu no século XVIII, quando William Herschel, além de descobrir o planeta Urano, que era desconhecido até então, uma vez que é praticamente invisível a olho nu, intuiu que algumas das chamadas nebulosas seriam, na realidade, sistemas estelares semelhantes ao nosso próprio sistema, a Via Láctea.

            Até este ponto da pesquisa astronômica, praticamente toda a informação que o homem colhia sobre os astros se baseava quase que exclusivamente na luz visível por eles produzida ou refletida. Assim, tudo o que se podia determinar era a direção da qual provinha a luz, bem como a sua intensidade. Um outro aspecto da luz que podia ser facilmente notado era a sua cor, se bem que este aspecto, aparentemente, não impressionou muito os antigos astrônomos.

            Com o advento da espectroscopia, no final do século XVIII e início do XIX, um novo horizonte se abriu para a pesquisa astronômica, uma vez que a comparação da luz emitida pelos astros com a emitida pelos elementos químicos permitiu inferir a composição química daqueles. Este evento marcou o nascimento da astrofísica, que é, provavelmente, o ramo mais importante da astronomia hoje em dia.

            Ainda assim era somente a luz visível a única fonte de informação que o homem dispunha para estudar os astros.

1.1.5. Astronomia Moderna

            No final do século XIX e início do XX, foram descobertas novas fontes de informação astronômica.

            Assim, foram descobertos os raios cósmicos, que são uma radiação de partículas materiais que atingem a Terra, vindas do espaço exterior, o que propiciou a abertura de uma nova frente de pesquisa na astronomia.

            Com relação à radiação eletromagnética (da qual a luz visível é uma pequena porção), foram descobertos meios de se detectar, com a ajuda de instrumentos, radiações com comprimento de onda menor e com comprimento de onda maior do que o da luz visível. Assim, no estudo das radiações com comprimento de onda maior que o da luz visível temos a radioastronomia, que hoje se constitui numa das fontes mais ricas de informação astronômica. Nesta mesma faixa, com o advento dos satélites artificiais, tem-se desenvolvido bastante a astronomia do infravermelho. Já nos comprimentos de onda menores que os da luz visível, temos a astronomia do ultravioleta, dos raios X e dos raios Gama. Esses desenvolvimentos são bem mais recentes e se encontram ainda na sua infância e se devem basicamente ao surgimento dos satélites artificiais (elementos extra atmosféricos de um modo geral).

            O desenvolvimento das sondas espaciais trouxe um conhecimento do Sol e dos planetas do sistema solar, somente nos últimos anos, maior do que o adquirido pela humanidade desde o seu surgimento na face da Terra até o início deste período. Atualmente, somente o sistema de Plutão ainda não foi visitado por uma sonda espacial.

            Como resultado destes desenvolvimentos, o homem ampliou consideravelmente o seu conhecimento sobre o Universo que habita, se bem que muitas (a maioria, talvez) das questões colocadas pela mente humana ainda permaneçam sem resposta.

            O próximo grande passo a ser dado nas técnicas de detecção se referem à detecção das chamadas ondas gravitacionais e a detecção do neutrino, uma partícula material da física moderna que possui todos os atributos de um “fantasma”.

            Quando o homem dominar as técnicas de detecção tanto das ondas gravitacionais quanto dos neutrinos, teremos então o nascimento da astronomia das ondas gravitacionais e da astronomia dos neutrinos e se supõe que o conhecimento astronômico será de tal monta que tudo o que se conhece atualmente (com as necessárias correções, que inevitavelmente ocorrerão) não passará de uma pequena parte do todo.

            Num futuro ainda mais remoto, poderão ser desenvolvidas técnicas para a detecção dos chamados táquions, que seriam partículas hipotéticas, que sempre se movem mais rápido que a luz.

1.1.6. Resumo

            Vimos nos itens anteriores, de forma sucinta, como evoluiu, no decorrer do tempo, o conhecimento humano sobre o universo que habitamos. Vimos que durante a maior parte de sua história, as observações astronômicas foram feitas a olho nu e que o único tipo de radiação utilizada era, obviamente, a luz visível. Posteriormente foram utilizados instrumentos, bem como se passou a utilizar outros tipos de radiação que não a luz visível.

Desta forma, podemos dividir a história da astronomia em duas grandes partes, segundo a utilização ou não de instrumentos (ópticos e outros) para efetuar as observações:

            a. Sem o uso de instrumentos ópticos (astronomia a olho nu).

            Desde o início dos tempos até o século XVII. Este período engloba o que aqui se denominou de Astronomia Antiga e de Astronomia Medieval.

            b. Com o uso de instrumentos ópticos (e outros instrumentos não ópticos).

            Desde o século XVII até os nossos dias. Este período engloba o que hoje se chamou de Astronomia Renascentista e de Astronomia Moderna.

            Já quanto ao tipo de radiação utilizada para se obter as informações, a história da astronomia pode igualmente ser dividida em duas grandes partes.

            a. Exclusivamente luz visível (parte do espectro eletromagnético).

            - Desde o início dos tempos até praticamente o final do século XIX.

            b. Demais partes do espectro eletromagnético e outros tipos de radiação.

            - Desde o final do século XIX até os nossos dias.

            O futuro (?) vislumbrável, pelo menos atualmente, nos levará a desenvolver técnicas que permitam a detecção de mais tipos de radiação que, segundo se acredita, deverá aumentar consideravelmente o nosso conhecimento do Universo:

            ð Ondas gravitacionais.

            ð Neutrinos.

            Finalmente, num futuro ainda mais remoto, poderão ser desenvolvidas técnicas de detecção dos táquions, se os mesmos realmente existirem.

 

CAPÍTULO 1

PARTE 2

 

Conceitos Básicos

Nilton O. Cunha

 

1.2. Conceitos Básicos

1.2.1. Introdução

            As noções de matéria, eletricidade e energia mantêm, entre si, estreitos liames e interferem no estudo de todos os fenômenos objetos das ciências físicas. A eletricidade interfere na estrutura dos átomos; a matéria constitui-se em admirável reservatório de energia.

            A matéria apresenta-se nos três estados fundamentais: sólido, líquido e gasoso. Qualquer que seja o estado da matéria e sua natureza, ela apresenta sempre uma característica essencial, que consiste em opor certa resistência ao deslocamento, ao que se denomina "massa".

            A eletricidade evidencia uma propriedade essencial: dois corpos com cargas elétricas de mesmo nome e sinal se repelem, enquanto que dois corpos dotados de cargas de nomes contrários se atraem.

            A energia pode ser identificada, no mais das vezes, concentrada na matéria, que lhe serve de suporte ou reservatório. Mas pode manifestar-se igualmente liberta da matéria, na condição de partículas denominadas elétrons (carga elétrica negativa) e prótons (carga positiva). Também na energia radiante todo suporte material desaparece, restando como condutor da energia o "fóton" - partícula emitida a partir de determinadas alterações do átomo.

            Muitos fenômenos das ciências físicas somente permitem explicação devido aos conhecidos "princípio da conservação da matéria", "princípio da conservação da eletricidade", "princípio da conservação da energia".

1.2.2. A natureza da matéria

            ð Molécula

            É possível dividir a matéria em fragmentos sempre menores até um limite sem alterar a sua natureza - essa unidade de dimensões microscópicas é a molécula.

            As moléculas dos sólidos, líquidos e gases movem-se incessantemente. Nos sólidos, as moléculas acham-se animadas de rápidas vibrações em torno de uma posição média, porém estes movimentos são de pequena amplitude, devido à coesão da matéria sólida. Nos líquidos, as moléculas têm movimentos mais livres e os deslocamentos podem assumir amplitudes ponderáveis, conforme demonstram os fenômenos de difusão, tão intensos no seio da massa líquida. Suas velocidades, difíceis de medir com precisão, parecem consideráveis. Devido aos numerosos choques a que estão sujeitas, em face da proximidade de uma das outras, o caminho percorrido por uma molécula entre duas colisões é extremamente pequeno. Este percurso é maior nos gases, embora seja bem reduzido quando o gás está na pressão comum. A velocidade aumenta com a temperatura, mas independe da pressão. Para o caso da molécula do oxigênio, tem-se: velocidade média de 425 metros por segundo, que é igual a 1.500 quilômetros por hora; percurso médio à pressão atmosférica e temperatura de zero graus Celsius é de 1/10.000 mm. Daí resulta que uma molécula deve encontrar outra em 4,7 x 109 = 5 bilhões de vezes por segundo.

            O número de Avogadro representa o número N de moléculas elementares existente numa molécula-grama M de uma substância qualquer.

N = 6,02x1023

            O número de Avogadro permite calcular a massa real m dos átomos e das moléculas, mediante a relação:

m = M/N (gramas)

            ð Átomos

            O átomo representa a menor quantidade de um corpo simples passível de intervir numa molécula.

            A maioria das moléculas das substâncias simples (H2, N2, Cl2, O2 etc.) é formada pela justaposição de dois átomos (diatômicas); algumas outras (hélio, argônio, neônio, criptônio, xenônio, mercúrio em vapor) são monoatômicas. O ozônio (O3) é uma substância triatômica. Um reduzidíssimo número são tetra - atômicas (fósforo, arsênio, antimônio). Há moléculas orgânicas que contém até milhares de átomos.

            ð Partículas subatômicas

            As teorias modernas do átomo nasceram com as descobertas relativas à radioatividade. Admite-se, hoje, que o átomo não é um ente homogêneo mas, pelo contrário, identificâmo-lo a um complexo edifício, composto de um centro - o núcleo - com carga elétrica positiva, em torno do qual gravitam corpúsculos de eletricidade negativa - os elétrons. A carga elétrica total dos elétrons é equivalente à carga elétrica do núcleo em valores absolutos, o que faz o átomo eletricamente neutro.

            Entretanto, sob diversas influências um átomo pode perder um ou vários de seus elétrons satélites ou captar elétrons suplementares. No primeiro caso ele se comporta como um corpo neutro do qual retiramos eletricidade negativa, ou seja, a sua eletrização passa a ser positiva: o átomo transforma-se num íon positivo mono, bi ou trivalente, conforme perca um, dois ou três elétrons por átomo primitivo. No segundo caso troca-se um íon negativo mono, bi ou trivalente, se o átomo primitivo capta um, dois ou três elétrons suplementares. Os átomos dos metais possuem facilidade especial de perder elétrons e, por conseguinte, fornecer íons positivos (cátions). Os átomos dos metalóides, ao contrário, capturam facilmente elétrons suplementares a fim de gerar íons negativos (ânions).

            Os elétrons negativos são chamados "négatrons". Um négatron em repouso ou animado de fraca velocidade possui uma massa aproximadamente igual a 0,9x10-27 grama. As dimensões do elétron não são conhecidas com a mesma precisão que a massa. Estima-se que o raio seja 100.000 vezes menor que o diâmetro do átomo. O átomo de hidrogênio é, grosso modo, uma esfera de raio igual a 10-7 mm; em outros termos, 10 milhões de átomos de hidrogênio, dispostos em linha, formariam uma cadeia de um milímetro de comprimento. Parece que os outros elementos químicos têm dimensões de mesma ordem de grandeza, embora as suas massas possam ser consideravelmente maiores em relação à massa de H. A massa do elétron é cerca de 1/1.840 da massa do átomo de H.

            O négatron ou elétron negativo foi evidenciado primeiro em 1869 pelo físico alemão Hittorf e depois pelo sábio inglês William Crookes, a partir de 1879 através do tubo de raios catódicos.

            A existência do próton foi evidenciada em 1911 por Rutherford utilizando bombardeios com raios alfa de corpos radioativos sobre elementos leves (nitrogênio, boro, flúor, sódio, alumínio, fósforo), quando então constatou-se que esses elementos emitem partículas com massa igual à do átomo de H e de carga positiva equivalente a do elétron negativo - essas partículas, integrantes do núcleo do átomo, são os prótons. O próton tem quase a mesma dimensão que o elétron, mas a sua massa é consideravelmente maior.

            No núcleo encontram-se partículas com carga elétrica positiva e massa equivalentes, respectivamente, à carga e à massa do elétron - são os pósitrons. Eles foram descobertos em 1932 pelos físicos Anderson, Blacket e Occhialini, no curso de pesquisas sobre os raios cósmicos. Os pósitrons (positivos), ao contrário do elétrons (negativos), são efêmeros - sua vida é da ordem de 10-8 segundo no ar. Eles se destróem ao atravessarem a matéria, dando origem a uma radiação gama. No momento que o pósitron se encontra com o elétron, estas partículas antitéticas aniquilam-se mutuamente, produzindo uma descarga de energia.

            Em 1930, os físicos alemães Bothe e Becker, ao submeterem certos elementos leves (particularmente o boro e o alumínio) à ação de raios alfa fornecidos por uma fonte de polônio ou pela emanação do rádio, constataram a produção de uma radiação extremamente penetrante - mais penetrante até que os raios gama emitidos pelos radioelementos - e suscetíveis de atravessar, sem se enfraquecerem sensivelmente, vários centímetros de chumbo. Esta radiação é o "nêutron", de massa bem próxima da do próton, mas sem qualquer carga elétrica. A ausência de eletrização explica o grande poder de penetração que o faz passar entre os constituintes eletrizados dos corpos materiais sem sofrer atração capaz de modificar sua trajetória ou retardar o seu deslocamento, a menos que encontre o núcleo de um átomo, fato raro devido ao diminuto tamanho dos núcleos.

Outras partículas têm a sua existência reconhecida. Os neutrinos são partículas hipotéticas idealizadas por Pauli para manter válido o princípio da conservação da energia nos processos de desintegração beta. Partícula eletricamente neutra e destituída de massa, pequeníssimo comprimento de onda, o neutrino possui uma propriedade singular: a capacidade de atravessar paredes de aço de qualquer espessura imaginada, nada a detém. Mésons, bárions e mais de cem outras partículas interagem umas com as outras e a maioria tem uma vida extremamente breve. Todas, aliás, parecem construídas a partir de partículas ainda mais elementares - os "quarks" e os "antiquarks" -, hipótese ainda mais perturbadora porque ainda nem se sabe se essas partículas existem. Mais perturbador, de resto, é o fato de que essas partículas não são verdadeiramente corpos materiais, porém que cada uma consiste antes de um conjunto de propriedades ligadas aos seus números quânticos.

            Os fótons ou quanta de luz são partículas emitidas pelo átomo quando ocorre uma perturbação em seu interior, devido à variação do nível de energia, originando a emissão de onda luminosa, raio X, calor.

Os isótopos são estruturas atômicas, ligeiramente diferenciadas, de um mesmo elemento. Todos os isótopos de um mesmo elemento possuem o mesmo "número atômico" - número de prótons do núcleo. Só diferem em seus pesos atômicos, quer dizer, no número total de partículas de cada núcleo, porque alguns possuem mais nêutrons que outros. Embora isto não altere o seu comportamento químico, modifica algumas propriedades físicas. Às vezes são instáveis, isto é, radioativos - chamados radioisótopos. Exemplo: o núcleo do estanho tem cinqüenta prótons e setenta nêutrons.

            Retirando (ou acrescentando) um nêutron do núcleo, continuaria a ser um núcleo de estanho, apenas mais leve (ou mais pesado). E o átomo resultante seria um isótopo do átomo primitivo.

            Se, porém, ao invés de nêutrons retirássemos um ou mais prótons, o átomo resultante já não seria o mesmo. Sendo o núcleo do mercúrio de 80 prótons, se retirássemos um próton, restariam 79 prótons. Segundo a tabela periódica dos elementos, está-se diante de um núcleo de ouro. Esta operação denomina-se "transmutação". E o fenômeno da radioatividade consiste na transmutação, juntamente com a emissão de raios alfa e raios gama. A radioatividade artificial foi descoberta por Frederic e Irenne Juliot-Curie (filha de Pierre e Marie Curie) em 1934

QUADRO I

AS DUAS FAMÍLIAS DE PARTÍCULAS ELEMENTARES

Família dos quarks

Família dos léptons

Dos seis, apenas dois, o up e o down, conseguem se manter inteiros na natureza por muito tempo. Os outros precisam de mais energia e se desintegram com muita rapidez.

O pai de todos, o elétron, tem duas versões mais pesadas: o múon e o táuon. Seus irmãos, os neutrinos (n), não possuem carga e talvez nem massa. Carga: +1 ou -1.

UP

C= 2/3

DOWN

C= -1/3

ELÉTRON

C = -1

ELÉTRON NEUTRINO

C = 0

O menor dos quarks tem um longo tempo de vida. Cada proton tem dois down e cada nêutron, um.

Massa: » 0,01 GeV

É irmão do up e também parte fundamental da matéria. Cada próton tem um down e cada nêu-tron, dois.

Massa: » 0,01 GeV

Presente em toda matéria comum. É responsável pela eletricidade e pelas reações químicas.

Massa: » 5,11x10-4 GeV

Possivelmente não tem massa. A cada segundo bilhões de neutrinos atraves-sam nosso corpo.

 

CHARM

C = 2/3

STRANGE

C= -1/3

MÚON

C = -1

MÚON NEUTRINO

C = 0

Só é criado dentro dos aceleradores de partículas e tem tempo de vida brevíssimo: 10-13 segundos

Massa: » 0,01 GeV

Irmão do charm, não existe no Universo. Sobrevive muito pouco tempo nos aceleradores.

Massa: » 0,01 GeV

Primo mais pesado do elétron, sobrevive por 2 milionésimos de segundo.

Massa: » 0,106 GeV

Surge sempre com o múon só nos raios cósmicos e nos aceleradores de partículas.

TOP

C = 2/3

BOTTOM

C= -1/3

TÁUON

C = -1

TÁUON NEUTRINO

C = 0

O mais pesado dos quarks, equivale a 237 quarks up e down. Vive apenas 10-23 segundos

Massa: > 89 GeV

Pesado demais para viver no universo de hoje. Nos aceleradores vive só 10-13 segundos.

Massa: » 5,5 GeV

O mais pesado de todos os léptons, sobrevive por período curtíssimo.

Massa: » 1,78 GeV

É o irmão mais magro do táuon (talvez nem tenha massa)

1.2.3. A natureza da radiação eletromagnética

            ð Espectro eletromagnético

            A energia se propaga através da radiação eletromagnética (r.e.m.) com uma velocidade igual à da luz no vácuo (c = 299.792,5 km/s). A r.e.m. tem caráter dual: ora se propaga como onda, outras vezes como partículas. A r.e.m. pode ser descrita em termos de velocidade (c), comprimento de onda (l) e frequência (f), de modo que  l = c/f.

            O espectro eletromagnético corresponde a um intervalo contínuo de energia, em comprimentos de onda variando de nanômetro (10-9 m) a quilômetro.

            A explicação do aspecto corpuscular das radiações eletromagnéticas baseia-se na teoria de Bohr. O modelo atômico de Niels Bohr (1886-1961) foi apresentado em um sistema de regras que pretende descrever o comportamento dos elétrons periféricos do núcleo atômico. Essas regras foram chamadas "teoria quântica da estrutura atômica" e estavam baseadas nas idéias sobre a quantificação da energia devidas a Max Planck e Albert Einstein. Eis os enunciados das regras:

a)   Os elétrons se movem ao redor dos núcleos atômicos de maneira que a força de atração eletrostática esteja em equilíbrio com a força centrífuga. Enquanto para Rutherford os elétrons se moviam em órbitas circulares arbitrárias, de acordo com as leis da mecânica, para Bohr eles se moviam sobre certas trajetórias bem definidas, chamadas "trajetórias quânticas" que são definidas de acordo com determinadas "condições quânticas".

b)   Os elétrons podem mover-se segundo estes caminhos quânticos sem qualquer perda de energia por radiação, i.e., as leis da eletrodinâmica clássica que postulam campos de radiação para elétrons periféricos não se aplicam a elétrons em órbitas atômicas permitidas.

c)   Os elétrons podem realizar "saltos quânticos" desde uma              trajetória quântica permitida até outra. O "conteúdo energético" do átomo será diferente para estes dois estados do elétron. O salto para uma trajetória mais externa ocorre quando houver absorção de energia, e isto se torna possível se o átomo absorve um quantum de luz (no sentido de Einstein). Se, de outro modo, o elétron salta para uma trajetória mais próxima do núcleo, há liberação de energia e emissão de um quantum de luz.

            Há uma unidade mínima de radiação eletromagnética postulada por Planck em sua teoria das partículas de energia, e essa energia se propaga só em unidades discretas - os quanta ou fótons. A unidade de energia contida num fóton é determinada pela equação

Ep = h . f = h . c/l ,

onde : h = 6,62x10-34 joule . s (constante de Planck);

            f = frequência da onda, em ciclos por segundo;

            c = 299.792 km/s (velocidade da luz no vácuo);

                        l = comprimento de onda, em metros.

            O fóton não tem massa quando inerte, mas adquire massa através do movimento, de acordo com a fórmula de Einstein E = mc2. Para a massa do fóton, teremos:

Mp = Ep / c2 = h . f / c2

            Quando um elétron salta de um nível de energia E1 para outro E2, em face da variação da energia no átomo, um fóton talvez seja emitido ou absorvido pelo átomo, com uma energia igual à variação de energia total dentro do átomo. O termo "talvez" está a indicar o caráter probabilístico da ocorrência.

            A freqüência do fóton emitido ou absorvido é calculada das fórmulas anteriores:

f = 1 / h (E2 - E1)

            A manifestação física do salto do elétron é o aquecimento ou resfriamento do átomo. Quando o átomo esquenta, ele absorve fótons e ganha energia; se o átomo esfria, ele emite fótons e perde energia. Devido à freqüência específica - a frequência depende da variação da energia (E2-E1) do átomo  -, existe um comprimento de onda ou radiação ou cor associada com cada fóton emitido ou absorvido durante os saltos do elétron. A seguir constam algumas radiações e fenômenos causadores.

a)   Radiação de ondas curtas (ultravioleta e luz visível) -              resultante de mudanças eletrônicas nos átomos;

b)   Radiação infravermelho próximo e médio - devida à vibração do átomo no interior da molécula;

c)   Radiação infravermelho extremo - associada à rotação da molécula;

d)   Radiações X e gama - Os raios X são produzidos quando                ocorre extração de elétrons situados nas camadas profundas do átomo, próximas ao núcleo (nível energético de grande quantum de ação). O átomo torna-se instável. Dos níveis mais superficiais outros elétrons caem em cascata sobre o lugar vago a fim de restabelecer o equilíbrio. Esta queda de elétrons da superfície vem acompanhada pela emissão de raios X. Logo, os raios X não são produzidos por fótons, mas por elétrons. Sob certas condições, pode ocorrer a explosão espontânea ou artificial do núcleo do átomo, dando origem à emissão de raios gama.

            ð Estudo dos espectros

            A luz emitida por um corpo sólido ou líquido incandescente produz um espectro constituído por uma faixa luminosa contínua e colorida. Só à temperatura de 450 graus os corpos começam a emitir radiações luminosas. Abaixo desta temperatura emitem radiações caloríficas. As primeiras radiações luminosas produzidas são as vermelhas, e, à medida que a temperatura do corpo aumenta, vão sucessivamente aparecendo outras cores. Só acima de 1.200 graus os corpos produzem espectros completos.

            Os corpos gasosos, quando em estado incandescente e sujeitos a pressão pouco elevada, produzem espectros descontínuos, formados de raias brilhantes. Cada uma destas possui uma cor que corresponde ao lugar ocupado por ela no espectro contínuo. O número e a natureza das raias ou das faixas caracterizam a substância que produziu o espectro. A cada raia do espectro corresponde uma determinada frequência que depende do movimento vibratório que a produziu. Cada raia é, pois, caracterizada por este comprimento de onda.

            Os espectros produzidos pela incandescência das substâncias são espectros de emissão.

            Um corpo simples apresenta sempre as mesmas raias, quer esteja isolado ou faça parte de um composto.

            Os corpos gasosos produzem espectros descontínuos formados de raias brilhantes. Exemplo: vapores de sódio. Os sólidos geram espectros contínuos. Um gás incandescente absorve, em toda luz que o atravessa, as radiações que ele é capaz de emitir (Lei de Kirchhoff). Os espectros obtidos através das radiações que atravessam o gás incandescente são chamados "espectros de absorção". Exemplo: cloreto de sódio. Na região do amarelo aparecem dois traços negros. A chama do sódio absorveu as radiações que o vapor de sódio incandescente produziu.

            ð Espectro solar

            O Sol emite luz branca, a qual é constituída das cores que vemos no arco-íris: violeta, azul, verde, amarelo, laranja, vermelho. As manchas solares se refletem no espectro, na forma de espectro de absorção. A determinação do espectro solar é feita utilizando instrumentos chamados espectrógrafos, que têm a finalidade de decompor a luz do Sol em suas radiações ou cores constituintes.

            Ao incidirem os fótons da luz solar sobre os corpos nota-se uma interação cujo efeito imediato é a absorção de algumas radiações ou cores e reflexão de outras. Da subtração e reflexão da luz branca, principalmente do Sol, resultam as cores dos objetos.


QUADRO II

ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO

DESIGNAÇÃO

RADIAÇÃO

SÍMBOLO

COMPRIMENTO

 

 

 

(METRO)

ONDAS MUITO LONGAS

 

VLF

30.000

-

10.000

ONDAS LONGAS

ONDAS

LF

10.000

-

1.000

ONDAS MÉDIAS    

DE

MF

1.000

-

100

ONDAS CURTAS

 

HF

100

-

10

ONDAS MUITO CURTAS

RÁDIO

VHF

10

-

1

ONDAS ULTRA CURTAS

 

UHF

1

-

0,1

FREQ. SUPRA ALTA

MICRO

SHF

0,1

-

0,01

FREQ. EXTRA ALTA

ONDAS

EHF

0,01

-

0,001

 

 

 

 

MICRÔMETRO

INFRAVERMELHO

ONDAS

-

1000

-

0,7

LUZ VISÍVEL

DE

-

0,7

-

0,4

ULTRAVIOLETA

LUZ

-

0,4

-

0,1

 

 

 

 

NANÔMETRO

 

RAIOS X

X

-

50

-

0,01

RAIOS GAMA

g

-

0,001

-

0,0001

RAIOS CÓSMICOS

ULTRA-RADIAÇÃO

-

0,0001

-

0,000001

 

 

 

 

 

 

 

 

1 Micrômetro = 10-6 Metro

 Nanômetro   = 10-9 Metro

            ð Efeito Doppler - Fizeau

            Quando um observador se desloca em relação a uma fonte vibratória ou esta é que se desloca em relação a um observador, a frequência (f) da onda emitida é aparentemente modificada. Seja v a velocidade com que o observador se aproxima da fonte e l o comprimento de onda das vibrações. Então o observador receberá um número de vibrações por segundo (f1) igual à soma da frequência (f) da onda emitida mais as que encontrará em seu trajeto, isto é, mais v/l vibrações. A frequência aparente recebida pelo observador será f1 = f + v/l

            Sabe-se que  l = V/f, onde V é a velocidade da onda. Substituindo na expressão acima, vem:

f1 = f + v/ (V/f) = f + f . v / V = f ((V + v)/V)

            Se o observador está se afastando da fonte, a expressão assume a forma:

f1 = f - v/(V/f) = f - f .v/V = f ((V - v)/V)

porque a velocidade do observador é contrária à da onda.

            Se a fonte for sonora: a) observador se aproxima da fonte (f1>f), os sons recebidos serão mais agudos; b) observador se afasta da fonte (f1<f), os sons recebidos serão mais graves.

            Se a fonte for luminosa: a) observador se aproxima da fonte, o espectro luminoso se desloca na direção do azul; b) o observador se afasta da fonte, o espectro luminoso se desloca na direção do vermelho.

            Se a fonte se desloca em relação ao observador, ocorrem fenômenos idênticos, "mutatis mutandis".

 

1.2.4. Interação da radiação eletromagnética com a matéria

            Quando a radiação eletromagnética (r.e.m.) incide sobre a matéria, pode ocorrer o seguinte:

            i) a r.e.m. é transmitida, isto é, quando atravessa uma substância, verifica-se mudança de velocidade da radiação (va) no ar para a velocidade na substância (vs);

            ii) a r.e.m. é absorvida, e, não sendo totalmente reirradiada, contribuirá para aquecer o corpo;

            iii) a r.e.m. é emitida por uma substância, em decorrência de sua estrutura e temperatura (todas as substâncias emitem energia a temperaturas acima de zero Kelvin);

            iv) a r.e.m. é refletida, ou seja, retorna ao meio de origem após chocar-se na superfície do corpo, com ângulo de reflexão igual ao de incidência;

            v) a r.e.m. é difundida, isto é, defletida em todas as direções (a dispersão da luz solar pela atmosfera é um exemplo evidente).

            As interações r.e.m./matéria são seletivas com respeito aos comprimentos de onda e dependem basicamente das propriedades da superfície e de estruturas atômicas e moleculares do corpo.

            A explicação para os fenômenos de emissão/absorção de quanta, conforme já observamos, é dado pela teoria de Bohr. Quando um fóton de frequência (f) encontra um átomo que o absorve inteiramente, podem ocorrer dois fenômenos:

a) um dos elétrons satélites do átomo pode passar do nível que ocupa a um nível mais externo, correspondente, por conseguinte, a uma maior energia, de modo que o átomo passa a encerrar uma energia bem maior do que no estado normal: ele passa de um estado normal a um estado ativo ou excitado;

b) um elétron pode ser expulso do átomo, que se transforma assim em um íon positivo. Tal emissão de elétrons constitui o "efeito fotoelétrico". No mais das vezes, apenas uma parte da energia h.f, trazida pelo fóton incidente, é empregada para arrancar o elétron do átomo. O resto permanece sob a forma de energia cinética fornecida pelo elétron expulso.

            Pode suceder que apenas uma parte da energia h.f trazida pelo fóton seja absorvida pelo átomo, permanecendo o resto sob a forma de um fóton de energia menor. É o que se verifica no efeito descoberto por Compton (1923) quando da difusão dos raios X por meio dos átomos leves de carbono contidos num fragmento de grafite ou parafina: esta difusão é acompanhada de um aumento do comprimento de onda do raio X. A explicação do efeito Compton é simples: quando o fóton colide com um dos elétrons pouco ligados do átomo de carbono, o elétron recua e o fóton desvia de sua direção. Durante o choque, o fóton cede parte de sua energia h.f ao elétron. Logo, após o choque, o fóton terá uma energia h.f ' menor. Então, h.f ' < h.f, donde f ' < f.

            Quando um fóton de energia h.f é absorvido por uma molécula, pode determinar a produção de uma reação química - é o fenômeno fotoquímico. Por exemplo, se a radiação tem a frequência conveniente, o cloreto de prata (ClAg) decompõe-se em seus elementos cloro e prata.

ClAg + h.f  à  Cl + Ag

            Quando um fluxo de energia radiante encontra um meio material, uma parte da energia pode não ser consumida em fenômenos que alteram a natureza da matéria, não é difundida ou transmitida pelo corpo, ela é usada para aumentar a energia cinética média de suas moléculas, e esta energia se transforma em calor. No caso do "corpo negro", toda energia incidente é absorvida.

            Quando a radiação solar incide sobre a folha de uma árvore, alguns fótons são absorvidos pela folha (violeta, azul, amarelo, verde = 80%, vermelho), enquanto outros (verde = 20%, infravermelho) são refletidos.

            Quando a radiação de luz branca atravessa um prisma de cristal, ela se decompõe nas radiações elementares, de acordo com o comprimento de onda de cada uma, nesta ordem: violeta, azul, verde, amarelo, laranja, vermelho, pois o ângulo de refração é menor nas radiações de menor comprimento de onda.

            O hidrogênio normal, cujo átomo compõe-se de um próton e de um elétron, chama-se "prótio", e forma 99,98 % do elemento. O hidrogênio pesado, ou "deutério", cujo núcleo possui, além de um próton, também um nêutron, constitui os 0,02 % restantes, e é de grande interesse para reações nucleares. O "trítio" possui um núcleo com um próton e dois nêutrons, e outras variedades ainda mais pesadas são em sua maioria artificiais. O átomo solto de H é muito ativo, mas as moléculas do gás se compõem de dois átomos (H2) que partilham seus respectivos elétrons e são muito estáveis. Por isso o H é um gás quase inerte à temperatura normal, exigindo ser ativado com altas temperaturas e pressões ou mediante algum catalisador.

            Por causa das condições quânticas, há uma série de caminhos permitidos para um elétron percorrer. O movimento ao longo da órbita mais interna representa o nível de energia mais baixo do átomo - é o seu "estado fundamental". Se se introduz energia externa, como no caso de absorção de um quantum de luz ou quando um elétron rápido de um feixe de raios catódicos se choca com um átomo, o elétron salta de uma órbita para outra - é o salto quântico. O átomo fica num estado excitado, aí permanecendo por um bilionésimo de segundo. Depois o elétron efetua saltos quânticos para níveis mais baixos de energia até atingir o estado fundamental, liberando energia na forma de emissão de fótons como radiação visível ou invisível. Pode-se ver que o átomo de H só emite radiação se for "enchido" com quanta de energia de uma fonte externa. A emissão de bilhões de fótons pelo H gasoso dá ao olho a impressão de emissão de luz. Como vimos, os diferentes estados energéticos de H dependem da órbita em que o elétron se move. A própria energia do átomo é inteiramente determinada pela distância entre o elétron e o núcleo. Pode-se construir um diagrama, como o de Balmer, que mostra uma escada de estados energéticos, desde que o decréscimo de energia se dá sempre em degraus ou saltos. Quanto mais alta for a posição do elétron nos degraus, mais elevada será sua energia. Porém, a separação energética entre os estados de altas energias é muito pequena, com pequenas diferenças entre um estado e outro. Entretanto, os diâmetros das respectivas órbitas eletrônicas se comportam de maneira oposta. Na realidade, a distância ao núcleo atômico cresce com o quadrado do número orbital. Assim, por exemplo, a segunda órbita tem um diâmetro igual a quatro vezes o diâmetro da órbita do estado fundamental. A quarta órbita terá um diâmetro igual a dezesseis vezes o da órbita fundamental. A sétima órbita terá um diâmetro igual a 49 vezes, etc.

            O diagrama da figura 1 mostra o espectro eletromagnético das ondas luminosas ( 0,4 mm <= l <= 0,7 mm ) de uma estrela quente. Notem-se as raias de absorção de energia (em preto) pelos átomos de H quando os elétrons saltam do segundo nível quântico para os seguintes de nível de energia mais quantificado (figura 2).

            Os níveis de energia estão associados ao tipo de núcleo do átomo. Como cada elemento natural possui um tipo de núcleo, a cada elemento corresponde um conjunto específico de linhas espectrais.

Figura 1.1. O espectro luminoso.

 

Figura 1.2. Níveis de energia

 

Série de Balmer

            Se um corpo está em equilíbrio térmico, a natureza dos r.e.m. é função tão somente da temperatura - é denominada de radiação de corpo negro. À maior temperatura corresponde maior emissão de radiação de curto comprimento de onda. Em níveis elevados de temperatura, uma parcela da radiação corresponde a raios X.

            Em resumo, a forma e a intensidade luminosa de cada linha do espectro dependem da maior ou menor presença do elemento químico radiante e das condições físicas do ambiente em que está.


 

CAPÍTULO 2

Estrelas

 

 

Adolfo Stotz Neto

Antônio C. de Lucena

CAPÍTULO 2 - AS ESTRELAS

2.1. Conceitos introdutórios

2.1.1. Conceito

            Pode-se conceituar as estrelas, em face do conhecimento atual, como corpos gasosos, de forma aproximadamente esférica, onde reinam temperaturas e pressões muito altas, tanto mais altas quanto mais próximo do seu núcleo. O gás que compõe as estrelas, em sua maior parte, se encontra na forma de plasma, isto é, um gás altamente ionizado.

            O núcleo destes astros é uma região na qual ocorrem reações termonucleares (similares àquelas que ocorrem numa bomba de hidrogênio, com a única diferença de que enquanto a reação em uma bomba H é descontrolada e ocorre numa pequena fração de tempo, a no núcleo das estrelas é contínua), que liberam enormes quantidades de energia. No núcleo, esta energia é liberada principalmente na forma de raios gama e de raios X (radiações de pequeno comprimento de onda), enquanto que na periferia a energia é liberada na forma de radiações ultravioleta, luminosas e infravermelhas (radiações de maior comprimento de onda).

            De um modo geral, em vista dos conhecimentos atuais, se acredita que a estrutura típica de uma estrela é a mostrada na figura abaixo.

 

Figura 2.1. Estrutura típica de uma estrela.

 

            A observação das estrelas se faz, atualmente, somente pelo registro de suas radiações eletromagnéticas.

            Até bem pouco tempo atrás, as únicas radiações que eram passíveis de serem estudadas eram as radiações luminosas, pois estas ondas conseguem, juntamente com algumas ondas de rádio, atravessar a atmosfera.

            Com o advento dos radiotelescópios, se tornou também possível o estudo das ondas de rádio.

            As outra radiações, de menor comprimento de onda, são bloqueadas pela atmosfera, de forma que não é possível estudá-las diretamente a partir da superfície da Terra.

            Com a invenção dos satélites artificiais e outros veículos interplanetários, se tornou possível a observação das radiações gama, X, ultravioleta e infravermelhas.

            As características de uma estrela podem ser estudadas sob dois grandes aspectos:

            ð aspecto astrométrico:     visa determinar a sua posição (aparente) e o seu movimento (aparente).

            ð aspecto astrofísico: tem por finalidade estudar a sua natureza, estrutura e constituição.

 

2.1.2. Nomenclatura

            Antigamente a grande maioria das estrelas não tinha nenhuma designação especial. Somente as mais notáveis possuíam nomes próprios, sendo que a maioria destes nomes chegou até os nossos dias. Assim, temos Antares, que é a mais brilhante estrela da constelação do Escorpião; Aldebaran, idem da constelação do Touro; Altair, idem da constelação da Águia e assim por diante.

            Johann Bayer, em 1603, na impossibilidade prática de designar cada estrela por um nome próprio, resolveu, ao publicar o seu Atlas Celeste (a Uranometria), denominar cada estrela por uma letra grega, seguida pelo genitivo latino do nome da constelação a que a estrela pertencia. O critério era denominar as estrelas pela letra do alfabeto grego, de acordo com o brilho decrescente. Assim, alfa designa a estrela mais brilhante, beta a segunda mais brilhante, gama a terceira mais brilhante e assim por diante.

            Quando, com o avanço da Astronomia (principalmente a partir da invenção do telescópio) o alfabeto grego se esgotou, passou-se para o alfabeto latino. Quando este também se esgotou, passou-se a se utilizar um número seguido do genitivo latino do nome da constelação.

            Estas denominações se perpetuam até nossos dias (mais por uma razão histórica do que propriamente prática).

            Assim, Alfa Tauri é o nome dado por Bayer a Aldebaran; Alfa Scorpii, o dado a Antares etc.

            Hoje em dia, se usam catálogos para se localizar e denominar as estrelas. As referências geralmente consistem de uma série de números que, segundo determinadas convenções, tem um significado útil para o estudo das mesmas.

            É importante se observar que existem vários catálogos, e que os mesmos sofrem revisões periódicas, conforme o conhecimento astronômico vai aumentando.

2.1.3. Classificação

            A partir da observação sistemática das estrelas, surgiu a necessidade de compará-las. Daí surgiram os diversos critérios de classificação. A própria evolução dos métodos de observação, bem como dos conhecimentos teóricos advindos destas observações, influíram (e influem) na evolução dos métodos e sistemas de classificação.

            Entre as características mais notáveis que se pode inferir da análise das radiações estelares, três, entre outras, merecem especial atenção, e serviram de base para os métodos de classificação das estrelas no decorrer dos tempos:

            ð direção

            ð brilho

            ð cor

            O primeiro (direção) é de natureza astrométrica, e já foi utilizado pelos antigos (constelações), enquanto que os outros dois (brilho e cor) são de natureza astrofísica. Uma classificação segundo o brilho também foi utilizada pelos antigos (magnitude) enquanto que as classificações conforme a cor (classificações espectroscópicas), bem como as classificações conforme o brilho e cor (classificações espectrofotométricas) são mais recentes.       

2.1.3.1. Classificação Direcional.

            Esta classificação, de natureza astrométrica, se baseia na direção (relativa à Terra) em que se encontram as estrelas. Encontra aplicação para orientação posicional, útil para navegantes, aeronautas etc.

            Como resultado desta classificação temos atualmente os globos, catálogos e atlas celestes. Esta sistema levou os antigos a agruparem as estrelas em constelações (asterismos).

            O mais antigo catalogo de estrelas de que se tem notícia atualmente é o atribuído a Ptolomeu, e está inserido em sua obra mais famosa, o Almagesto. Neste tratado Ptolomeu catalogou 1.022 estrelas, agrupando-as em 48 constelações. Ptolomeu, por sua vez, além de suas próprias observações, se baseou em documentos oriundos da Mesopotâmia.

            Atualmente, todo o céu se encontra dividido em 88 constelações, que nada mais são do que áreas do céu definidas por segmentos de arco de declinação e ascensão reta. Desta forma as constelações, atualmente, simplesmente delimitam áreas do céu e perderam o lirismo dos tempos antigos. Na bibliografia desta apostila referente a este capítulo, o livro “Da Terra às Galáxias”, de Mourão, traz um apanhado interessante de fatos sobre este sistema de classificação, bem como sobre catálogos e atlas celestes, enquanto que o livro “Atlas Celeste”, do mesmo autor, fornece uma lista completa das 88 constelações celestes.

2.1.3.2. Classificações Fotométricas

            Este sistema de classificação, de natureza astrofísica, se baseia essencialmente no estudo do brilho dos astros.

            Foram Hiparco e Ptolomeu, provavelmente, os primeiros astrônomos que, após notarem a diferença de brilho entre as diversas estrelas do céu, procuraram classificá-las de acordo com esta característica.

            Naquela época todas as estrelas conhecidas eram as visíveis a olho nu (umas 6.000 em todo o céu, se bem que Hiparco e Ptolomeu, em função da latitude em que viviam, não tinham acesso a todo o céu).

            As estrelas visíveis foram então divididas em seis classes, de acordo com o seu brilho (esta divisão em seis classes foi completamente arbitrária). Assim, denominaram-se estrelas de 1a magnitude aquelas mais brilhantes; as outras, mais fracas, foram sendo denominadas, sucessivamente de 2a, 3a, 4a, 5a e 6a magnitude, sendo que as de 6a magnitude eram as mais fracas estrelas visíveis a olho nu.

            Obviamente estas magnitudes eram visuais, uma vez que o instrumento utilizado era o olho humano. Também é evidente que esta classificação era arbitrária, encontrando-se uma multidão de brilhos intermediários, que eram então classificados em uma ou em outra magnitude.

            Após a invenção do telescópio, as estrelas telescópicas (aquelas só visíveis ao telescópio) continuaram sendo classificadas da 7a magnitude em diante, até o limite dos mais potentes telescópios.

            Por volta de 1850, devido aos estudos fisiológicos de Weber e Fechner, que chegaram a conclusão que, para todos os sentidos humanos, a sensação é diretamente proporcional ao logaritmo decimal da excitação, isto é:

                        S = K . log E

            onde:

                        S = sensação

                        K = constante de proporcionalidade

                        E = excitação

Juntamente com os estudos dos astrônomos, que determinaram que as estrelas de 1a magnitude eram 100 vezes mais brilhantes ao olho humano que as de 6a magnitude, Pogson determinou a equação que relaciona as magnitudes (visuais) de duas estrelas com os seus brilhos:

                        m = m0 - 2,515 . log I / I0

 onde, conhecido o brilho I de uma estrela, se conhecermos o brilho I0 e a magnitude m0 de uma outra, podemos calcular m para a estrela cujo I é conhecido.

            Adotou-se como estrela de 1a magnitude (m=1), a média das magnitudes das vinte estrelas mais brilhantes do céu.

            Da expressão acima, pode-se concluir facilmente que uma estrela uma magnitude menor do que outra é 2,515 vezes mais brilhante do que ela. Assim teremos uma escala como mostrado a seguir:

-2 Û -1 Û 0 Û 1 Û 2 Û 3 Û 4 Û 5 Û 6 Û 7

            Da escala é fácil de se ver, por exemplo, que uma estrela de magnitude 3 é (2,515)2 vezes menos brilhante do que uma estrela de 1a magnitude.

            Com este sistema não se é obrigado a se considerar somente magnitudes inteiras, já que se pode medir, através de instrumentos sensíveis, o brilho com grande precisão, surgindo daí as magnitudes fracionárias. Por exemplo, Sírius (que é a estrela mais brilhante do céu, fora o Sol, é claro) tem uma magnitude aparente visual de -1,58. Nesta escala o Sol possui uma magnitude de -26,7 e a Lua (cheia) uma magnitude de -12,6.

            Tudo o que foi visto até agora se refere às magnitudes aparentes visuais. Aparentes porque são as magnitudes como as percebemos da Terra, isto é, não é levado em conta o fator distância. Assim, com respeito a uma  estrela com um determinado brilho, não se pode, a priori, afirmar se se trata de uma estrela pouco brilhante mas próxima de nós, ou se se trata de uma estrela muito brilhante, mas distante de nós. Visuais porque são aquelas magnitudes (brilho) que são aparentes a retina do olho humano.

            Entretanto, o olho humano não é o único receptor de radiações disponível. Existem outros, tais como as chapas fotográficas e as células fotoelétricas. Como cada um desses receptores tem sensibilidade espectral diferente, os resultados das medições de magnitude das estrelas também variam, conforme são determinadas por um instrumento ou outro. Desta forma se define os diferentes tipos de magnitude:

            a) Sistema visual

                        Fornece a magnitude visual (mv), que é definida pela curva de sensibilidade típica da retina do olho humano.

            b) Sistema fotográfico

                        Fornece a magnitude fotográfica (mPG), que é definida pela curva de sensibilidade da placa fotográfica, curva esta que é diferente da curva de sensibilidade da retina humana. Assim, as magnitudes fotográficas diferem das magnitudes visuais. Para o olho humano, o máximo de sensibilidade se encontra no comprimento de onda de 5.550 Å (que corresponde a uma cor amarelo - esverdeada), enquanto que para as placas fotográficas este máximo de sensibilidade se encontra no comprimento de onda de 4.300 Å (que corresponde a uma cor azulada). Assim, uma estrela que tem o seu máximo de emissão na faixa amarela do espectro brilha mais aos olhos humanos e portanto tem uma magnitude visual maior do que a magnitude fotográfica. Já para uma estrela azulada ocorre o contrário.

            c) Sistema fotovisual

                        Fornece a magnitude fotovisual (mPV). É obtida fazendo-se a luz da estrela passar por um filtro que possui uma curva de passagem da luz semelhante àquela da sensibilidade da retina humana. A magnitude fotovisual coincide praticamente com a magnitude visual.

 

            d) Sistema Fotoelétrico

                        Fornece a magnitude fotoelétrica (mPE). As magnitudes obtidas por este sistema dependem da curva característica de sensibilidade espectral do tipo de célula fotoelétrica utilizada, bem como do tipo de filtro usado. A combinação destes dois fatores fornece uma série de magnitudes.

            Um conceito extremamente importante, e que serve como o primeiro parâmetro para as modernas classificações fotométricas, é o de magnitude absoluta M. Assim como temos as magnitudes aparentes visuais (mV), fotográficas (mPG), fotovisual (mPV) e fotoelétrica (mPE), também existem as correspondentes magnitudes absolutas  visuais (MV), fotográfica (MPG), fotovisual (MPV) e fotoelétricas (MPE).

            O conceito de magnitude absoluta se baseia  no fato de que uma mesma fonte luminosa, observadas de diferentes distâncias, apresenta diferentes  brilhos.

            Assim, convencionou-se chamar de magnitude absoluta aquela magnitude que uma estrela teria se fosse colocada a uma distância padrão  do Sol.  Por convenção, esta distância d padrão é de 10 parsecs (um parsec é igual a 3,26 anos luz).

            A expressão  que relaciona a magnitude aparente m, a magnitude absoluta M e a distância d (em parsecs) é a seguinte:

M = m + 5 - 5 . log d

Assim, se d = 10 parsecs temos:

M = m + 5 - 5 . log 10 = m + 5 - 5 = m

            Desta forma, numa classificação fotométrica, o primeiro parâmetro é a magnitude absoluta.

            O nosso Sol, por exemplo, tem magnitude visual aparente de -26,7 e uma magnitude absoluta visual de aproximadamente 4,95 , ou seja, se olharmos para o nosso Sol de uma distância de 10 parsecs, ele estaria quase no limite de visibilidade.

            Um outro conceito importante, e que serve como um segundo parâmetro para a classificação, é o chamado índice de cor.

            O índice de cor é, por definição, a diferença entre a magnitude fotográfica e a magnitude fotovisual.

            Assim, por definição, chamando de C o índice de cor,

C = mPG - mPV

            Como temos que mPV @ mV, temos que

C @ mPG - mV

            O índice C também obedece à relação

C @ MPG - MV

            Este índice caracteriza a coloração das estrelas, ou melhor, a distribuição de intensidade das suas radiações no espectro.

            Este índice é portanto zero para as estrelas brancas (mPG @ mV), negativo para as azuladas (são mais brilhantes no azul, portanto tem mPG < mV) e positivo para as avermelhadas.

2.1.3.3. Classificações Espectroscópicas

            Este sistema de classificação, de natureza astrofísica, se baseia fundamentalmente no estudo da cor dos astros, isto é, no estudo dos seus espectros. A descoberta da presença de raias (de absorção, geralmente) no espectro das estrelas foi feita em 1814, por Fraunhofer.

            Baseado nos trabalhos de Fraunhofer, em 1868 o astrônomo Secchi percebeu algumas correlações entre as cores das estrelas e o aspecto geral de seu espectro. Isto fez com que Secchi agrupasse as estrelas em cinco classes, ou tipos espectrais, como se diz atualmente. Essa primeira classificação era completamente empírica.

            Os trabalhos de Fraunhofer e de Secchi levaram, nos últimos anos do século XIX, à introdução, pelo astrônomo Pickering e seus discípulos, do que hoje se conhece como a antiga classificação de Harvard, ou classificação de Pickering.

            Esta classificação, que aparece pela primeira vez no Henry Draper Catalogue, classifica as estrelas em 10 tipos espectrais, que são:

                                                                                                S

                                                                                                ï

                                   O ¾ B ¾ A ¾ F ¾ G ¾ K ¾ M

                                                                                     ï         ï

                                                                                     R        N

onde a temperatura superficial decresce da esquerda para a direita.

            Atualmente, a classificação espectral de Harvard, que é uma evolução da antiga classificação de Harvard, classifica as estrelas em 9 classes, como mostrado abaixo:

 

                                                                                     S

                                                                                     ï

                                   O ¾ B ¾ A ¾ F ¾ G ¾ K ¾ M

                                                                                     ï

                                                                                     C

onde, como antes, a temperatura é decrescente da esquerda para a direita.

            Nesta classificação, entre uma classe e outra se adotou um critério de subdivisão decimal. Assim, por exemplo, os espectros da classe A se dividem em A1, A2, ... A9, sendo que o espectro de A9 é muito semelhante ao de F0, e assim por diante. Como esta subdivisão, com o passar do tempo, também se revelou insuficiente, se inseriu índices (letras) para indicar os aspectos específicos das raias.

            Assim, por exemplo, o nosso Sol é classificado como uma estrela do tipo G2v.

            As principais características das classes espectrais de Harvard são mostradas na tabela a seguir:

Tipo espectral

 

Material típico

da estrela

Temperatura da estrela (Kelvin)

Estrelas típicas

da classe

O

 

He ionizado

35.000

 Zeta Puppis (Naos)

B

 

He neutro

25.000

Rigel

Regulus

A

H

11.000

Sírius

Vega

F

H e raias metálicas

7.500

Canopus

Procyon

G

H, muito rica em raias metálicas

6.000

Sol

Capella

K

H, raias metálicas de metais neutros

5.000

Aldebaran

70 Ophiuchi

M

Óxido de Titânio

 

Antares

Próxima

C

 

Carbono

 

 

S

Óxido de Zircônio

H, Fe

 

 

 

Tabela 2.1.

2.1.3.4. Classificações espectrofotométricas

            Os sistemas de classificação espectrofotométricos, também de natureza astrofísica, se baseiam essencialmente no estudo da cor (espectro) dos astros, bem como no seu brilho.

            O primeiro sistema de classificação espectrofotométrico foi elaborado entre 1905 e 1911 pelos astrônomos Hertzsprung e Russell que constataram, pela comparação dos espectros (cor, e consequentemente temperatura superficial, como veremos adiante) com a magnitude absoluta das estrelas, a existência de astros de mesma classe espectral, mas de categorias bem distintas; são as estrelas anãs, gigantes e supergigantes.

            Surgiram a seguir diversas outras classificações, destacando-se entre elas a classificação de Monte Wilson, na qual são introduzidas as noções de anãs e gigantes na antiga classificação de Harvard.

            Por volta de 1940, Morgan estabeleceu um novo sistema de classificação espectrofotométrico, que se tornou mais tarde conhecido como classificação espectral de Yerkes (o nome é impróprio, já que se trata de uma classificação espectrofotométrica).

            Neste sistema, bidimensional, os parâmetros de interesse são o tipo espectral e a classe de luminosidade (em vez da magnitude absoluta).

            Observou-se na construção desta classificação que em um mesmo tipo espectral, as magnitudes absolutas se agrupam, com uma fraca dispersão, em torno de valores bem determinados, correspondentes às diversas famílias de estrelas. Tal propriedade permitiu aos astrônomos Morgan, Keenan e Kellman (daí a denominação MKK também dada a esta classificação) agruparem as estrelas em um pequeno número de classes de luminosidade, em lugar de magnitudes absolutas.

            O primeiro parâmetro é o tipo espectral, que quase sempre coincide com o de Harvard, enquanto que o segundo é a classe de luminosidade, que é indicado por um algarismo romano, com letras como subíndice, após o símbolo espectral.        A tabela a seguir mostra o entendimento deste segundo parâmetro.

2o parâmetro

Tipo de estrela

Estrela típica

I

 Ia

 Iab

 Ib

   Supergigantes

   Zeta Puppis

   Rigel

   Canopus

II

 IIa

 IIab

 IIb

   Gigantes

   luminosas

   Beta Centauri

   Gama Crucis

III

 IIIa

 IIIab

 IIIb

   Gigantes

   Aldebaran

   Arcturus

IV

 IVa

 IVab

 IVb

   Subgigantes

   Procyon

   Beta Crucis

V

 Va

 Vab

 Vb

   Anãs

   Sírius

   Vega

   Sol

VI

 VI

   Sub anãs

 

 

Tabela 2.2.

 

            OBS.: Dentro de um dado tipo espectral, a luminosidade decresce ao longo da seqüência a, ab, b. As estrelas da classe V são as da seqüência principal.

            Com o acentuado desenvolvimento da fotometria fotoelétrica, surgiram outras classificações espectrofotométricas. Uma das mais notáveis é a desenvolvida pelos astrônomos Chalonge e Barbier. É uma classificação a três parâmetros e se baseia no estudo do espectro contínuo do hidrogênio.

2.1.4. Distância das estrelas

            A determinação das distâncias que nos separam das estrelas é um dos problemas mais fundamentais da astronomia estelar. Por outro lado, tal trabalho é também um dos mais difíceis da astronomia observacional, já que, devido às enormes distâncias que nos separam das estrelas, é muito difícil determinar os pequenos efeitos que ocorrem nos seus movimentos.

            De um modo geral, os métodos utilizados para a determinação das distâncias das estrelas se enquadram em um de dois grandes grupos:

            ð métodos astrométricos

            ð métodos astrofísicos

            Os métodos astrométricos visam determinar a paralaxe da estrela, enquanto que os métodos astrofísicos visam determinar a sua magnitude absoluta.

2.1.4.1. Métodos Astrométricos

            Com o objetivo de determinar a paralaxe de uma estrela, se utilizam basicamente três métodos, dos quais veremos somente o primeiro, pois os outros dois são mais complexos e portanto fogem ao escopo deste curso. Estes métodos são:

            ð Método Trigonométrico

            ð Método Dinâmico

            ð Método Estatístico (ou secular)

            Para entendermos como funciona o método trigonométrico, é preciso antes conceituarmos o que é paralaxe.

2.1.4.1.1. Paralaxe

            A paralaxe de uma estrela pode ser definida como sendo o ângulo sob o qual um observador colocado nesta estrela veria o raio da órbita terrestre perpendicularmente ao seu raio visual.

 

Figura 2.2. Paralaxe anual.

 

            Como a paralaxe depende unicamente da distância (uma vez que o raio da órbita terrestre é fixo), conhecendo-se uma pode-se facilmente determinar a outra.

            Desta forma, em astronomia, a noção de distância é substituída pela de paralaxe. A relação entre a distância e a paralaxe é a seguinte:

d = 1 / p

            Onde:

                        d = distância (em parsecs)

                        p = paralaxe (em segundos de arco)

            Nota: 1 parsec = 3,26 anos-luz

            Como um exemplo, a estrela mais próxima do Sol, e portanto da Terra, tem uma

paralaxe de 0,75". Daí:

d = 1 / 0,75 = 1,33 parsecs = 4,34 a.l.

 

2.1.4.1.2. Método trigonométrico para a determinação da paralaxe

            Este método consiste em se obter medidas angulares precisas, de forma a se determinar p. Com p conhecido, entrando-se na expressão que relaciona a distância d com a paralaxe p, calcula-se d.

            É importante se frisar que este é o único método conhecido em que se fazem medidas diretas para o cálculo da distância. Todos os outros se baseiam, direta ou indiretamente neste (pelo menos como uma referência de calibração).

 

           

2.1.4.2. Métodos astrofísicos

            Os métodos astrofísicos repousam na existência de certas propriedades das radiações emitidas pelas estrelas que nos permitem a determinação indireta de sua magnitude absoluta (M).

            Como a magnitude aparente m é de fácil determinação, entrando na expressão fundamental:

M - m = 5 - 5 . log d

Como conhecemos M e m, é fácil determinar d.

            Os métodos astrofísicos se dividem em dois grandes grupos, em função dos parâmetros utilizados para a determinação da magnitude absoluta:

            ð Métodos fotométricos

            ð Métodos espectroscópicos

 

2.1.4.2.1. Métodos fotométricos

            Estes métodos envolvem o uso dos chamados indicadores de distância, isto é, de objetos que possuindo uma mesma propriedade física, apresentam a mesma magnitude absoluta.

            Um caso clássico é o das variáveis Cefeidas (que serão vistas com maiores detalhes em outro item). Para estas estrelas variáveis, existe uma relação bem determinada entre o período e a magnitude absoluta. Como o período é fácil de ser medido, se pode inferir M. Como m também é fácil de ser medido, com o uso da expressão fundamental se pode calcular d.

 

2.1.4.2.2. Métodos espectroscópicos

            Nestes métodos, a magnitude absoluta M é inferida através da análise do espectro da estrela. Como m é facilmente determinável, se pode determinar d.


2.2. Estrelas duplas e estrelas variáveis

2.2.1 Estrelas duplas

2.2.1.1 Introdução

            Em Astronomia, se chama de estrela dupla duas estrelas muito próximas entre si, constituindo um sistema físico em equilíbrio dinâmico estável, e no qual a atração gravitacional faz com que cada uma delas descreva uma órbita elíptica em torno de um centro de gravidade comum.

            De um modo geral, quando duas estrelas estão próximas, realmente se trata de uma estrela dupla. Entretanto, às vezes, duas estrelas que parecem estar próximas não estão próximas na realidade, pois se trata de um efeito de perspectiva, isto é, as estrelas estão quase situadas na mesma linha de visada, mas na realidade a distância entre elas é imensa.

            Atualmente, se acredita que as estrelas duplas são a maioria das estrelas (mais de 60% são duplas).

            Também é usual se referir a sistemas formados por três estrelas (“estrelas triplas”) ou por quatro estrelas (“estrelas quádruplas”) e de modo geral à sistemas formados por n estrelas (“estrelas múltiplas”), com a denominação de estrela dupla.

            Também é comum se reservar a expressão de estrela dupla às chamadas duplas óticas, isto é, os pares de estrelas aparentemente próximas devido à perspectiva, enquanto que se denomina de duplas físicas (ou binárias) àquelas que realmente formam um par ligado pela atração gravitacional.

            Como exemplo de estrelas duplas temos Alfa Centauri, que é a estrela mais próxima do Sol (4,3 anos luz) que é um sistema triplo. Já a estrela Teta Orionis é um sistema formado por nove estrelas.

            Como já dissemos, o movimento real das duas estrelas são órbitas elípticas, em torno de um centro de gravidade comum.

            A figura 3 ilustra isso.

 

Figura 2.3. Movimento de estrelas em um sistema binário.

 

            Para fins de observação, entretanto, se adota um modelo equivalente, onde se considera uma estrela como fixa e a outra descrevendo uma órbita elíptica em torno da primeira. A figura 4 ilustra isto.

 

 

Figura 2.4. Modelo para observação de um sistema binário.

 

            Na figura 4, o semi-eixo maior da órbita elíptica que B descreve hipoteticamente em torno de A, considerada como fixa, é a soma dos semi-eixos maiores das elipses individuais que cada estrela descreve em torno do centro de gravidade comum.

            Um outro aspecto a ser considerado no estudo das estrelas duplas é que o plano que contém as órbitas elípticas dos componentes possui uma inclinação em relação a linha de visada. Desta forma não é possível (com raríssimas exceções) se ver as órbitas reais das estrelas.

            Na figura 5 mostramos o que acabamos de dizer.

 

 

Figura 2.5. Perspectiva terrestre de um sistema binário.

 

            A figura 6 mostra o que se observaria olhando perpendicularmente ao plano da órbita, enquanto a figura 7 mostra o que realmente se observa.

 

Figura 2.6. Visão perpendicular de um sistema binário.

 

Figura 2.7. Visão terrestre de um sistema binário.

 

2.2.1.2 Classificação

            As duplas físicas (binárias) são usualmente classificadas em quatro grupos:

            ð binárias visuais;

            ð binárias espectroscópicas;

            ð binárias eclipsantes;

            ð binárias astrométricas.

 

2.2.1.2.1 Binárias visuais

            Neste caso, os componentes do par se encontram suficientemente afastados para serem acessíveis à observação direta, isto é, se observa as duas estrelas individualmente.

            É importante se notar que um determinado afastamento angular, isoladamente, não quer dizer muita coisa com relação à distância que as estrelas se encontram uma da outra. Assim, um determinado afastamento angular pode indicar estrelas relativamente próximas uma da outra, mas que também estão próximas da Terra, ou então estrelas que estão relativamente distanciadas uma da outra.

            A figura 8 mostra isso.

 

 

Figura 2.8. A distância e o afastamento angular.

            Se além do afastamento considerarmos também o período, isto é, o intervalo de tempo que uma leva para dar a volta em torno da outra, aí teremos um dado a mais para estimar a distância entre elas. Assim, se para um dado afastamento angular, se o período for curto, isto indica que as estrelas são próximas uma das outras (geralmente) e, portanto, estão próximas de nós. Por outro lado, um período longo indica que as estrelas estão longe uma da outra, e, portanto, distantes de nós.

            Hoje em dia se conhece aproximadamente 60.000 duplas físicas visuais.

2.2.1.2.2. Binárias espectroscópicas

            As binárias espectroscópicas são um tipo de binárias que não são acessíveis à observação direta, isto é, mesmo com os maiores telescópios não é possível se observar individualmente os componentes do par.

            A duplicidade da estrela é descoberta através da análise do espectro da luz por ela emitida.

            É óbvio que com o advento de telescópios maiores, eventualmente uma binária até então enquadrada na categoria das espectroscópicas pode vir a se deslocar para a categoria das visuais.

            Hoje em dia se conhece cerca de 2.500 binárias espectroscópicas.

2.2.1.2.3 Binárias Eclipsantes

            As binárias eclipsantes serão vistas em estrelas variáveis. Para alguns astrônomos, as binárias eclipsantes são um caso particular das binárias espectroscópicas.

2.2.1.2.4 Binárias Astrométricas

            As binárias astrométricas são aqueles sistemas em que um dos componentes é acessível à observação direta, enquanto que o outro não. A conclusão de que tal sistema é duplo é obtida observando-se as alterações na trajetória do componente que é acessível à observação.

            Tal método também é utilizado para se inferir a existência de planetas ao redor de uma estrela.

            A primeira binária astrométrica a ser descoberta foi Sírius (a estrela mais brilhante do Céu) em 1834, por Gauss, através de cálculos.

            Em 1862, Sírius deixou de ser uma binária astrométrica e passou a ser uma binária visual, uma vez que neste ano, pela primeira vez se observou o companheiro de Sírius (chamado Sírius B, uma vez que Sírius passou a se chamar Sírius A).

            A figura 9 ilustra a trajetória real e a trajetória ideal que uma estrela binária astrométrica possui.

            Já na figura 10, mostramos a trajetória real dos dois componentes do par, bem como a trajetória do baricentro do sistema.

 

 

Figura 2.9. Trajetórias ideal e observada de uma estrela binária.

 

 

 

Figura 2.10. Trajetórias do baricentro e das estrelas do sistema binário.

2.2.1.3 Origem das estrelas binárias

            Atualmente não se conhece com precisão os mecanismos que formam as estrelas de um modo geral. Consequentemente também não se conhece os mecanismos que formam as estrelas binárias. Basicamente, temos três teorias a respeito. As  duas primeiras têm pouco crédito atualmente. A última é a mais promissora e bastante trabalho tem sido feito em cima dela. São elas:

            ð Teoria da captura;

            ð Teoria da divisão;

            ð Teoria da formação múltipla.

2.2.1.3.1 Teoria da captura

            Esta teoria só se aplica bem aos pares bem separados, com períodos longos. Basicamente, esta teoria diz que, num sistema de três estrelas em formação, uma delas, por meio de algum mecanismo, adquire uma grande energia cinética, à custa das companheiras, e abandona o sistema. As duas restantes se “capturam” mutuamente, e passam a girar em torno de um centro de gravidade comum.

2.2.1.3.2 Teoria da divisão

            Esta teoria só pode explicar bem a origem das binárias muito cerradas e de curto período. Basicamente esta teoria nos diz que um corpo em rotação muito rápida, se dicotomizaria, dando origem a dois corpos menores, que continuariam girando em torno de um centro de gravidade comum.

2.2.1.3.3 Teoria da formação múltipla

            É a teoria mais recente  e a mais aceita atualmente. Permite explicar de forma razoável, todos (ou quase todos) os tipos de estrelas duplas observadas, e mais, permite explicar também a formação de estrelas com planetas.

            Segundo esta teoria, há, entre outros, dois fatores básicos que determinam o resultado do processo de formação das estrelas. Estes fatores são a massa (M) e o momento angular (L) da nuvem que vai formar a(s) estrela(s) (e planetas, se for o caso).

            Assim teríamos:

            à Massa (M) grande e momento angular (L) pequeno.

             O resultado seria uma estrela grande em rotação rápida.

            à Massa (M) pequena e momento angular(L) pequeno.

            Se formaria uma estrela menor (pequena), em rotação lenta cercada de planetas, se for o caso.

            É o caso do nosso Sistema Solar.

            à Massa (M) grande e momento angular (L) grande.

            Se formariam duas (ou mais) estrelas.

            Dos valores relativos de M e L, as estrelas seriam cerradas (período pequeno) ou afastadas (período grande), passando por todas as gradações intermediárias.

            à Massa (M) pequena e momento angular (L) grande.

            Neste caso, não seria possível a formação de estrelas, nem de planetas. A nuvem de gás e poeira continuaria como tal.

 

2.2.1.4. Importância do estudo das binárias

            O estudo das binárias é muito importante, uma vez que este é o único método até hoje conhecido, que nos permite calcular de forma direta um dos parâmetros mais importantes de uma estrela, que é a sua massa.

            Na maioria das vezes, na verdade o que se consegue é a massa do conjunto, isto é, a soma das massas das estrelas componentes. Entretanto, algumas vezes é possível se determinar a massa individual de cada componente.

            A única estrela isolada da qual se conhece a massa é o Sol. A massa do Sol é obtida pelo estudo dos movimentos planetários.

            Quando é possível se determinar o centro de gravidade em torno do qual as duas estrelas orbitam (o que geralmente não é fácil de se fazer), então se pode determinar a massa individual de cada uma.

            Quando não, o que se pode determinar é a soma das massas das componentes.

            Assim. quando não se determina (ou não é possível determinar até o momento) a posição do baricentro, obtemos que a soma das massas é dada por:

mA + mB = a3 / p2

            onde:  mA = massa de A (em unidades de massas solares)

mB = massa de B (idem)

a = semi-eixo maior da órbita (em Unidades Astronômicas)

p = período (anos)

            Expressa em parâmetros mais acessíveis à observação, a expressão acima toma a forma:

mA + mB = a3 / q3p2

onde:  mA, mB e p como antes.

a = semi-eixo maior da órbita (em segundos de arco)

q = paralaxe do sistema (em segundos de arco)

            Por exemplo, para a estrela Alfa Centauri, temos:

                        a = 23,4 U.A.

            p = 80 anos

            Daí,

mA + mB = 23,43 / 802   :   mA + mB @ 2 massas solares

            Por outro lado, quando é possível se determinar o baricentro, então podemos formar o seguinte sistema de equações, que uma vez resolvido, nos fornece mA e mB, individualmente.

mA + mB = (aA + aB)3 / p2

mA aA = mB aB

            mA = massa de A (em unidade solar, a massa do Sol = 1)

            mB = massa de B (idem)

            aA = semi-eixo maior da órbita que a estrela A executa em torno do

baricentro (U.A.)

            aB = idem, para a estrela B

            p = período (anos)

Da mesma forma que antes, a expressão se transforma em:

mA + mB = (aA + aB)3 / q3 p2

mA aA = mB aB

            mA, mB e p como antes.

            aA = como antes, mas em segundos de arco

            aB = idem

            q = paralaxe do sistema (segundos de arco)

Exemplo: Novamente para Alfa Centauri, temos:

            p = 80 anos

            aA = 10,5 U.A.

            aB = 12,9 U.A.

Teremos:

            mA + mB = (10,5 + 12,9)3 / 802

            mA . 10,5 = mB . 12,9

Resolvendo para mA e mB, teremos:

            mA @ 1,10 massas solares

            mB @ 0,90 massas solares

Observação: uma massa solar é equivalente a 2 x 1027 toneladas.

 

2.2.2. Estrelas variáveis

2.2.2.1. Introdução

            Num sentido bastante amplo, se chama estrela variável a todas as estrelas cujos fluxos de radiação variam ao longo do tempo. Em primeiro lugar, deve-se observar que esta variabilidade se refere a um intervalo de tempo relativamente pequeno em relação àquela da evolução estrelar.

            Isto porque, de um modo ou de outro, toda a estrela varia ao longo de sua evolução. Em segundo lugar, a variabilidade não se limita apenas à variação do fluxo radiante como um todo (do qual o fluxo luminoso é apenas uma parte), mas também se estende com maior ou menor intensidade a outras características físicas, como por exemplo, o espectro da luz da estrela.

            Aparentemente, na antigüidade, pouca atenção se dava ao fato de algumas estrelas variarem de brilho. Assim, o primeiro registro histórico foi feito em 1596 por David Fabricius, um astrônomo holandês que registrou a variabilidade da estrela Omicron Ceti (Mira Ceti). O período desta estrela é de aproximadamente 11 meses.

            Hoje em dia se conhece aproximadamente umas 15.000 estrelas variáveis, sendo que existem mais 10.000 suspeitas de serem variáveis.

            Atualmente as técnicas mais utilizadas para o estudo das variáveis são as técnicas fotográficas, espectroscópicas e fotoelétricas.

2.2.2.1. Classificação

            As estrelas variáveis são classificadas segundo dois critérios: o primeiro a classifica segundo a causa da variabilidade, enquanto o segundo as classifica conforme as características da sua curva de luz.

2.2.2.2.1. Classificação segundo a causa da variabilidade

            ð Variáveis Extrínsecas (ou variáveis geométricas)

            Neste caso, a variação provem de causas externas à estrela. É o caso por exemplo do eclipse de uma das componentes de um sistema duplo.

            ð Variáveis Intrínsecas (ou variáveis físicas)

            Neste caso, as variações provêm de alterações que se efetuaram nos processos físicos e/ou químicos no interior, bem como nas camadas mais externas destas estrelas.

            Esta classificação, atualmente, é pouco útil.

2.2.2.2.2. Classificação segundo a curva de luz

            Esta classificação é, atualmente a mais útil e, consequentemente a mais utilizada. Segundo ela, as estrelas variáveis se dividem em três grandes grupos:

            ð Variáveis Eclipsantes

            A variabilidade é devida ao eclipse de um componente mais em um sistema de estrelas duplas.

            A figura 11 mostra o protótipo de uma variável eclipsante.

 

 

Figura 2.11. Estrela variável eclipsante.

            ð Variáveis Pulsantes

            Nestas, a variação do brilho é devida a processos que ocorrem na sua atmosfera e nas camadas superiores da estrela. São basicamente processos de contração e expansão destas camadas que indicam que elas são instáveis.

            A figura 12 mostra a dependência da curva de luz de uma tal estrela em função de sua expansão.

Figura 2.12. Curva de luz de uma estrela variável pulsante.

 

            ð Variáveis Eruptivas

            Nestas, as variações de brilho são devidas a processos que ocorrem no interior das estrelas e que alteram a estrutura interna da mesma. Os dois tipos principais de variáveis eruptivas são:

® Tipo novae - normalmente são estrelas anãs, que sofrem uma erupção repentina de brilho (da ordem de 7 a 16 magnitudes) num intervalo de 1 a 100 dias. Após isso, o brilho começa a decrescer, podendo levar anos para atingir novamente um brilho semelhante ao inicial. No decorrer do fenômeno, o espectro varia.

® Tipo supernovae - são estrelas que aumentam de brilho, de forma repentina (de 20 ou mais magnitudes) para depois reduzi-lo lentamente. A curva de luz é bastante parecida com as da novae.

            Atualmente se acredita que uma tal explosão marca o fim da vida de uma estrela massiva (M > M Sol).

            Do decorrer da explosão, a estrela lança no espaço interestelar uma parte considerável de sua massa. Conforme o valor da massa remanescente, teremos que a estrela se transformará numa anã branca (pouca massa) ou numa estrela de nêutrons (massa maior) ou ainda num buraco negro (massa maior ainda).

            A figura 13 mostra uma curva de luz típica para as estrelas novae e supernovae.

 

 

Figura 2.13. Curva de luz de uma estrela variável eruptiva.

2.2.2.3. Importância do estudo das variáveis

            O estudo das variáveis é importante por dois motivos principais. Sob o ponto de vista da astrofísica, tal estudo fornece dados sobre as características físicas (e químicas) das estrelas, bem como sobre os processos que se desenvolvem tanto no seu interior quanto em sua atmosfera. Já  sob o ponto de vista astrométrico, o estudo das variáveis (principalmente das cefeidas que é um tipo de variável) levam aos chamados indicadores de distância que permitiram (e permitem) estimar a distância das galáxias próximas (as pertencentes ao chamado grupo local).

            O princípio de tal estimativa é simples. Consiste basicamente em se determinar a magnitude absoluta a partir de uma determinada característica facilmente observável e mensurável. No caso das cefeidas, observou-se que existe uma relação entre a magnitude absoluta e o período.

            Daí vemos que se medirmos o período, podemos facilmente determinar a magnitude absoluta da estrela.

            Como a magnitude aparente é facilmente determinada, então com o uso da expressão:

            M - m = 5 - 5 log r

            onde:  M = magnitude absoluta

m = magnitude aparente

r = distância (parsecs)

Como se conhece M e m, então se pode determinar r.

Por exemplo, se tivermos para uma variável

            m = +13

            p = 3 dias

então, do gráfico tiramos que, com p = 3 dias, M @ -2,2.

Daí,

            -2,2 - 13 = 5 - 5 log r

            Resolvendo p/r, achamos: r = 10.960 parsecs.

 

 

2.3. Parâmetros físicos, estrutura e fonte de energia das estrelas

2.3.1. Introdução

            Como foi dito anteriormente, estrelas são corpos gasosos, de forma aproximadamente esférica, no interior dos quais se encontram temperaturas e pressões elevadas (bem como densidades elevadas), principalmente junto ao centro.

            Neste centro se encontra a “usina de força” da estrela, uma vez que é aí que ocorrem as reações termonucleares que liberam uma quantidade notável de energia, que se propaga do centro para a periferia da estrela, até ser lançada no espaço sob a forma de radiação eletromagnética (e fluxo de partículas de matéria).

            Na verdade, tudo o que se conhece (ou se presume conhecer) sobre as estrelas se baseia na aplicação das leis da física, tal qual como as conhecemos na Terra, a esses corpos. O que se obtém então é um modelo de como deve ser composta a matéria sob estas condições. A validade do modelo é testada comparando-se os valores dos parâmetros físicos obtidos através do modelo (raio, temperatura superficial, fluxo de energia, etc.) com aqueles obtidos das observações das estrelas reais.

            Vemos, assim, que a tarefa de investigar a estrutura interna de uma estrela é um típico problema da “caixa-preta”, isto é, a partir do conhecimento de certos fatos externos a estrela, tentamos imaginar através de um modelo teórico plausível, o que há dentro dela e qual o seu mecanismo de funcionamento. O modelo será tanto mais bem sucedido, e portanto mais plausível, quanto melhor as suas predições concordarem com o que é observado.

 

 

2.3.2. Parâmetros Físicos das Estrelas

            As estrelas, tais como quaisquer corpos do universo, são caracterizados por diversos parâmetros físicos. A estrutura da estrela é inferida pelos valores destes parâmetros.

            Para todas as estrelas, existem três parâmetros que possuem importância fundamental. São eles: a luminosidade (L), que é a energia emitida, por unidade de tempo, em todas as direções e em todos os cumprimentos de onda e é medida em W; a massa (M), que é a medida em kg e é determinada pelo estudo dos sistemas duplos; o raio (R) que é medido em metros e é determinado, em alguns casos, pelo conhecimento da distância (estrelas variáveis) e do diâmetro angular, e em outros por medidas interferométricas.

            Existem outros parâmetros físicos que também auxiliam o estudo astrofísico das estrelas. Entre eles, podemos citar a temperatura efetiva (Te), a gravidade superficial (g), a massa específica média (r) e a taxa média de geração de energia por unidade de massa (e), sendo que estes dois parâmetros possuem um significado um bastante grande.

            A massa específica média é dada por:

            r = M / V

como o volume V é dado em função do raio R por

            V = 4/3 . p. R3,

então,

            r = M / (4 / 3 p R3)  em kg/m3

ou seja, temos  r  expresso como uma função de M e R.

A taxa média de geração de energia por unidade de massa é dada por

            e =     L / M       (W/kg)

ou seja, temos  e  expresso em função de M e de L.

Para o nosso Sol, por exemplo, estes parâmetros são: (¤ = Sol)

            M¤ » 2x1030 kg

            R¤ » 7x108 m

            L¤ » 4x1026 W

            e

            r » 1,4x103 kg/m3

            e » 2x10-4 W/kg

            Um estudo acurado dos dados disponíveis mostra que a grande maioria das estrelas possuem parâmetros dados na seguinte faixa:

 

0,8x10-2 M¤ £ ME £ 50M¤

5x10-3 R¤ £ RE £ 3x102 R¤

10-3 L¤ £ LE £ 2x105 L¤

Já para as quantidades r e e, temos

            10-3 kg/m3 £  r  £ 1011 kg/m3

            2x10-6  W/kg   £   e  £ 2 W/kg

            O amplo intervalo de geração média de energia por unidade de massa indica que a fonte de energia deve ser sensível as condições físicas no interior das estrelas.

            Através de um modelo no qual se considera que a estrela é uma esfera de gás em equilíbrio, se chega a expressões razoavelmente complicadas que nos fornecem a pressão, a massa específica e a temperatura em qualquer ponto da estrela, em função da distância ao centro.

2.3.3. Estrutura das Estrelas

            Hoje em dia, segundo as mais recentes teorias da física e da astronomia, se acredita que as estrelas são enormes esferas de gás, no núcleo das quais ocorrem reações termonucleares, isto é, há fusão de um elemento (geralmente o hidrogênio) em outro (geralmente o hélio), com liberação de uma quantidade enorme de energia, que após atravessar as camadas mais externas da estrela é lançada no espaço interestelar.

            Como facilmente se pode entender, o que conhecemos (ou acreditamos conhecer) a respeito do interior das estrelas se baseia em modelos, uma vez que o interior de tais astros nos é inacessível diretamente (pelo menos por enquanto, e provavelmente sempre o será). Tais modelos são obtidos através de simulações em computadores, e os resultados são comparados com as observações. Desta forma, quanto mais próximo da realidade forem os resultados do modelo, mais crédito ele merece.

            Por outro lado, como o Sol é a estrela que melhor conhecemos, por motivos óbvios, e como veremos posteriormente, o Sol é uma estrela “típica”, então os modelos são testados usando-se o Sol como “laboratório”.

            Os dois principais parâmetros que interessam ao se construir um modelo de uma estrela, são a sua massa (M) e a sua composição química.

            De posse destes dados, juntamente com as leis da Física que regem o comportamento da matéria, se calcula o raio (R) e a luminosidade (L) da estrela.

            Além disso, se calcula também sua temperatura superficial, bem como a temperatura, a pressão e a massa específica em qualquer ponto do seu interior.

            Entre as diversas leis da física que interessam, existem algumas que se sobressaem. São elas a lei da gravitação e a termodinâmica.

            Assim, se acredita, e é bastante plausível esta hipótese, que, com exceção de alguns casos raros, as estrelas são corpos em equilíbrio, no qual o peso das camadas mais externas (causado pela atração gravitacional das camadas mais internas) é suportado pela pressão das camadas mais internas.

            Assim, em qualquer ponto da estrela, estas duas forças estão em equilíbrio.

            No centro da estrela, ocorrem reações termonucleares, que geram energia (a rigor há transformação de massa em energia, segundo a equação E = mc2). Esta energia tem que escapar do núcleo para o espaço exterior.

            Há dois mecanismos principais pelos quais esta energia pode escapar: o mecanismo de radiação e o mecanismo de convecção.

            A eficiência do mecanismo de radiação é fortemente influenciado pela permeabilidade da matéria estrelar à radiação. Assim, quando a radiação por si só não dá conta da tarefa, intervém o fenômeno da convecção, mais eficiente. Geralmente, os dois fenômenos ocorrem juntos, e como veremos posteriormente, em algumas regiões da estrela, um prevalece sobre o outro.

            Se todos estes parâmetros (e mais alguns) forem introduzidos num programa de computador feito especialmente para isso, o resultado fornece, para cada camada da “estrela”, a nossa escolha, a temperatura, a massa específica, a pressão, a intensidade do fluxo de energia para fora, etc.

            Vamos admitir então, que solicitamos uma simulação do Sol. Fornecemos a massa do Sol e a composição química das camadas externas      (que é a que nos é possível determinar), isto é, consideramos o Sol como sendo uma enorme massa de gás com composição química uniforme (no caso, para cada kg da matéria, teríamos 700g de H, 297g de He e 3g de outros elementos).

            Após os cálculos, o computador nos dá entre outros, os seguintes parâmetros:

            R @ 0,92 R¤

            L @ 0,75 L¤

            Ts @ 0,97 Ts¤

            (Por hipótese, M = M¤)

O nosso modelo também fornece:

            r centro = 100 g/cm3  (13 vezes a do ferro)

            p centro = 200 bilhões de atmosferas

            T centro = 30 milhões de °C

            A energia das regiões internas é transportada por radiação. Nas camadas externas, porém, este mecanismo sozinho não consegue executar a tarefa, e aí, o mecanismo da convecção se encarrega de transportar energia até a superfície, que é exatamente  o que se observa no nosso Sol.

Num diagrama, teríamos:

 

Figura 2.14. Estrutura de uma estrela média (como o Sol).

As convenções para a figura são:

a) Para a região onde ocorrem as reações termonucleares.

           

            b) Para o transporte de energia

           

            c) Para a composição química

           

 

            Pode-se observar que não se obteve do nosso modelo, valores mais exatos com os raios do Sol (principalmente no que se refere ao raio e à luminosidade).

            O que ocorre é que nosso modelo considerou uma massa de gás com composição química uniforme, ou seja, obtivemos os parâmetros que o Sol deverá ter tido quando nasceu.

            Como veremos posteriormente, a reação termonuclear “queima” o H, transformando-o em He, ou seja, o He é a “cinza” das reações termonucleares. Assim, como o Sol já deve estar brilhando 4,5 bilhões de anos, o material de seu núcleo deve estar enriquecido de He.

            Pode-se calcular que a composição química do gás no núcleo deve ter atualmente, por quilo, umas 590g de He, 407g de H e umas 3g de outros elementos.

            Quando estes dados são alimentados no computador, o modelo resultante fornece resultados em excelente concordância com o nosso Sol atual.

            Se repetirmos os cálculos com estrelas de massas diversas, mas com a mesma composição química uniforme que havíamos usado para achar o modelo do nosso “Sol primordial”, obteremos modelos que apresentam valores bastante próximos dos reais, observados nas estrelas do céu. Aqui também, as correções uma vez feitas, indicam valores bem próximos (quase exatos) com os observados.

            Assim, por exemplo, se M = 10 M¤ que é o caso da Spica (Alfa Virginis) que é a estrela mais brilhante da constelação de Virgem, o modelo fornece resultados em excelência concordância com os observados em Spica.

            R @ 2,6 R¤   

            L @ 6.000 L¤

            Ts @ 24.000 °C

O modelo também fornece

            r centro @ 8 g/cm3   

            p centro @  35 bilhões de atmosferas

            T @ centro 28 milhões de graus centígrados

            A energia liberada no centro (no 1/5 do raio mais interno) é tamanha, que a radiação não dá conta. Neste caso, no interior da estrela, a matéria está em convecção.

 

            Diagramaticamente, teríamos, usando as mesmas convenções para o Sol.

 

 

Figura 2.15. Estrutura de uma estrela gigante.

            Por outro lado, se M= 0,6 M¤, que é o caso de Cygni 61 (uma anã vermelha da constelação do Cisne - em latim Cygnus) novamente o modelo fornece resultados bastante exatos.

Neste caso, obtivemos

            R @  0,3 R¤

            L @ 0,05 L¤

            T @ 4000 °C

 

O modelo também fornece

            r centro @ 65 g/cm3

            p centro @ 75 bilhões de atmosferas

            T centro @ 8 milhões de graus centígrados

 

            No centro, a energia, como no Sol, é transportada por radiação. Na parte externa a energia passa a ser transportada por convecção, mas a zona de convecção é bem mais espessa que no Sol.

            Em diagrama, usando as mesmas convenções para o Sol, teríamos:

 

 

Figura 2.16. Estrutura de uma estrela anã.

            Nas estrelas menores, a zona de convecção é cada vez mais espessa, até que naquelas com apenas alguns décimos de M¤, toda a estrela, desde o centro até a superfície, se encontram em movimento de convecção.

            Também se observa que há um limite inferior para a massa de uma estrela (com a composição química dada), bem como uma massa superior.

            A massa inferior é determinada como sendo de 0,08 M¤. Neste caso, para massas inferiores, a estrela não “acende”, isto é, a temperatura no seu interior não atinge o limite para iniciar as reações termonucleares. Isto bate com o observado.

            A massa superior é determinada como sendo de aproximadamente 90 M¤. Neste caso, para as massas superiores, ocorrem processos de instabilidade, no qual a estrela se livra do seu excesso de massa, de modo a massa remanescente ser de aproximadamente 90 M¤. Isto também concorda muito bem com o observado.

 

2.4. Fonte de energia das estrelas

            A fonte de energia das estrelas foi, até recentemente (tendo em vista o tempo de vida da Astronomia), um mistério. Somente neste século (na década de 20), foram elaboradas teorias coerentes sobre a fonte de energia que faz as estrelas brilharem.

            Estas teorias estão firmemente apoiadas na Física Nuclear. Assim, se acredita firmemente que as estrelas brilham devido a energia nuclear que é gerada no seu núcleo. É importante frisar que não se pode afirmar categoricamente que a fonte de energia das estrelas é a energia nuclear. O que ocorre é que esta fonte tem poder suficiente para explicar o que se observa.

            Existem basicamente dois processos de fusão nuclear, que é a reação nuclear  que fornece energia para a estrela. Uma reação é chamada “cadeia próton-próton” e a outra é o chamado “ciclo de carbono”.

            Na realidade, ambos os processos podem existir (e geralmente existem) simultaneamente numa estrela quando a composição química assim o permite. Qual é a reação que predomina depende da temperatura.

2.4.1. A Cadeia Próton-Próton

            É a reação de fusão que prevalece nas estrelas com temperaturas do núcleo da ordem de 10 milhões de graus centígrados, bem como aquela única possível em estrelas que somente possuem praticamente o hidrogênio e o hélio como componentes. Desta forma, nas estrelas primordiais, isto é, aquelas que nasceram logo após, o “big-bang”, e que eram formadas somente de H e He, que foram praticamente os únicos elementos formados no “big-bang”, a fonte de energia é a cadeia próton-próton.

            A figura abaixo ilustra, de forma esquemática, o processo.

Figura 2.17. A cadeia próton - próton.

            Na figura 18 (a), dois prótons (núcleo de hidrogênio), vão de encontro um do outro e se unem. Entretanto, dois prótons unidos possuem uma energia mais do que a necessária para ficarem unidos. Para que eles possam ficar unidos, eles devem se desfazer deste excesso de energia.

            Assim, eles emitem um pósitron (elétron positivo) e um neutrino; estas duas partículas carregam consigo o excesso de energia. Isto é mostrado na figura 18 (b), onde um dos prótons se transformou num nêutron, havendo a expulsão de um pósitron (e+) e de um neutrino (Ö).

            O que se tem então é um núcleo de Deutério (ou hidrogênio pesado), composto de um próton e um nêutron.

            Na figura 18 (c), o núcleo de deutério assim formado encontra um outro próton que a ele se junta dando como resultado um núcleo de He3, um isótopo leve do Hélio, conforme mostrado na figura 18 (d). Novamente é liberada energia, desta vez na forma de radiação.

            Na figura 18 (e), um núcleo de He3, encontra um outro núcleo de He3, formado de forma similar, dando como resultado um núcleo de He4 e mais dois prótons.

            O resultado final da reação é que 4 núcleos de Hidrogênio se reuniram para formar um núcleo de Hélio, com liberação de energia no processo.

            Esta energia pode ser calculada pela famosa equação de Einstein.

            E = mc2

onde:

            E= energia (J)

            m= massa (kg)

            c= velocidade da luz no vácuo (c= 3 x 108 m/s)

 

            A energia gerada na transformação de 4 núcleos de hidrogênio, em um núcleo de hélio provém da chamada “perda de massa”. Isto porque cada núcleo de hidrogênio tem uma massa de 1,00828 u.ma, enquanto que o núcleo do hélio tem uma massa de 4,00392 u.ma.

            Daí, há uma perda de massa de

            4 x 1,00828 - 4,00392 = 0,0292 u.ma

            É esta quantidade de massa que é transformada em energia.

            Assim, se pode calcular que a conversão de 1 kg de H se transformando em 992,8 g de He, aproximadamente, gera uma energia da ordem de 606 x 1014J.

            Finalmente, é possível determinar que para estrelas de massa igual ou inferior a 2 M¤, a reação próton-próton é a principal fonte de energia. Tal é o caso do Sol, portanto.

2.4.2. O Ciclo do Carbono

            O ciclo do carbono, também conhecido como ciclo do carbono-nitrogênio, é uma outra reação termonuclear que também é responsável pela geração de energia no núcleo das estrelas. Esta reação é a que prevalece no núcleo de estrelas com massas superiores a 2M¤. Obviamente, como veremos, esta reação só é possível naquelas estrelas de 2ª ou 3ª geração, isto é, aquelas estrelas que se transformaram dos restos lançados ao espaço por ocasião da “morte” de estrelas anteriores. Isto porque é necessária a presença de elementos mais “pesados” (carbono e/ou nitrogênio e/ou oxigênio).

 

Figura 2.18. Ciclo do carbono.

Como aconteceu para a cadeia próton-próton, o resultado final é a transformação de quatro núcleos de H em um núcleo de He, com liberação de energia no processo. A figura 19 ilustra de forma esquemática, processos que intervém no ciclo do carbono.

            Na figura 19 (a), temos o encontro de um núcleo de hidrogênio com um núcleo isótopo 12 de carbono C12. O núcleo de hidrogênio se incorpora ao núcleo de carbono, com a emissão de radiação. O resultado é a produção de um núcleo de isótopo 13 do nitrogênio, o N13 que é radiativo. Este isótopo emite um pósitron (e+) e um neutrino (n), conforme mostrado na figura 19 (b), se transformado no isótopo 13 do carbono, o C13, conforme mostrado na figura 19 (c).

            Na figura 19 (c), mostra-se o encontro do núcleo de C13 com um próton, há incorporação do próton ao núcleo de C13, com a emissão de radiatividade  e o resultado é um núcleo de nitrogênio N14, mostrado na figura 19 (d).

            Nesta figura mostra-se também o encontro de mais um próton com o núcleo de N14, também com a emissão de radiação e transformação em um núcleo de oxigênio 15, O15, mostrado na figura 19 (e).

            Este núcleo de O15 é radiativo, e pela emissão de um próton (e+) e de um neutrino (n), conforme mostrado na figura 19 (e), se transforma em um núcleo de Nitrogênio 15, N15, conforme mostrado na figura 19 (f).

            O encontro de um núcleo de H com o núcleo de N15, com quase imediata expulsão de um núcleo de He4 é mostrado na figura 19 (f) também.

            O resultado final é novamente um núcleo de C12, idêntico ao que tínhamos no início do ciclo.

            Por uma análise rápida, pode-se ver que o carbono se conservou, ao final da reação, e que o resultado líquido foi a transformação de quatro núcleos de H1 (que entraram no ciclo nas figuras 19 (a), (c), (d) e (f) ), em um núcleo de He4 (que saiu do ciclo na figura 19 (f) ).

            Também é importante se notar que o ciclo pode começar em qualquer ponto, isto é, basta termos apenas um dos diversos isótopos mostrados para que o ciclo inicie.

            A energia final liberada no ciclo é idêntica àquela liberada na cadeia próton-próton.

            Em ambos os processos de geração de energia, se pode ver que há produção de pósitrons e neutrinos. No caso da cadeia próton-próton, os neutrinos formados possuem baixa energia (além de só se formar um neutrino), enquanto que no ciclo do carbono, além de se formarem 2 neutrinos, eles possuem elevada energia. Em qualquer caso, esta energia é levada para o exterior da estrela e não contribui para o seu brilho. Os pósitrons gerados em ambos os processos logo se encontram com elétrons e se aniquilam com estes últimos, com a geração de radiação. Esta radiação, embora pequena, contribui para o brilho da estrela.

2.5. O diagrama Hertzsprung-Russel, “HR”

            Como foi visto nos capítulos anteriores, as estrelas possuem diferentes tamanhos, cores, temperaturas, massas e brilhos.

            Após muitos anos de estudos, a Astronomia finalmente estabeleceu uma relação entre as variáveis das estrelas. Deve-se o fato a dois pesquisadores, o norueguês Ejnar Hertzsprung e o americano Henry Norris Russel.

            O método por eles criado, resolveu a relação entre os parâmetros das estrelas através de um gráfico que ficou conhecido como diagrama HR. Talvez, seja no estudo da Astrofísica, um dos passos mais importantes e que veio resolver as principais questões acerca das estrelas.

            Conhecemos a relação entre a cor e a temperatura. Sabe-se que as estrelas mais frias são vermelhas e as mais quentes são as brancas e azuis. As coordenadas do gráfico HR são a temperatura da superfície da estrela e o seu brilho comparado ao sol. Entende-se por brilho como a intensidade de energia irradiada pelo astro. Pode-se utilizar também a magnitude como ordenada. A abcissa é a temperatura que está em ordem crescente da direita para a esquerda. Por razões de natureza prática sua escala é logarítmica. Nesta mesma posição do gráfico costuma se plotar também o tipo espectral de estrela.

Figura 2.19. Irradiação e temperatura do Sol.

            A posição do Sol no diagrama é particularmente importante, pois divide o diagrama em regiões distintas. Assim, é que, à direita do Sol se encontram as estrelas de menor temperatura que ele, ao passo que acima do mesmo estão as estrelas com brilho mais intenso.

Figura 2.20. Características do diagrama HR

            Algumas estrelas, nossas conhecidas, podem ser plotadas no gráfico conforme a figura abaixo.

Figura 2.21. Estrelas conhecidas e sua posição no diagrama HR.

 

            As estrelas situadas a direita do Sol, Beltegeuse e Alfa do Cocheiro, são vermelhas e frias, porém irradiam quantidades de energia muito maiores que nosso astro. A esquerda do Sol notamos Spica, Beta do Cocheiro, Sírius A e Sírius B, todas mais quentes do que nossa estrela, com apenas uma menos irradiante.

            A medida que completamos o diagrama com mais e mais estrelas, vamos notando que certas formações se agrupam como famílias em torno de uma tendência central, que se forma da esquerda para a direita e de cima para baixo. A este ramo peculiar denomina-se Seqüência Principal.

Figura 2.22. A seqüência principal.

            Esta Seqüência Principal (SP) será o marco fundamental no estudo das estrelas, pois a partir de sua análise é que se conclui tudo que se conhece hoje acerca da evolução das estrelas.

            A linha da SP separa o diagrama HR em quadrantes que definem os estágios iniciais e finais da vida de uma estrela. Ela própria a Seqüência Principal é parte integrante da vida estrelar, e como veremos nos capítulos seguintes o momento mais importante da vida de uma estrela. Uma estrela que se encontra na seqüência principal, está na fase de estabilidade e significa que tem muito combustível ainda para queimar. Para nossa satisfação o Sol ocupa posição nesta linha do diagrama HR.

            A grande maioria das estrelas que se plotam no diagrama aparecem na Seqüência Principal. Isto sem dúvida indica que se trata de um divisor de águas do gráfico e que as estrelas que se encontram em posições outras que não a SP devem ser diferentes em muito da “normalidade” estrelar. Podemos garantir que as regiões fora da SP abrigam de fato estrelas que são fenômenos ou etapas peliculares da vida destes astros.

            A direita da SP e na parte superior do diagrama, se localiza a área das estrelas gigantes e super gigantes, porém de baixa temperatura. No mesmo lado da SP, mas abaixo do gráfico se encontram as proto-estrelas. Em baixo no lado esquerdo da SP estão as anãs, estrelas pequenas de alto brilho. O diagrama abaixo demonstra as diferentes zonas do HR.

 

Figura 2.23. Distribuição das estrelas no diagrama HR

            Analisando ainda a SP podemos deduzir algumas leis de formação que se revelam verdadeiras para todas as estrelas que se plotarem aí. Uma destas leis é a que diz que na SP em cada ponto dela se encontram apenas estrelas de uma mesma massa, e que as mais massivas se localizam na parte superior do gráfico. Assim é valido dizer que na SP a massa de uma estrela cresce da direita para a esquerda e de baixo para cima, no próximo diagrama:

Figura 2.24. Massa das estrelas no diagrama HR

 

            Podemos concluir desta lei que quanto maior a estrela, maior o seu brilho. Ora, isto era de se esperar pois a luminosidade de uma fonte de luz é proporcional a sua área, que sem dúvida depende do tamanho do raio, que em última instância se relaciona com a massa (na SP). Assim que se plotarmos uma estrela no HR e ela cair na SP, podemos por comparação deduzir tamanho, massa e volume.

            O diagrama HR se mostra utilíssimo para estudos de grupos específicos de estrela. Algumas estrelas se reúnem em “manadas” que chamamos de aglomerados. Um destes aglomerados mais conhecidos é o das Plêiades. O diagrama das Plêiades nos mostra:

Figura 2.25. Distribuição das Plêiades no diagrama HR.

            Para o aglomerado das Híades temos:

 

Figura 2.26. Distribuição das Híades no diagrama HR.

            A simples comparação entre dois diagramas nos leva a concluir que as estrelas que compõe as Plêiades são dez vezes mais brilhantes que as outras. Em ambos os aglomerados existem desvios da SP para a zona das gigantes. Quanto mais grupos plotarmos em diagramas HR, veremos com clareza que as estrelas que os compõe se desviam da SP justamente para as estrelas de maior irradiação, ou brilho.

 

Figura 2.27. Grupos de estrelas plotados no diagrama HR.

            Outro fator que se observa no diagrama HR é a expectativa de vida de uma estrela. Na SP, uma estrela quanto mais acima se situa, menor a sua permanência, ou seja, menos tempo de vida estável. Isto é compreensível pois, quanto maior o astro, maior a irradiação para o meio exterior e consequentemente menor a vida, pela rápida queima do combustível. Isto se tornará mais claro quando no capítulo seguinte tratarmos da evolução estelar.

 

Figura 2.28. Relação entre massa e vida estelar

 

Figura 2.29. O Diagrama HR completo.

2.6. A evolução das estrelas

            Quando olhamos o céu noturno, reparamos inúmeros astros dos mais variados brilhos e cores diferentes. Sabemos que as razões estão ligadas a aspectos físicos das estrelas. Assim que as estrelas possuem cores diferentes de acordo com sua temperatura superficial e o espectro de sua luz:

 

Cor

Espectro

Temperatura

Azul

O

25.000 - 36.000 K

Azul-esbranquiçada

B

15.000 - 25.000 K

Branca

A

  9.000 - 15.000 K

Branco-amarelada

F

6.000 - 9.000 K

Amarela

G

5.000 - 6.000 K

Laranja

K

5.000 - 6.000 K

Vermelha

M

R

S

4.500 - 4.000 K

4.000 - 3.500 K

3.500 - 3.000 K

 

Tabela 2.3.

            Estes aspectos diferenciados entre as estrelas não significam apenas astros distintos, mas principalmente fases diferentes de suas vidas. Assim é que veremos neste capítulo que as estrelas, como qualquer habitante deste universo, nascem, crescem e morrem.

2.6.1. O nascimento das estrelas

            O espaço interestelar não é um vazio absoluto, gases se espalham pelo “vácuo” numa  densidade  de  um  átomo de H por cm3 a uma temperatura de -170 ºC.

            Nos locais aonde nascem as estrelas estes gases e poeiras se encontram bem mais concentrados: 10.000 átomos por centímetro cúbico. Quando uma nuvem destas se comprime a ponto de perturbar o meio ao seu redor estamos diante de um berço de estrelas.

            A gravidade gerada pela concentração dos gases e poeiras em uma nuvem destas é responsável pelo que chamamos de colapso gravitacional, resultando no acendimento dos átomos de Hidrogênio num processo de fusão nuclear. Os gases naturalmente têm tendência a se expandir, porém a partir do momento que a nuvem entra em colapso gravitacional a expansão é refreada a tal ponto que o processo se torna irreversível.

 

Figura 2.30. Forças de expansão(FE) versus forças gravitacionais (FG).

            Dentre as possíveis causas do colapso gravitacional, podemos afirmar que o movimento de rotação das galáxias provoca através da passagem dos braços, ondas de compressão no meio estrelar que geram o aglutinamento das poeiras e gases.

 

Figura 2.31. Rotação da galáxia e ondas de compressão.

 

            Após iniciado, este processo irreversível, depende somente do tamanho da nuvem formador o fato de termos uma estrela maior ou menor, mais massiva ou menos, de cor amarela ou azul e assim por diante. O nosso Sol é resultado da contração de uma nuvem formadora que tinha algo em torno de 5.000.000 de diâmetros solares e uma densidade calculada de 60.000 átomos por centímetro cúbico. O tempo necessário para esta nuvem se tornar um proto-Sol foi de 500.000 anos terrestres.

            No início do processo, o H está todo reunido em moléculas de H2 e a temperatura ainda relativamente baixa o mantém rarefeito. Após alguns milhares de anos o gás se torna condensado e quente na região central da nuvem a ponto de não mais irradiar calor para o meio circundante e inicia o processo de fusão nuclear na futura estrela. Ao atingir 2.000 ºC, o H2 se desintegra e estamos na presença de  uma proto-estrela. Nesta fase do nascimento a proto-estrela está envolta por gases e poeiras não sendo ainda visível o seu brilho e sua luz fulgurante. A estrela se tornará visível quando a temperatura de seu núcleo atingir 10.000.000 ºC.

            No diagrama HR as proto-estrelas ocupam a faixa de temperatura superficial até 3.500 ºC e após formadas irão se estabelecer na seqüência principal, aonde queimarão seu combustível nuclear enquanto dele dispuserem. A posição que ocuparão na SP depende somente da massa inicial.

Figura 2.32. Relação entre irradiação estelar e tempo de vida.

 

            Na fase proto-estrela o núcleo produz exclusivamente Hélio a partir do Hidrogênio, utilizando uma das reações vistas, como o ciclo de Bethe ou a cadeia próton-próton, sendo que as primeiras estrelas do universo se utilizaram deste último método por absoluta falta de outros elementos no caldo cósmico inicial.

            As nuvens de poeira e gás são o resultado da morte de estrelas mais velhas como veremos adiante, sendo portanto o universo aparentemente renovável.

           

2.6.2. A vida das estrelas

            A fase que chamamos de vida das estrelas, é sua permanência na SP. Nesta sua maior parte da vida a estrela se mantém estável com a transformação do H em He ocorrendo no seu núcleo até que se esgote tal reação atômica.

 

Figura 2.33. Transformação de Hidrogênio em Hélio nas estrelas.

 

            Durante sua permanência na SP uma estrela pode abrigar planetas como o nosso e dependendo da quantidade de massa que a formou, ela ocupará uma posição determinada na SP, tanto mais acima quanto maior a massa. Resta dizer que quanto maior a massa, menor a expectativa de vida de uma estrela, pois queima e irradiação de seu combustível é diretamente proporcional ao tamanho da área.

 

Figura 2.34. A irradiação de energia e a extensão de vida das estrelas.

 

 

2.6.3. Morte das estrelas

            Após permanecerem por longo período na seqüência principal, as estrelas finalmente começam a apresentar desequilíbrio entre a quantidade de Hélio e Hidrogênio com um ligeiro favorecimento para o Hélio. Assim é que no centro da estrela o Hélio se torna o gerador de outros elementos como o Carbono e o Oxigênio. A temperatura que cai a partir do centro favorece a fusão destes outros elementos químicos e neste momento a estrela começa a deixar a seqüência principal. Ela se deslocará para a zona das Gigantes Vermelhas no diagrama HR.

            Assim é que as camadas sucessivas a partir do núcleo começam a ser produzidos os outros elementos, e quando o Hélio também se esgotar no centro teremos a produção de Carbono e Oxigênio no núcleo. Estes elementos vão se alterando no núcleo até que a estrela se apague denunciando o seu final. O que acontece com cada qual delas vai depender de sua massa e é assunto para ser detalhado no próximo capítulo.

 

2.7. Estrelas cataclísmicas

            Como visto no capítulo anterior, o destino final de uma estrela depende de sua massa inicial. Quanto maior a massa, menor a vida. Quando o combustível do Sol se esgotar no seu núcleo, ele se tornará uma gigante vermelha e engolfará todos os planetas até a órbita de Marte. Após queimar todo o Hélio no centro, o Sol se apagará em uma anã branca de pouco brilho e muita temperatura. Antes disto porém dispersará 2% de sua massa pelo espaço a sua volta.

 

Figura 2.35. Destino final do Sol.

 

            Noventa por cento das estrelas terão um fim de vida semelhante ao do Sol, pois possuem massas próximas a do próprio. Porém, para os 10% que restam o final será diferente.

 

 

2.7.1. Novae

            Para estrelas com tamanhos entre 5 e 9 massas solares, a rápida queima do combustível nuclear, faz com que em poucos milhares de anos a estrela evolua para uma gigante vermelha.

            Como sua massa é muito grande, a estrela tende a um colapso gravitacional suplementar, quando se transforma em Gigante Vermelha.

            As camadas externas expandidas se resfriam e se precipitam sobre o núcleo reacendendo a fusão de Hidrogênio e Hélio. Cada vez que isto acontece, a estrela vai se tornando fria e azulada e sua expansão é refreada, sempre que atinge um certo volume. Desta forma esta estrela parece estar pulsando e a expansão seguida da contração mantém o núcleo aquecido. São as variáveis Cefeidas e o ritmo de sua pulsação é bastante regular.

 

 

Figura 2.36. Pulsação de uma variável Cefeida.

 

            Quando no núcleo o elemento predominante for o Carbono, as camadas mais internas se contraem e as externas se expandem, formando uma capa atmosférica na estrela:

 

 

Figura 2.37. Formação de uma capa atmosférica.

            A estrela volta então a brilhar como gigante vermelha. Este ciclo pode se repetir até que o núcleo esteja formado por um material tão denso como o ferro. A partir daí o núcleo se apaga e as camadas exteriores se precipitam para o centro, aquecendo-se violentamente e explodindo para o espaço espetacularmente.

Figura 2.38. Explosão de uma estrela Novae.

 

            A explosão irá lançar ao espaço 1 a 2% da matéria estrelar e o astro brilhará intensamente por um breve período. Em razão deste brilho repentino que foram chamadas de estrelas Novas.

 

2.7.2. Supernovae

 

            A partir de 8  ou 9 massas solares, o destino das estrelas é ainda mais cataclísmico, pois o processo anterior é aqui intensificado de tal forma que não só as camadas externas explodem, parte do núcleo também se fissura, o que provocará ondas de choque a partir do centro da estrela. O núcleo da estrela se torna tão denso que átomos se comprimem até que as partículas se misturem num mar de nêutrons e prótons. O raio de ação de uma Supernova atinge até 30 al.

 

Figura 2.39. Explosão de uma estrela Supernovae.

2.7.3. Estrelas de Nêutrons

            Após a explosão da Supernova o que restará do núcleo superdenso se transforma em um corpo sólido de nêutrons. Os cálculos mostram que o centro da estrela se reduz a uma esfera de 30 quilômetros de diâmetro em um mar de nêutrons, cuja densidade atinge 10 trilhões de toneladas por cm3. Tais astros são possíveis de detectar por rádio telescópio, uma vez que continuam a girar em torno de um eixo emitindo pulsos de raios X para o espaço circundante.

 

 

Figura 2.40. Uma estrela de nêutrons.

 

 

2.7.4. Buraco Negro

            Se a densidade da estrela for tal que um certo limite seja ultrapassado, a estrela de nêutrons se tornará então um buraco negro.

            Toda a massa se concentrará em um só ponto e a gravidade será de tal ordem que nem a luz conseguirá escapar dali. Existe o que se chama de horizonte de eventos do buraco negro, a partir do qual nenhum objeto escapará de ser tragado pela força descomunal do próprio.

            Esta singularidade é detectável quando temos no céu algum astro próximo do evento sendo tragado pelo buraco negro.

            Para que um astro gere um buraco negro, foi calculado pelo físico Schwarzschild um limite para seu diâmetro relativo à massa:

Rs = 2G M/c2

 

                Para o Sol, se este tivesse um diâmetro de 6 km, seria um futuro Buraco Negro.

 

 

Figura 2.41. Buraco negro (BN) próximo a uma estrela.


 

CAPÍTULO 3

Meio Interestelar

 

Alfredo Martins


CAPÍTULO 3 - MEIO INTERESTELAR

3.1. Introdução

            A observação de céu estrelado à vista desarmada não oferece indicativos explícitos da natureza do espaço que separa as estrelas. A impressão inicial é de que pouca matéria e baixa atividade astrofísica ali ocorrem. Fica a idéia de vácuo. Entretanto, observação cuidadosa e uso de instrumentos adequados revelam fenômenos dos mais variados, cuja importância é essencial para compreensão da astronomia. Para caracterizar esta afirmação, podemos adiantar que é nele que ocorre o nascimento de estrelas, cuja conseqüência será também o aparecimento de planetas e da vida.

            Diríamos então, que meio interestelar é conjunto de gás e poeira existente no espaço que separa as estrelas de uma galáxia. O gás é predominantemente o hidrogênio, ocorrendo na forma atômica (H), molecular (H2) ou ionizada (H+). A poeira é um agregado de moléculas na forma sólida cuja complexidade e variedade é muito grande (H2O, SiO2, NH3, CH3NH2 etc.).

            A caracterização destes dois constituintes, gás e poeira, do meio interestelar, pode ser demostrada por duas ocorrências observadas:

            ð Nebulosas de emissão - nuvens de gás rarefeito, que emitem radiação na região visível do espectro. Elas se encontram associadas a uma ou a um grupo de estrelas. O gás é excitado pela radiação ultravioleta da estrela, determinando sua ionização. Ocasionalmente, elétrons são recapturados, liberando fótons no comprimento de onda visível do espectro. Exemplo: Nebulosa da Lagoa (conhecida como M8), em Sagitário.

 

 

Figura 3.1. Nebulosa de emissão.

 

ð Nebulosas de reflexão - nuvens contendo poeira, que determina a reflexão na superfície das partículas da radiação (luz), provinda de estrelas próximas. Exemplo: a nebulosidade envolvendo as Plêiades.

 

 

Figura 3.2. Nebulosa de reflexão.

 

            Nota-se que dois fenômenos podem ocorrer simultaneamente. A fluorescência dos gases e a reflexão da luz pelos grãos de poeira, ocorrendo ao mesmo tempo, formam as nebulosas do tipo misto.

 

3.2. Radiação eletromagnética

            O estudo do meio interestelar baseia-se substancialmente na análise da radiação eletromagnética por ele emitida. Radiação eletromagnética é constituída em campos magnéticos e elétricos que se deslocam à velocidade da luz. Incluem as radiações conhecidas como raios gama, raios X, luz ultravioleta, visível, infravermelha e ondas de rádio.

            A radiação eletromagnética apresenta dois aspectos:

            ð Vibração viajando no espaço, onde se define freqüência e comprimento de onda;

            ð Partículas em movimento (fótons), cada qual carregando quantidade de energia diretamente proporcional à freqüência ou inversamente proporcional ao comprimento da onda.

            A luz, radiação eletromagnética visível, é formada por um conjunto de radiação com comprimentos de onda variável desde o azul (comprimento de onda de aproximadamente 4.000 Å) até o vermelho (comprimento de onda de aproximadamente 7.000 Å). Como a energia da radiação é inversamente proporcional ao comprimento da onda, verificamos que a radiação azul é mais energética que a vermelha. Da mesma forma, a energia das radiações eletromagnéticas cresce desde as ondas de rádio(comprimento de onda grande) até os raios gama (comprimento de onda pequeno).

            A análise dos diversos tipos de radiação é feita por instrumento apropriados para sua captação. A luz visível permite  dispersar a radiação luminosa e desse modo obter o espectro. O espectro é portanto a distribuição da intensidade de uma fonte eletromagnética em função do comprimento de onda ou da freqüência. Para nosso interesse, citaremos três tipos de espectro:

            ð Espectro contínuo - linhas de cores ininterruptas produzidas por um sólido ou líquido incandescente ou gás a alta pressão;

            ð Espectro de emissão - linhas em barra que indicam a quantidade característica de energia irradiada na transição de um elétron de uma órbita externa para uma órbita interna, em torno do núcleo de um átomo;

            ð Espectro de absorção - linhas de cores interrompidas por raias escuras, que surgem quando um gás a baixa pressão se interpõe diante de uma fonte emissora de espectro contínuo. As raias escuras que aparecem no espectro de absorção são as mesmas que o gás interposto emitiria.

            Portanto o estudo do espectro das nebulosas permite o conhecimento da sua composição que está identificada no espectro de absorção. Outras técnicas, utilizando, por exemplo, rádio e ultravioleta, também permitem detecção da composição do meio interestelar.

            Fotografias de nebulosas freqüentemente revelam a existência de poeira junto com gás. Um exemplo famoso é a Nebulosa da Cabeça do Cavalo, vista na constelação de Órion. Os fótons de um raio de luz estelar colidem com partículas de poeira. Alguns destes fótons são absorvidos aquecendo o grão de poeira. Outros são dispersados, isto é, são refletidos em diferentes direções. Ambos os efeitos diminuem a intensidade do raio de luz estelar, podendo determinar a extinção desta luz ou seu avermelhamento.

            Para compreensão do avermelhamento da luz estelar, devemos estabelecer que a dispersão da radiação eletromagnética depende da relação entre o diâmetro da partícula e o comprimento da onda. Só haverá dispersão quando o diâmetro da partícula for maior que o comprimento da onda incidente sobre ela. Exemplificando:

 

Figura 3.3. O avermelhamento da luz estelar.

 

            Um exemplo cotidiano deste fenômeno é o avermelhamento da luz do sol por ocasião dos crepúsculos. Quando o Sol está próximo do horizonte, sua luz passa através de grande quantidade de partículas da atmosfera. Os raios da luz solar serão depletados preferencialmente da luz azul e irão consequentemente parecer avermelhados. Como resultado, a luz azul é dispersada do feixe de luz e o Sol parece vermelho. Quando olhamos longe do Sol, vemos a luz azul dispersada. Por isso, o céu é azul.

 

 

Figura 3.4. Efeito da dispersão da luz azul na atmosfera.

 

            Efeito similar a este ocorre quando uma radiação estelar atravessa partículas de gás ou poeira do meio interestelar. Se a partícula for de tamanho grande, não haverá efeito de cor porque o fóton será extinguido. Se for de tamanho pequeno, haverá importante efeito sobre a cor da luz. Portanto, o avermelhamento da luz estelar nos dá uma idéia do tamanho típico do grão de poeira interestelar. Exemplo:

            Dispersão do comprimento de onda de 2.200 Å - presença de grafite (Carbono).

            Dispersão do comprimento de onda de 100.000 Å - presença de quartzo (SiO2).

 

3.3. Estrutura do meio interestelar

            Análise de linhas de absorção interestelar mostram nuvens de gás cujas massas variam de poucas massas solares até milhares delas.

            Para exemplificar, uma nuvem típica poderia ser caracterizada como tendo um diâmetro de 50 anos luz e uma massa de 400 massas solares, e a densidade do gás que a compõe, 10 átomos por centímetro cúbico. O espaço interestelar como um todo teria 1 átomo por centímetro cúbico. Há muitas destas nuvens: um volume da galáxia correspondente a um cubo de 1.000 anos luz de lado conteria 2.000 delas, ocupando 10% do volume do cubo.

 

3.4. Composição química e formação do grão de poeira

            Um difícil problema da astronomia moderna é determinar a composição da poeira interestelar. Não devemos entender que o grão é uma agregação muito grande de átomos unidos por algum tipo de matriz sólida. Tais partículas não produzem tipo espectral bem definido num comprimento de onda.

            Alguns indícios da composição vieram do Observatório Astronômico (Telescópio Espacial) que forneceu dados sobre dispersão.

            Na radiação dispersada pelo meio interestelar, um pico geralmente é encontrado em 2.200 Å. Estudos laboratoriais indicam que o grafite, carbono cristalino, também exibe este tipo de pico. Naturalmente, foi suposto que o grafite era pelo menos um dos componentes da poeira e que poderia ser formado na atmosfera externa de estrelas gigantes pulsáteis.

            Outras observações na faixa do infravermelho, com estrelas envoltas em conchas de poeira, mostravam pico num comprimento de onda em torno de 100.000 Å. Comparação com espectros laboratoriais sugeriam presença de silicatos na poeira.

            Isso demonstra que a poeira interestelar não tem composição ou origem simples e uniforme. Esta é a razão porque é difícil fazer um modelo definitivo da partícula de poeira do meio interestelar.

 

3.5. Fases constituintes do meio interestelar gasoso

            Estudos astrofísicos, principalmente na radioastronomia e demais astronomias não ópticas, permitiram o conhecimento das partes constituintes do meio interestelar gasoso. Podemos então distinguir seis fases gasosas no meio interestelar:

            ð Nuvem de hidrogênio neutro (Região H I);

            ð Nuvem de hidrogênio ionizado (Região H II);

            ð Nuvem molecular;

            ð Gás coronal galáctico;

            ð Meio internuvens;

            ð Nebulosa planetária.

 

3.5.1. Nuvem de hidrogênio neutro

            Constituída de átomos de hidrogênio atômico não ionizado. Apresenta: deslocamento em baixa velocidade; baixa temperatura (100 K); densidade de um para centenas de átomos por centímetro cúbico; localizada no plano galático; tempo de evolução não conhecido; diâmetro típico de 5 parsec.

            A identificação destas nuvens é feita por técnica de radioastronomia. O radiotelescópio capta sua emissão característica, de 21 cm, oriunda da transição do spin do elétron do átomo de hidrogênio. Neste átomo neutro, seu elétron encontra-se em dois estados: spin paralelo (estado energético maior) e spin antiparalelo (estado energético menor). O elétron assume a condição de spin antiparalelo emitindo um fóton de baixa energia cujo comprimento de onda é de 21 cm.

            Como o hidrogênio é um elemento abundante no universo, e sua radiação passa facilmente através da poeira, seu estudo é muito importante para a compreensão da dinâmica galática, permitindo inclusive o cálculo de sua rotação.

 

3.5.2. Nuvem de hidrogênio ionizado

            Constituída de átomos de hidrogênio ionizado. Apresenta: temperatura elevada (10.000 K); densidade de um para um milhão de átomos por centímetro cúbico; localizada na periferia de nuvens moleculares, confinadas no plano galático, especialmente perto dos braços espirais; diâmetro típico de 10 parsecs; tempo de evolução de um milhão de anos, aproximadamente a duração das estrelas quentes ionizantes.

            A formação da Região H II é determinada pela intensa radiação ultravioleta de estrelas quentes que excita o gás, da seguinte maneira:

            Átomo de hidrogênio + fóton UV à próton + elétron

            Ocasionalmente o próton recaptura um elétron no processo de recombinação, liberando radiação na faixa visível do espectro:

            Próton + elétron à hidrogênio + radiação

            Abaixo demonstramos o esquema de uma Região H II:

 

 

Figura 3.5. Elementos constituintes de uma Região H II.

3.5.3. Nuvem molecular

            Constituída de inúmeras moléculas, algumas delas de grande complexidade estrutural. Apresenta-se de duas formas: glóbulos de Bok (massa de aproximadamente 1 massa solar) e gigantes (massa de 1 milhão de massas solares). As nuvens moleculares são constituídas de gás e poeira, e também apresentam: temperaturas de centenas de Kelvin; densidade grande, da ordem de 10.000 átomos por centímetro cúbico; localização a menos de 200 anos luz do plano galático; tempo de evolução de 10 a 100 milhões de anos.

            Note-se que nestas nuvens existem compostos orgânicos altamente evoluídos, como a metanina e o ácido fórmico, que são os possíveis precursores da glicina, o mais abundante dos aminoácidos. Tal complexidade bioquímica chega ao ponto de propor-se a existência de algas primitivas em suspensão neste meio.

            A seguir, uma pequena relação de moléculas identificadas:

            H2 , H2O , CO , H3OH , SiO , HCOOH , CH3NH2 , MgC46H30N6

 

3.5.4. Meio internuvens

            Observações tem demonstrado que o espaço entre as nuvens é preenchido com gás de baixa densidade (0,2 átomos por centímetro cúbico) e com temperatura elevada (7.000 Kelvin).

            Em outras palavras, as nuvens frias (Regiões H I) parecem estar imersas num tênue meio de gás aquecido. Isto sugere um sistema de duas fases com propriedades diferentes.

 

3.5.5. Gás coronal galáctico

            Pesquisa de emissão de raios X sugere presença de gás superaquecido (1 milhão de Kelvin) e de baixa densidade. É formado especialmente por oxigênio cinco vezes ionizado e sua origem é controversa (talvez as supernovas).

3.5.6 Nebulosa planetária

            Parte interna ionizada de vento estelar de baixa velocidade, formada por estrelas gigantes vermelhas. Temperatura de 10.000 Kelvin e densidade de centenas de átomos por centímetro cúbico. Tempo de evolução de dezenas para centenas de milhares de anos. Estão localizadas em toda a galáxia.

 

3.6. Processo de formação de estrelas

            O processo básico pelo qual se forma uma estrela é através da contração de uma nuvem de gás e poeira, com conseqüente elevação da temperatura interna e início de reações de fusão termonucleares, que vão garantir o equilíbrio hidrostático entre a pressão interna de expansão e a força de contração gravitacional da proto-estrela.

            Vários processos podem levar uma nebulosa pré-estelar à compactação suficiente para iniciar o processo de colapso gravitacional, geralmente formando várias estrelas simultaneamente. As nuvens moleculares são verdadeiros berçários de estrelas.

            Abaixo, citaremos alguns destes mecanismos:

            ð Choques impulsionados pela ionização - ocorreria no confronto de uma região H II com a nuvem molecular.

            ð Supernovas - estrelas gigantes vermelhas podem sofrer transformações importantes no seu interior determinando alteração no equilíbrio hidrostático que resulta em grande explosão. Gases são arremessados brutalmente ao espaço, produzindo ondas de choque capaz de colapsar nuvens.

            ð Ondas de densidade - são aumentos localizados do campo gravitacional que se propagam com uma velocidade fixa numa galáxia em rotação. Nuvens moleculares atravessando estas regiões poderiam sofrer compressão que determinaria a formação de estrelas.

            ð Colisões de nuvens - produziriam compactação dos gases.

            ð Ventos estelares - as estrelas supergigantes azuis produziriam ventos estelares com pressão suficiente para exercer efeitos sobre o meio interestelar.


 

CAPÍTULO 4

Galáxias

 

Marcos Boehme

CAPÍTULO 4 - GALÁXIAS

4.1. Introdução

            Há séculos, os astrônomos reconhecem certas nebulosidades no céu, que estão fixas na abóboda celeste. A maior delas, a Via Láctea, dá uma volta completa em todo o céu. Há ainda duas grandes manchas, só visíveis no hemisfério sul, descobertas pelos europeus graças à viagem de Fernão de Magalhães. E há muitas outras destas manchas, menores, espalhadas por todo o céu.

            Por muito tempo, até a primeira metade do século vinte, pensou-se que todas estes objetos fossem simples nuvens interestelares um pouco além do sistema solar.

            Sabemos agora que o Sol faz parte de um vasto sistema de estrelas e gás interestelar, que chamamos de galáxia da Via Láctea, e que inclui centenas de bilhões de estrelas. Além disso, existem outras galáxias mais distantes, e algumas são visíveis da Terra, a olho nu.

            A nossa galáxia, a Via Láctea, tem a forma de disco, e como o sistema solar está imerso neste disco, vemos um cinturão de estrelas envolvendo todo o céu. Estas estrelas estão tão distantes que a nossos olhos parecem uma nebulosidade difusa. As duas galáxias mais próximas, satélites da Via Láctea, que também parecem grandes manchas nebulosas, são a Grande e a Pequena Nuvem de Magalhães.

Além destas, conseguimos ver a olho nu a galáxia de Andrômeda, já observada desde a antigüidade, e incluída no catálogo do astrônomo árabe Al Sufi, no século X. Mas foi só no século XX que Andrômeda, até então considerada uma simples nebulosa, foi reconhecida como uma galáxia distante.

No século XVIII, o filósofo Emmanuel Kant sugeriu que a Via Láctea tivesse a forma lenticular, e que algumas dessas nebulosas fossem na verdade outros agrupamentos de estrelas independentes, outras galáxias. Isto tornaria o Universo cheio de “universos-ilhas”, o nome que Kant deu às galáxias.

            Entre 1915 e 1918, o astrônomo Harlow Shapley foi o primeiro a dar uma idéia aproximadamente correta das dimensões da Via Láctea. Em 1925, o astrônomo Edwin Powell Hubble, utilizando o maior telescópio do mundo na época, em Monte Wilson, conseguiu resolver e identificar estrelas variáveis Cefeidas em Andrômeda. Como se conhece a relação existente entre o período e a luminosidade dessas variáveis, é possível calcular a sua distância até nós. Concluiu-se que Andrômeda é um objeto muito distante, e de tamanho comparável a toda a Via Láctea. Com essa determinação de Hubble, foi inaugurada efetivamente a Astronomia Extragaláctica.

 

4.2. A Via Láctea

            Em certas épocas do ano, é possível ver uma espécie de faixa, um tanto irregular e difusa, mas muito vasta e extensa, atravessando todo o céu, e dando uma volta da esfera celeste. Esta faixa ocupa o zênite (céu exatamente acima de nossas cabeças) em março e agosto, e atravessa várias constelações, como Cisne, Águia, Escorpião, Sagitário, Cruzeiro do Sul, Vela, Orion e outras. Esta faixa esbranquiçada foi chamada pelos gregos de Galktias Kiklos (ou seja, círculo de leite) ou Galaktikos (branco como leite).

Para os gregos, essa faixa foi deixada na abóboda celeste pelo leite materno derramado pela deusa Hera (Juno, para os romanos), esposa de Zeus (Júpiter). Hércules, ainda bebê, filho ilegítimo de Zeus com uma mortal, deveria sugar o leite divino de Hera para se tornar imortal. Apesar de seu nome grego homenagear Hera (Heraclês), esta era extremamente ciumenta e o odiava mortalmente, a ponto de enviar duas grandes serpentes para destruí-lo. No entanto, o bebê Hércules estrangulou as serpentes, uma com cada mão. Em certa ocasião, Hércules se aproximou de Hera enquanto esta dormisse. Hércules conseguiu seu intento, sugando o leite materno da deusa Hera, tornando-se imortal, mas Hera acordou assustada e acabou por derramar parte de seu leite materno, enquanto empurrava Hércules para longe. Esse leite se espalhou pelos céus, imprimindo sua marca na esfera celeste.

Posteriormente, foi chamada pelos romanos de Via Láctea, pois os romanos acabaram adotando a mitologia grega para si. Outras mitologias consideravam a Via Láctea algo diferente. Para o povo Kung, da África, a faixa da Via Láctea era a coluna dorsal da noite, a qual sustentava o céu.

            Com o passar do tempo, a astronomia foi evoluindo. Com as observações, o céu deixou de ser considerado uma cúpula deixada em cima da Terra, e passou a ser visto como uma grande esfera, na qual outra esfera menor, o planeta Terra, ocupa o centro. Desde então, os antigos passaram a acreditar que a Via Láctea, por parecer um anel dando a volta em toda a esfera celeste, fosse a marca da solda que Deus deixou quando colou as duas metades da esfera celeste.

            A primeira observação científica da Via Láctea foi realizada por Galileu Galilei, em 1610. Galileu relatou que o aspecto esbranquiçado da Via Láctea era devido a uma enorme quantidade de estrelas.

            No final do século seguinte, em 1785, o astrônomo William Herschel construiu um modelo da Via Láctea baseado em um grande número de observações científicas. Para Herschel, a Via Láctea tinha a forma de uma lente, com o Sol aproximadamente em seu centro.

            Desde então, devido a descobertas que não conseguiram se encaixar no modelo, como a rotação da galáxia, a poeira interestelar e a descoberta de outras galáxias, chegamos ao modelo atual da Via Láctea.

 

 

Figura 4.1. A nossa galáxia, a Via Láctea.

 

Segundo a visão que se tem da Via Láctea atualmente, podemos imaginá-la dividida em três partes:

·        Núcleo, região central da nossa galáxia, que reúne a maior parte das estrelas da Via Láctea, aonde a distância média entre as estrelas é de cerca de 1 ano-luz;

·        Disco, que é região achatada onde se concentram poeira e gás, e aonde a distância média entre as estrelas é maior, de cerca de 4 anos luz. Gira no plano de rotação da Galáxia, e é aonde está o nosso Sol;

·        Halo, que envolve a nossa galáxia e tem uma forma esférica, constituída de poeira dispersa e de certos ajuntamentos de estrelas, denominados aglomerados globulares. Estes aglomerados reúnem dezenas de milhares de estrelas e têm a forma de um globo, cada um orbitando em torno do centro galáctico. Graças à observação destes aglomerados, que parecem se concentrar na constelação de Sagitário, foi possível determinar que o centro da Via Láctea fica nesta direção, e que o Sol fica bem longe do centro galáctico.

 

 

Figura 4.2. A Via Láctea vista de um de seus pólos.

 

 

Figura 4.3. A Via Láctea vista de perfil. "S" é a posição do Sol.

 

            Quanto às dimensões, crê-se que a nossa galáxia tem o diâmetro total de 120 mil anos-luz, com o disco tendo a espessura média de 2.500 anos-luz. O núcleo teria 23 mil anos luz de diâmetro por 10 mil de espessura, e finalmente o halo estende-se a distâncias de aproximadamente 300.000 anos-luz. O Sol repousa em um dos braços espirais, a 28 mil anos-luz do centro galáctico, e a 25 anos-luz acima do plano galáctico. A Via Láctea possui uma massa equivalente a aproximadamente 1,4x1011 sóis, e um número de cerca de 4x1011 estrelas. Sua idade é de aproximadamente 15 bilhões de anos. Verificamos então que o Sol, com 5 bilhões de anos de idade, é uma estrela de segunda ou terceira geração. O Sol leva cerca de 250 milhões de anos para dar uma volta em torno da Via Láctea, e tal intervalo de tempo é freqüentemente chamado de ano galáctico. Assim, podemos considerar que o Sol já deu 20 voltas em torno da nossa galáxia e possui 20 anos galácticos.

 

 

Figura 4.4. Componentes e dimensões da Via Láctea.

 

 

Figura 4.5. Braços espirais da Via Láctea.

 

            Para efeitos de comparação, podemos transferir a escala da Via Láctea para um modelo. Por exemplo, se o Sol fosse reduzido a uma bola de pingue-pongue, de 3 centímetros de diâmetro, a estrela mais próxima, Alfa Centauri, a 4,4 anos-luz do Sol, seria outra bola de pingue-pongue a 900 quilômetros de distância. Mantendo a escala, a Via Láctea seria uma enorme nuvem de 400 bilhões de bolas de pingue-pongue, com um disco de um diâmetro de 20 milhões e meio de quilômetros.

            Nossa galáxia possui um movimento de rotação, que remonta a própria origem das galáxias. Em geral, acredita-se que as galáxias formaram-se pelas condensações do material intergaláctico primordial, que existiu nas primeiras etapas de expansão do nosso universo. Assim, aceita-se que as flutuações num meio inicial não seriam suficientes para o surgimento das galáxias. Algumas teorias sugerem que a distribuição pouco uniforme do material inicial era conduzido à instabilidades, assim como ao desenvolvimento de massas em colapso gravitacional que formaram as primeiras galáxias. A rotação desses aglomerados de material primordial, ou protogaláxias, teria surgido da sua interação com as galáxias vizinhas ou com os aglomerados de protogaláxias em desenvolvimento.

            Aceitando-se que todas as galáxias se originaram de um mesmo material ao mesmo tempo, acredita-se que as diferenças entre elas sejam provenientes dos diferentes caminhos que uma protogaláxia poderia ter seguido em seu caminho evolutivo. Assim, o achatamento de uma galáxia elíptica deve estar relacionado à sua rotação. Uma rotação mais rápida significa um colapso mais lento, de modo que menor quantidade de gases interestelares seriam usados para formar as estrelas, no caso das galáxias espirais. A diferença entre as galáxias espirais e as elípticas exige maiores explicações, que devem estar associadas à maneira pela qual as formações estrelares se processaram, ou possivelmente às atividades que ocorrem em seus núcleos.

Segundo as teorias atuais, tudo parece indicar que há 15 bilhões de anos, a nossa galáxia como a conhecemos hoje ainda não existia. O que havia era uma enorme e disforme massa de gases muito tênue, com uma densidade de um átomo por centímetro cúbico. Durante algum tempo, essa gigantesca massa de gás, ou protogaláxia, foi crescendo até que se tornou capaz de interferir junto às protogaláxias vizinhas. Foi num jogo de forças moleculares internas e externas que os gases em seu interior, de início num movimento turbulento, começaram a se orientar no sentido de gerar um movimento rotacional. Assim, a nuvem, a princípio em expansão, atingiu um volume crítico e começou gradualmente a se contrair. Essa contração foi se tornando cada vez mais intensa à medida que a gravidade começou a dominar, surgindo os primeiros sinais do colapso gravitacional. Na região central, onde o colapso é mais rápido e a turbulência maior, a densidade dos gases foi tornando mais elevada até atingir um nível suficientemente grande para que as primeiras estrelas surgissem, formando o núcleo  da galáxia. As estrelas que nasceram nas vizinhanças do núcleo foram de tamanhos normais, talvez em virtude da rotação lenta e da turbulência menos intensa reinantes nas regiões externas.

            Com o colapso da protogaláxia continuou cada vez mais rápido, os gases, ao se dirigirem para as regiões mais externas, deixaram os aglomerados globulares abandonados nas margens. Para conservar seu momento angular, a jovem galáxia passou a girar mais rápido, desenvolvendo uma saliência ao redor do seu equador. Então a galáxia começou a estabilizar e assumir a sua forma atual.

 

 

Figura 4.6. Estágios de formação de uma galáxia:

(1) a protogaláxia começa a girar sob a influência gravitacional que a envolve; (2) a protogaláxia começa a sofrer um colapso em virtude de sua própria gravidade e, em conseqüência, a girar mais rápido; (3) as primeiras estrelas começam a se formar na densa região central; (4) a rotação provoca o achatamento da galáxia surgindo um alongamento ao longo do equador; (5) a galáxia passa a assumir a forma de disco, com formação de estrelas longe do núcleo; (6) aspecto atual de uma galáxia, como a nossa, com formação de estrelas na região externa.

 

 

4.3. Classificação

4.3.1 Catálogos de galáxias

            Antes da comprovação da existência das galáxias, os catálogos incluíam qualquer objeto de aparência difusa em geral, mesmo porque não havia como diferenciar os objetos galácticos (nebulosas) dos extragalácticos (galáxias). Os catálogos de galáxias mais famosos são os seguintes:

·      Catálogo Messier. Foi elaborado no final do século XVIII, por Charles Messier e seu ajudante, Mechain. Inclui 110 objetos, dos quais 34 são galáxias. É o catálogo mais tradicional e conhecido. Seus objetos são designados pela letra M seguida de um número. Por exemplo, a galáxia de Andrômeda é chamada de M 31.

·      Catálogo NGC (New General Catalogue of Nebulae and Clusters of Stars). Elaborado no século XIX, por John L. E. Dreyer. Inclui 7840 objetos, depois complementado com mais 5386. Estes objetos são referenciados pela sigla NGC, seguido pelo número de ordem. O complemento, no entanto, utiliza a sigla IC, de Index Catalogue. Neste catálogo, a galáxia de Andrômeda é chamada de NGC 224.

·      Catálogo de Shapley e Ames. Foi elaborado em 1932, e é o primeiro catálogo a tratar exclusivamente de galáxias. Tem 1249 objetos.

·      Catálogo de galáxias e aglomerados de galáxias (1960/1968) de Zwicky, Herzog e Wild. Conta com 30.000 objetos.

            Existem também catálogos especializados:

·      Atlas e catálogo de galáxias em interação (1959), de Vorontzov-Velyaminov.

·      Catálogo de galáxias anãs (1959/1966), de van den Bergh.

Além destes, existem muitos outros catálogos, mais recentes e extensos, e mais ainda estão sendo criados conforme o estudo das galáxias evolui.

 

 

4.3.2 Classificação morfológica

Com o tempo, percebeu-se que as galáxias apresentam uma certa variedade de aspectos, e assim que se catalogaram galáxias em número significativo, verificou-se que poderiam ser classificadas em grupos.

O próprio Edwin Hubble, em 1926, propôs um modelo de classificação que persiste até hoje, com certas modificações. Essa classificação se baseia na forma das galáxias, e é a mais simples e utilizada.

Segundo a classificação de Hubble, o primeiro passo é dividir as galáxias segundo a sua simetria de rotação. Se for simétrica, a galáxia é regular. Caso não haja simetria, a galáxia é irregular (sigla Irr).

Por sua vez, as galáxias regulares podem ser classificadas em elípticas, ou do tipo E; em lenticulares, ou do tipo SO; e em espirais, ou do tipo S.

Galáxias Elípticas - As galáxias elípticas se constituem em 17 por cento das galáxias catalogadas por Hubble. Não possuem uma estrutura marcada, e parece apenas um conjunto de estrelas em forma de globo ou charuto, no qual as estrelas se concentram no núcleo. Sua luminosidade diminui regularmente do centro para o exterior. Suas formas variam desde os objetos perfeitamente esféricos até as formas lenticulares, passando por uma série de elipses de achatamento crescente.

            Esse achatamento é indicado por um índice que vai de 0 a 7, e que exprime a diferença relativa entre os dois eixos da elipse. Assim, E0 é uma galáxia esférica e o E7 é a galáxia mais achatada. No entanto, essa classificação é baseada no que vemos dessas galáxias, e pode ser que elas estejam alinhadas de outra forma que não seja de perfil e que o seu achatamento verdadeiro não seja conhecido.

 

 

Figura 4.7. Classificação das galáxias elípticas.

b / a

n

forma aparente

tipo de Hubble

1,0

0

circunferência

E0

0,7

3

elipse regular

E3

0,3

7

elipse alongada

E7

 

Tabela 4.1. Classificação das galáxias elípticas, conforme seus eixos.

 

 

Figura 4.8. Tipos de galáxias elípticas.

 

Galáxias Espirais - As galáxias espirais possuem grande concentração de estrelas em seu centro, o núcleo. São também muito achatadas, em razão de sua rotação rápida. Também possui uma estrutura em braços espirais, que partem do núcleo.

Estas galáxias se dividem em espirais normais (S, ou SA) e barradas (SB). Nas primeiras, os braços têm origem tangencialmente ao núcleo, em dois pontos diametralmente opostos. Nas segundas, as espirais barradas, as espirais ou braços surgem nas duas extremidades de uma barra que passa pelo núcleo da galáxia. Das galáxias catalogadas, 50 por cento são espirais normais e 30 por cento barradas.

            De acordo com a importância relativa entre o núcleo e os braços das galáxias espirais, consideram-se três subdivisões de galáxias, que valem tanto para as espirais normais quanto para as barradas. Acrescenta-se a letra  a  se seu núcleo for grande e os braços pequenos e muito encurvados; a letra  b  se o núcleo for menor e com os braços espirais desenvolvidas; e a letra  c  se o núcleo for pouco importante e com estrutura espiral aberta, às vezes com braços múltiplos. A galáxia de Andrômeda, por exemplo, é classificada como Sb, sendo uma galáxia espiral normal, intermediária entre os tipos Sa e Sc.

 

 

Figura 4.9. Tipos de galáxias espirais normais.

 

 

 

Figura 4.10. Tipos de galáxias espirais barradas.

 

 

            Galáxias Lenticulares - Em 1936, Hubble introduziu um novo tipo, intermediário entre E e S, que chamou de SO. São chamadas de lenticulares, pois são achatadas, como as espirais, mas não possuem braços, como as elípticas. Têm a forma de disco, ou lente.

            Depois de Hubble, com o avanço dos estudos das galáxias, foi incluído nesta classificação os tipos SO e SOB de galáxias, que são intermediárias entre as galáxias elípticas e espirais, possuindo um disco rarefeito de poeira e gás, sendo difícil de identificar braços espirais.

            Galáxias Irregulares - Hubble também citou as galáxias irregulares, que são as que apresentam suas formas caóticas e amorfas, ou seja, não possuem simetria nem estrutura definida. São reconhecidos dois tipos de galáxia irregular: o tipo Irr I, o mais comum, rico em estrelas, e possui braços partidos ou separados do disco em uma estrutura confusa, além de grande quantidade de gás e poeira; e o tipo Irr II, mais raro. Este tipo é bastante diferente do Irr I, possuindo uma estrutura caótica, bastante escurecida por poeira, e com poucas estrelas. Pode ser resultado de colisões entre galáxias.

            Por grau de semelhança entre as galáxias, Hubble as classificou em uma seqüência, que se inicia com as galáxias elípticas, de E0 até E7, depois se bifurca entre espirais barradas e normais, enquanto as galáxias irregulares ficariam de fora.

            Inicialmente os astrônomos pensaram que a forma de cada galáxia estava relacionada, apenas, ou principalmente, com o estágio de evolução. Assim, uma galáxia E0 estaria no início de sua vida, e uma espiral no final. Deve ficar claro, no entanto, que há forte razões que indicam que as galáxias não evoluem de uma classe para outra, por diversos problemas. Um deles é que as galáxias elípticas possuem em média dez vezes mais massa que as espirais, e essa diferença de massa ainda não foi explicada.

 

 

Figura 4.11. Classificação morfológica das galáxias.

4.4. Galáxias ativas

            As galáxias classificadas no diagrama de Hubble são chamadas de “normais”. No entanto, existem as galáxias que escapam à esta classificação, e são chamadas de “peculiares”. As galáxias que apresentam alta luminosidade e espectro não térmico (em parte ou completamente) formam a classe das galáxias peculiares ativas.

            Quando foi possível registrar as radiações de rádio emitidas pelas galáxias, nosso conhecimento sobre elas sofreu uma pequena revolução. Suas atividades energéticas, de fato, antes limitadas à região visível do espectro eletromagnético, se estenderam para as regiões das radiações de rádio; isto permitiu uma análise mais completa das emissões das galáxias e, em conseqüência, um melhor estudo da sua capacidade de emissão.

            Nas galáxias normais, seu aspecto e suas emissões parecem estáveis e em equilíbrio. Ao contrário, nas galáxias ativas ou explosivas, além de uma forte emissão não térmica, ocorrem em geral variações muito rápidas e intensas de radiação. As galáxias ativas podem ser caracterizadas por dois diferentes processos. Em primeiro lugar,  por constituírem fontes de rádio muito intensas e, depois, em virtude de sua aparência muito pelicular (deformada), responsável, em geral, por uma atividade muito forte.

            As galáxias ativas emitem uma enorme quantidade de energia, e  uma de suas características é o fato de possuírem o núcleo muito luminoso. Sua energia pode ser emitida de duas formas: não térmicas e térmica. Entre as galáxias espirais estudadas, verificou-se que 1 por cento delas poderia incluir-se no grupo das galáxias explosivas ou violentas. A mais próxima galáxia é a fonte de rádio Centaurus A, que se localiza na constelação de Centauro.

            Como um grupo, as galáxias ativas apresentam as seguintes características:

·        alta luminosidade;

·        parte da luminosidade é proveniente de emissão não térmica, na forma de fluxo ultravioleta, infravermelho, rádio e raios X, em comparação às normais;

·        uma região pequena (com até alguns anos luz) de alta variabilidade;

·        alto contraste de brilho entre o núcleo e as estruturas de grande escala;

·        muitos desses objetos apresentam largas linhas de emissão em seu espectro luminoso.

            A Via Láctea apresenta algumas destas características, mas não produz tanta energia como o núcleo das galáxias ativas.

            Não existe uma classificação simples para as galáxias ativas. Assim, existem várias classes de objetos ou galáxias ativas com grande superposição entre elas. Mas, apesar de existirem vários problemas para a compreensão dos fenômenos que ocorrem nesses objetos, está se chegando a um consenso de que esses fenômenos são estágios transitórios na vida das galáxias normais. As classes de galáxias ativas mais importantes são as galáxias de Seyfert, as radiogaláxias e os objetos BL Lacertae.

4.4.1 Galáxias de Seyfert

Em 1943, o astrônomo Carl Seyfert detectou a existência de seis galáxias espirais muito peliculares, com núcleos muito pequenos e luminosos, que receberam mais tarde o nome de seu descobridor. Foi, entretanto, depois da descoberta das radiogaláxias que o seu estudo passou a atrair a atenção dos astrofísicos. Elas se distinguiam das outras por possuírem núcleos muito reduzidos e muito brilhantes, que se destacavam nitidamente do resto, pois chegavam a irradiar a maior parte da luminosidade total emitida pela galáxia. Para alguns autores, as galáxias de Seyfert seriam o elo de ligação entre as galáxias normais e os quasares (radiofontes que emitem ondas de rádio mais intensamente que qualquer outra galáxia). Nos núcleos das Seyfert registrou-se a presença de jatos com velocidade de 1 a 8 mil quilômetros por segundo, o que sugere serem estas galáxias o resultado de fenômenos explosivos recentes.

4.4.2 Radiogaláxias

            O termo radiogaláxias é utilizado para galáxias com luminosidade maior que 1040 ergs/s. Existem dois tipos de radiogaláxias: compactas e extensas. Uma radiogaláxia é dita extensa quando sua emissão de rádio provêm de uma região do céu que é maior que a imagem óptica da galáxia, enquanto que em uma compacta, esta região é igual ou menor que sua imagem.

Geralmente, as compactas apresentam radiofontes muito pequenas, frequentemente nucleares, com diâmetro de no máximo alguns anos-luz. As extensas apresentam muitas vezes uma estrutura dupla, com dois enormes lobos separados por distâncias de milhões de anos-luz e simetricamente colocadas em lados opostos ao núcleo, que também é uma fonte de rádio. Frequentemente são observados projeções, ou jatos de material, que emitem radiação em uma grande faixa de frequência, de rádio a raios X, e possuem uma estrutura complexa.

4.4.3 Objetos BL Lacertae

            Estes objetos receberam o nome da primeira galáxia de sua classe. Como um grupo, os objetos BL Lac têm as seguintes características: sua emissão varia rapidamente, tanto em rádio quanto em luz infravermelha e visível; e sua emissão é contínua, não térmica e não possui linhas espectrais. A maior diferença entre os objetos BL Lac e as demais galáxias ativas é a grande e rápida variação da sua luminosidade.

4.5. Quasares

            Em 1960, dois astrônomos, Allan Sandage e Thomas Matthews, descobriram uma pequena estrela, de magnitude 16, na posição da fonte de rádio 3C 48 (ou seja, o objeto 48 do terceiro catálogo de Cambridge). Este objeto possuía um espectro com linhas de emissão muito largas, que não pode ser identificado, e que emitia mais luz ultravioleta que qualquer estrela normal. O objeto 3C 48 permaneceu como uma curiosidade única até 1963, quando foi descoberta uma estrela de magnitude 13 associada com a fonte de rádio 3C 273, que também possuía linhas espectrais desconhecidas. Descobriu-se depois que suas linhas espectrais foram enormemente deslocadas, e a única explicação disponível é que este objeto se deslocava a 80% da velocidade da luz, o que implicava que ele estava a dois bilhões de anos-luz de distância, o que por sua vez implicava que estes objetos, sozinhos, brilham mais do que uma galáxia inteira, de centenas de bilhões de estrelas. O objeto 3C273 brilha 40 vezes mais do que a galáxia mais brilhante conhecida. Sem dúvida, estes objetos não eram estrelas. Passaram a ser conhecidos como quasi-stellar objects, ou quasares.

            O brilho extraordinário dos quasares era apenas uma de suas propriedades incomuns. Mais estranho ainda era o fato de que a sua enorme emissão de energia parecia vir de uma região notavelmente pequena no espaço, menor do que o nosso sistema solar. Como um objeto pequeno como o sistema solar pode produzir a energia de centenas de bilhões de estrelas? Para tanto, os quasares deveriam conter centenas de bilhões de estrelas, mas eles ocupam um volume de espaço demasiado pequeno para tanto.

            Surgiu então uma pista para a compreensão da natureza dos estranhos quasares. Quando modificaram os instrumentos de seus telescópios para poderem detectar objetos bastante difusos, os astrônomos viram a imagem fraca de uma galáxia em torno de muitos dos quasares. De início, eles não haviam visto essas galáxias porque a sua imagem era bem mais fraca do que a do brilhante quasar.

            Tão logo deram-se conta de que os quasares localizavam-se no centro das galáxias, muitos astrônomos pensaram numa solução para o mistério. O que é extremamente compacto mas pode conter uma quantidade enorme de matéria? Somente um objeto satisfaz os requisitos. Deve existir um imenso buraco negro oculto no centro de cada uma destas galáxias, e os quasares são na verdade gigantescos buracos negros.

            Se isto for verdade, a fonte da enorme liberação de energia do quasar fica evidente. O buraco negro localiza-se no centro da sua galáxia, rodeado por muitas estrelas, que circulam ao seu redor sob a ação de sua gravidade, perfazendo, gradualmente, uma espiral na sua direção. À medida que cada estrela se aproxima, seu corpo gasoso é despedaçado pela poderosa força gravitacional do buraco negro. Os átomos de matéria gasosa da estrela em desintegração adquirem uma velocidade cada vez maior sob a atração do buraco negro e colidem entre si. É essa energia o que vemos quando observamos um quasar.

            Os cálculos mostram que se o buraco negro no centro da galáxia for de tamanho normal, ele não produzirá energia suficiente para explicar o brilho dos quasares. Mas, se for gigantesco, como um bilhão de vezes maior que o buraco negro comum, ele despedaçará estrelas próximas com tamanha força que irradiará imensas quantidades de energia para o espaço, suficientes para explicar a energia emitida pelos quasares.

            Assim, a idéia de um buraco negro gigante oculto no centro de uma galáxia explica as duas notáveis propriedades dos quasares. Primeiro, ela explica a incrível quantidade de energia que eles emitem. Segundo, visto que os buracos negros são objetos extremamente compactos, ela explica por que a energia provêm de uma região tão pequena do espaço. É justamente no centro das galáxias aonde as estrelas estão mais juntas uma das outras, e aonde elas podem colidir e se juntar para formar estrelas maiores, do tipo que encontra seu fim numa explosão, deixando atrás de si um buraco negro. Isto significa que o centro de uma galáxia deve formar muitos buracos negros, que se fundem para formar um maior.

            Esta teoria, a dos buracos negros supermassivos, exige um buraco negro de dez milhões a um bilhão de massas solares, o qual necessitaria absorver uma massa solar por ano para gerar a energia que emite. Assim, o modelo mais generalizado do quasar envolve um buraco negro supermassivo no centro de uma galáxia de núcleo densamente povoado de estrelas, as quais teriam parte de sua matéria arrancada. Essa matéria formaria um disco de acréscimo, o qual irradiaria energia conforme a matéria entrasse no buraco negro e fosse desintegrada, convertendo energia gravitacional em radiante com grande eficiência.

            Portanto, um quasar deve ser uma galáxia com um buraco negro gigante no seu centro. A espantosa radiação do quasar é criada por estrelas que alimentam o buraco negro gigante. Toda vez que o buraco negro gigante despedaça uma estrela, vemos o quasar refulgir como se tivéssemos jogado mais lenha na fogueira. A princípio, o quasar resplandece porque dispõe de um grande estoque de estrelas à sua disposição, mas depois de algumas centenas de milhões de anos, restam muito poucas estrelas. O quasar é rebaixado para a galáxia ativa, e, gradativamente, desprovido de sua fonte de energia, o quasar desaparece na escuridão. Onde antes chamejava um quasar, resta uma galáxia de aparência comum, mas com um silencioso buraco negro dormindo no seu centro.

            Esse quadro explica por que os quasares são tão raros no universo. Vemos quasares agora porque a maioria dos quasares está muito distante, sua luz demora bilhões de anos para chegar até nós e nós os vemos como eram há bilhões de anos atrás. Anteriormente, os quasares talvez tenham sido relativamente comum no passado, e talvez até mesmo a nossa galáxia, a Via Láctea, tenha sido um quasar e possua, agora, um super buraco negro no centro.

            Os astrônomos procuram indícios desses imensos buracos negros, encontrando indícios deles em galáxias mais próximas. A nossa própria galáxia mostra uma atividade intrigante em seu centro, em um ponto chamado Sagittarius A. Talvez sejam os indícios do nosso próprio buraco negro central, fóssil de um quasar.

4.6. O Grupo Local

            A maioria das galáxias, ou talvez todas elas, são membros de algum tipo de grupo ou aglomerado. A Via Láctea é um dos membros dominantes do Grupo Local de galáxias.

            Quando métodos confiáveis para determinar as distâncias das galáxias próximas foram desenvolvidos, os astrônomos começaram a mapear o universo, começando pelas vizinhanças da Via Láctea. Descobriram que a nossa galáxia não está isolada, e faz parte, de um pequeno grupo galáctico, que possui cerca de trinta galáxias identificadas, conhecido como Grupo Local. O diâmetro do Grupo Local é de aproximadamente 6 milhões de anos-luz (ou dois megaparsecs) e seus limites são difíceis de definir.

O Grupo Local é dominado por duas grandes galáxias. A maior delas é a galáxia de Andrômeda (também chamada de M31), seguida pela nossa própria galáxia, a Via Láctea. Depois, seguem-se as galáxias médias: galáxia do Triângulo (M33), e em seguida a Grande e a Pequena Nuvem de Magalhães. As duas Nuvens são grandes e próximas, assim existem estudos detalhados sobre elas. O resto do Grupo Local é formado por objetos menores, todos elípticos ou irregulares.

            As dez galáxias mais próximas da Via Láctea são satélites da nossa. Dessas dez, as duas maiores e mais próximas são a Grande e a Pequena Nuvem de Magalhães. As demais são as seguintes, com o ano da descoberta entre parênteses: Escultor e Fornalha (1938); Leão I, Leão II; Dragão e Ursa Menor (1950); Carina (1977) e Sextante (1990).

            As Nuvens de Magalhães, vistas da Terra, são áreas de luminosidade que se apresentam como faixas isoladas da Via Láctea. Foram primeiro descritas em 1521 pelo cronista participante da primeira viagem de circunavegação do globo, a de Magalhães, e daí os seus nomes. As nuvens de Magalhães não foram estudadas em detalhe senão em 1834, quando John Herschel as focalizou do observatório astronômico do Cabo da Boa Esperança, na África do Sul.

            A Grande Nuvem de Magalhães se acha a cerca de 169.000 anos-luz de nós e a Pequena Nuvem de Magalhães a 250.000 anos-luz. Dado o desconto para a sua imensa distância, resulta em que as Nuvens de Magalhães se espalham por uma região de respeitável tamanho. A Grande Nuvem de Magalhães teria 40.000 anos-luz de diâmetro, ou quase a metade do diâmetro da Via Láctea. Entretanto, as Nuvens de Magalhães são muito menos densamente povoadas de estrelas do que a Via Láctea, e isso se apresenta como fato da maior importância. A Grande Nuvem de Magalhães não contém mais de cinco a dez bilhões de estrelas, enquanto a Pequena Nuvem não tem mais de um a dois bilhões. Em termos de conteúdo estrelar, as duas em conjunto têm apenas um décimo das dimensões da Via Láctea. Como estão muito próximas, poderiam ser descritas como satélites gravitacionais da nossa galáxia.

 

 

Figura 4.12. A Via Láctea e as Nuvens de Magalhães.

 

            Não obstante o seu tamanho menor, as Nuvens de Magalhães contém alguns objetos espetaculares, jamais encontrados na Via Láctea, ou pelo menos na pequena parte da Via Láctea que somos capazes de ver.

            A Grande Nuvem de Magalhães inclui a nebulosa Tarântula, brilhante nuvem de poeira, como a nebulosa Órion, porém 5.000 vezes maior. A Nebulosa Tarântula é muito maior e muito mais espetacular do que qualquer objeto semelhante jamais observado na Via Láctea. É uma nebulosa difusa, com o diâmetro de 1.000 anos-luz, e em seu centro há um aglomerado de estrelas com dezenas de supergigantes, sendo a massa total igual a mil massas solares. Também foi localizada na Grande Nuvem a Supernova mais próxima desde o século XVII: a Supernova 1987 A. Quando essa estrela, catalogada como Sanduleak -69º202, ainda estava na seqüência principal, era uma supergigante azul, com cerca de 18 massas solares e 80.000 vezes a luminosidade do Sol. No máximo da exploração, atingiu uma luminosidade de duzentos milhões de vezes superior à do Sol.

            A Grande Nuvem de Magalhães foi sempre considerada um protótipo de galáxia irregular e desordenada, mas foram encontrados indícios de braços espirais bastante tênues e abertos, associados ao núcleo desta galáxia, cujas estrelas se organizam na forma de uma fraca barra. Talvez ela tenha sido uma galáxia espiral barrada, que se transformou em irregular por causa da influência gravitacional da Via Láctea. Outra de suas estruturas, recentemente descoberta, é um gigantesco anel de poeira com mais de 5.000 anos-luz de diâmetro, envolvendo a região da nebulosa de Tarântula e da SN 1987 A. Dentro do anel de poeira há mais que 800 estrelas de classe O e B (ou seja, estrelas supergigantes), cuja irradiação ultravioleta ioniza um imenso volume de 3.000 anos-luz de diâmetro. Essa estrutura é identificável facilmente em fotos, quando se sabe aonde está. Assim, verifica-se que a Grande Nuvem possui a metade do diâmetro, um décimo da massa e cerca de um sétimo do brilho da Via Láctea.

            Quanto à pequena Nuvem de Magalhães, é bem mais pobre em poeira que a Grande Nuvem, o que faz com que ela seja quase transparente e muito pobre em estrelas de grandes dimensões. Apresenta um prolongamento de matéria na direção da Grande Nuvem, e é claramente influenciada gravitacionalmente por esta e pela Via Láctea. Possui um terço do diâmetro, um quarenta avos da massa e um vinte e cinco avos do brilho da Via Láctea.

            Recentemente, foram descobertas provas maiores da interação da Via Láctea com as Nuvens de Magalhães. Ambas as Nuvens apresentam sua estrutura deformada, devido à atração gravitacional mútua entre estas e a Via Láctea, e foi descoberta uma faixa de gás e estrelas estendendo-se entre as duas Nuvens. Uma reconstrução da história das Nuvens sugere que estas colidiram entre si, ou quase isso, há cerca de 200 milhões de anos. Foi proposto também que a pequena Nuvem se consiste de duas partes, alinhadas com a linha de visada da Terra, batizadas de Remanescente da Pequena Nuvem e Pequena Nuvem Menor. Outra descoberta importante é o Estreito de Magalhães, um cinturão de gás de Hidrogênio que se inicia atrás das Nuvens e se estende por mais do que uma quarta parte do céu. Este Estreito indica o violento futuro reservado às Nuvens de Magalhães, que podem estar destinadas a cair no dentro da Via Láctea, sendo finalmente engolidas e absorvidas pela nossa galáxia.

            Além das Nuvens de Magalhães, estão também associadas com a Via Láctea várias galáxias anãs elípticas, como os sistemas de Escultor, Fornalha, Leão I e II. Estas pequenas galáxias têm estes nomes por causa de sua posição, pois recebem os nomes das constelações de onde nós as vemos da Terra. Todas elas são bastante pequenas, com poucos milhares de anos-luz de diâmetro e possuindo poucos milhares de massas solares. É como se fossem meros ajuntamentos dispersos de estrelas.

            Mais além, está a galáxia de Andrômeda, que é visível a olho nu. É maior que a Via láctea, e possui algumas galáxias-satélites: M 32 e NGC 105, que são anãs elípticas de tamanho razoável, e mais os Sistemas de Andrômeda I, II e III. M31 é uma espiral comum, com os braços espirais medianamente afastados do núcleo, ou seja, do tipo Sb.

A terceira maior galáxia do Grupo Local é a espiral M 33, da constelação do Triângulo. Ela está situada numa direção análoga à da M 31, mas está um pouco mais distante. O seu tipo, Sc, quer dizer que esta é uma galáxia espiral com os braços afastados do núcleo. Há ainda duas galáxias irregulares, ambas isoladas em extremidades diferentes do Grupo Local: IC 1613 e NGC 6822, e mais um pequeno sistema binário, formado por NGC 147 e NGC 185. As demais foram descobertas recentemente e os dados sobre elas são escassos.

 

 

Figura 4.13. O Grupo Local de galáxias.

 

Cálculos recentes sugerem que duas galáxias distantes estão viajando junto com o Grupo Local: os Sistemas de Leo A e Pegasus. Da mesma maneira, descobriu-se que algumas galáxias, que anteriormente se pensava que faziam parte do Grupo Local, na verdade ou estão muito distantes, ou sua velocidade está errada, ou ambas as coisas; são as galáxias IC 342, NGC 3109, NGC 6946, Maffei I e Maffei II. E, finalmente, há galáxias descobertas há pouco tempo, e ainda não qualificadas; são o sistema de Sextans A, Sistema de Sextans B e UGC A86.

            Assim, ao fazer um balanço geral sobre as trinta e uma galáxias do Grupo Local já classificadas, verificamos que três são espirais (Via Láctea, Andrômeda, M33), treze são irregulares (Grande e Pequena Nuvem e mais dez menores) e, finalmente, há cerca de quinze galáxias elípticas anãs.


GALÁXIAS DO GRUPO LOCAL

nome       

tipo

dist

diam

massa

mg ap

mg ab

Via Láctea   

Sb

   30

120

1,4x1011

 

-20,9

Grande Nuvem de Magalhães

Ir

  169

23

      1010

0,6

-18,7

Pequena Nuvem de Magalhães

Ir

  205

15

    2x109

2,8

-16,7

Sistema de Draco

E3

  220

1

        105

 

-8,5

Sistema de Ursa Menor

E5

  220

1

        105

 

-9

Sistema de Sextans I

E

  275

3

 

10,3

 

Sistema de Sculptor

E3

  280

2,3

  3,2x106

9,1

-12

Sistema de Carina

E4

  300

0,5

 

 

 

Sistema de Fornax

E3

  550

5,4

    2x107

8,5

-13

Sistema de Leo I

E4

  750

2

    4x106

11,8

-11

Sistema de Leo II

E1

  750

1

        106

12,3

-9,5

Wolf-Lundmark (WLM)

Ir

1600

5

 

11,1

-13,3

Galáxia Barnard (NGC 6822)

Ir

1700

7,5

3,2x108

8,6

-15,6

IC 5162

Ir

2000

5

 

11,7

 

M 110 (NGC 205)

E5

2100

7,8

7,9x109

8,0

-16,3

M 32 (NGC 221)

E2

2150

2,3

3,2x109

8,2

-16,3

NGC 147

E5

2150

4,6

109

9,3

-14,8

NGC 185

E3

2150

3,25

109

9,2

-15,2

Andrômeda (M 31, NGC 224)

Sb

2200

180

3,2x1011

3,5

-21,1

Sistema de Andrômeda I

E3

2200

2

 

14,4

 

Sistema de Andrômeda II

E2

2200

2

 

 

 

Sistema de Andrômeda III

E5

2200

3

 

 

 

IC 1613

Ir

2500

12

2,5x108

9,6

-14,8

Triângulo (M 33, NGC 598)

Sc

2700

46

7,9x109

5,7

-18,8

Sistema de Pisces

Ir

3000

0,5

 

15,5

 

DDO 210

Ir

3000

4

 

15,3

 

IC 10

Ir

2800

6

 

11,7

 

GR 8

Ir

4000

0,2

 

14,6

 

Sag DIG

Ir

4000

5

 

15,6

 

Sistema de Pegasus

Ir

5000

8

 

12,4

 

Sistema de Leo A

Ir

5000

7

 

12,7

 

Sistema de Tucana

E

 

 

 

 

 

 

Tabela 4.2.

            Glossário

            tipo - Indica o tipo da forma da galáxia (S=espiral, SB=espiral barrada, E= elíptica e Ir= irregular).

            dist - Distância de uma galáxia à Terra, em milhares de anos-luz.

            diam - Diâmetro de uma galáxia, em milhares de anos-luz.

            mass - Massa de uma galáxia, em massas solares.

            mg ap - Magnitude aparente visual: representa o brilho aparente de uma galáxia, ou seja, o seu brilho visto da Terra.

            mg ab - Magnitude absoluta visual: representa o brilho calculado da galáxia, caso toda sua luz estivesse concentrada a dez parsecs (32,6 anos-luz) de distância de um observador.

 

 

4.7. Aglomerados e Superaglomerados

            A escala do universo se apresenta de tal maneira imensa que faz parecer minúscula até mesmo as considerações anteriores, sobre as distâncias das galáxias do Grupo Local. Com o avanço dos métodos de determinação de distância das galáxias, foi possível estudar sua distribuição espacial. Logo verificou-se que a distribuição das galáxias no espaço não é homogênea, estando agrupadas em aglomerados. Além do Grupo Local, o espaço imediato se apresenta vazio. Só encontraremos outras galáxias a 7 milhões de anos-luz. Assim, as galáxias apresentam-se em geral em enxames, parecendo agrupar-se. O grupo de galáxias mais próximo é aquele que se situa na direção da constelação de Escultor (Scupltor). Quase esférico, é também muito isolado das outras galáxias, e parece conter somente galáxias espirais.

            Os grupos de galáxias são geralmente considerados como sendo sistemas gravitacionalmente associados. Ou seja, elas permanecem na mesma região do espaço em virtude de sua mútua atração gravitacional, como é o caso do Grupo Local. Grupos de galáxias ocorrem com muita freqüência no espaço, e um grupo típico contém de dez a cem galáxias.

            Ocasionalmente, ocorrem concentrações de galáxias. Estes são os grandes aglomerados de galáxias, que podem conter em torno de mil galáxias. O aglomerado rico mais próximo de nós é o aglomerado de galáxias de Virgem, a cerca de 42 milhões de anos-luz (ou 13 megaparsecs) de distância. O aglomerado de galáxias de Cabeleira de Berenice, ainda mais rico, está a cerca de 330 milhões de anos-luz de distância (100 megaparsecs) de nós.

            Os aglomerados de galáxias se dividem em dispersos (irregulares) e esféricos. Os dispersos não têm forma regular, neles não existe uma região central onde a densidade de galáxias seja muito maior. O aglomerado de Virgem é um exemplo de um aglomerado disperso grande. Neste aglomerado há vários milhares de galáxias, das quais uma parte considerável é de galáxias espirais.

            Os aglomerados esféricos de galáxias são compactos e simétricos. Seus membros estão claramente concentrados no miolo de sua estrutura, e são mais ricos em galáxias elípticas. Um exemplo é o aglomerado de Cabeleira de Berenice, que contém cerca de 30.000 galáxias.

            Na distribuição espacial das galáxias existem também heterogeneidades grandes, com dimensões de dezenas de megaparsecs. As regiões de densidades elevadas de galáxias se alternam com os vazios, aonde a densidade média das galáxias e seus aglomerados é consideravelmente menor. A região mais próxima de nós, de elevada densidade de galáxias e seus sistemas, se denomina Superaglomerado Local. Em sua parte central se encontra o aglomerado de galáxias de Virgem, e o aglomerado de Cabeleira de Berenice é o centro de outro superaglomerado vizinho.

            A diferença fundamental entre estas heterogeneidades de larga escala, ou superaglomerados, e os grandes aglomerados de galáxias consiste em que os superaglomerados não são sistemas ligados fisicamente; no seu interior rege a Lei de Hubble, que atesta em favor da expansão dos superaglomerados, ainda que a maioria dos grupos e aglomerados de galáxias, ao que parece, não se expandem em volume e estão envolvidos gravitacionalmente.

            Outra curiosidade macro-estrutural do universo é o Grande Atrator. Foi observado um desvio no movimento das galáxias, que não havia sido previsto anteriormente. Uma explicação é a existência de uma gigantesca massa esférica equivalente à massa de 500.000 galáxias iguais a nossa, localizada a 150 milhões de anos-luz de distância, na direção da constelação de Centauro, chamada de Grande Atrator, o qual atrai a Via Láctea e mais centenas de galáxias a velocidades de 600 a 1.500 quilômetros por segundo. O Grande Atrator nunca foi observado antes porque se supõe que o disco da nossa galáxia bloqueia a sua luz.

            Então, nós podemos adotar a seguinte estrutura para o espaço que nos cerca: nós estamos no Grupo Local, que é vizinho dos modestos grupos de galáxias de Escultor, Centauro, Maffei e Cães de caça, que com mais alguns formam o aglomerado local, chamado também de aglomerado de Cabeleira-Escultor. O aglomerado local tem por perto os aglomerados de Virgem, Ursa Maior, Leão, Fornalha e vários outros, que formam os superaglomerado local, de Virgem-Hydra-Centauro. O qual é cercado pelos superaglomerados de Peixes-Baleia, Perseu-Pégaso, Pégaso-Peixes e Escultor, formando o Complexo de Superaglomerados de Peixes-Baleia. Os outros complexos de superaglomerados são: o de Hércules-Coroa Boreal; Aquário; Ursa Maior e Leão.

Estrutura local

Escala

( em anos luz)

Vizinhos

Galáxia

100.000

Nuvens de Magalhães,

Galáxia de Andrômeda

Grupo Local

5.000.000

Sculptor, Centaurus, Maffei

Aglomerado de Coma-Sculptor

42.000.000

Virgo, Ursa Menor, Leo, Fornax

Superaglomerado de Virgo-Hydra-Centaurus

300.000.000

Peixes-Baleia, Perseu-Pégaso

Complexo de superaglomerados  de Peixes-Baleia

1.000.000.000

Hércules-Coroa Boreal, Aquarius

 

Tabela 4.3. Escala do Universo circundante.

 

            Para obter uma visão geral da organização das galáxias, podemos visualizar o seguinte: as estrelas se agrupam para formar galáxias. As galáxias, por sua vez, se reúnem para formar os grupos de dezenas de galáxias, que formam aglomerados galácticos, com milhares de galáxias. Mais além estão os superaglomerados galácticos, e finalmente, chegamos aos complexos de superaglomerados. Estes complexos marcam a estrutura do universo até dois bilhões de anos-luz de diâmetro, além que residem os quasares, visíveis somente por causa de sua extraordinária luminosidade. Além desses dois bilhões de anos-luz (o universo deve ter cerca de 30 a 40 de diâmetro) o mapeamento de galáxias é deficiente e não permite uma visão geral, em larga escala do universo.

            Nos últimos anos, nossa visão panorâmica da estrutura do universo mudou drasticamente. A velha imagem na qual as maiores entidades cósmicas eram os grandes aglomerados de galáxias, numa escala além da qual o universo era tido como homogêneo, foi substituída por uma nova com bilhões de anos-luz que parecem não constituir a fronteira final do universo.

            Nesse labirinto imenso, que parece constituir o universo, surgem também regiões de baixa densidade de matéria visível, autênticas bolhas de vácuo no oceano cósmico. Esse universo constituído por imensos filamentos e enormes vazios parece possuir o aspecto de uma gigantesca esponja cósmica, cujos limites se expandem a medida que as nossas tecnologias observacionais evoluem.

 

CAPÍTULO 5

A vida no Cosmos

 

Marcos Boehme

CAPÍTULO 5 - A VIDA NO COSMOS

5.1. Introdução

            Até agora, não há prova da existência de vida em lugar algum do universo, exceto a Terra. Mas isto nunca impediu ninguém de imaginar que o cosmo fosse habitado. Luciano de Samosata, cidadão do Império Romano, na Síria do século II d.C., imaginou uma história, na qual marinheiros são transportados à Lua no meio da guerra entre o Rei do Sol e o Rei da Lua. Giordano Bruno defendeu um universo infinito, sem limites, no qual as estrelas são consideradas como sóis ao redor dos quais giravam outros planetas; ele acreditava ainda que estes planetas deviam ser habitados por seres que, como nós, acreditavam estar no centro do universo. Foi o primeiro que demonstrou que a nossa versão do universo é puramente relativa. A Santa Inquisição acabou por condená-lo, pois Bruno defendia que não poderia existir nenhuma verdade absoluta, e ele foi queimado vivo em 1600.

Johannes Kepler escreveu uma história, Somnium, publicada em 1634, na qual o personagem principal visita a Lua e entra em contato com os seus habitantes. E William Herschel, que descobriu Urano no século XVIII, estava convencido de que não só a Lua, mas também o Sol, eram povoados por seres vivos.

Em 1830 ocorreu um caso famoso, o “Moon Hoax”. Richard Alton Lock, um repórter do jornal The Sun, que acompanhava o trabalho de astrônomos na África do Sul, publicou uma série de artigos no qual comunicou a descoberta, por estes astrônomos, de montanhas de cristal na Lua, assim como animais amarelos, e seres semelhantes a humanos. A farsa foi logo revelada, mas muitas pessoas acreditaram nos artigos. O jornal New York Times revelou que as descobertas eram “possíveis e prováveis”, enquanto seitas religiosas estudavam a possibilidade de converter os habitantes da Lua para a Cristandade.

Pesquisas posteriores demonstraram ser a Lua desprovida de ar e água, e o foco de atenção se deslocou para Marte. Muitas sugestões foram feitas para contactar os marcianos, como gigantescas fogueiras no deserto do Saara, ou poderosos espelhos que focalizariam a luz solar em forma de mensagens, ou ainda plantar árvores na Sibéria, na forma da demonstração do Teorema de Pitágoras. Em 1902 uma senhora francesa, de nome Guzmann, de Bordeaux, ofereceu uma substancial quantia (100.000 francos) como prêmio para o primeiro que conseguisse entrar em contato com seres de outro mundo; Marte foi excluído da competição, pois lhe parecia ser fácil demais entrar em contato com marcianos. E em 1909 Percival Lowell, que construiu o grande Observatório Lowell, em Flagstaff, Arizona, especialmente para observar Marte, escreveu “que Marte é habitado por criaturas de alguma espécie é tão certo quanto é incerto qual tipo de criaturas sejam”.

A certeza de que existia vida em Marte era tão difundida, que uma novela radiofônica criou pânico nos Estados Unidos. Em 1938, Orson Welles adaptou a obra A Guerra dos Mundos (1898), do escritor inglês H.G.Wells, para o rádio, como se a Terra estivesse sendo invadida por um exército marciano invencível. Apesar de ter sido anunciada como novela radiofônica, nem todos se deram conta disso, e como a novela era muito realista, muitos acreditaram na invasão.

Sobre a crença de vida em Marte, o cientista espacial alemão Willy Ley escreveu, em 1967, comentando o espírito dominante nos fins do século XIX e início do século XX: “quem quer que duvidasse deste fato (a vida em Marte) era evidentemente considerado um reacionário, um retrógrado, um teimoso muito inculto, que não merecia atenção, um mal-educado, um chato; um indivíduo que não acompanhava o progresso de sua época. Em lugar de perder tempo com pessoas assim, era muito mais interessante meditar sobre os marcianos que “sabemos” existir”.

            Posteriormente, a comunidade científica mundial se colocou de maneira bem mais cética a respeito da vida extraterrestre. No entanto, conforme o tempo passava, essa postura foi mudando, graças aos seguintes fatores:

·        descobriu-se que eram muitas as estrelas semelhantes ao Sol, e que cada uma delas podia ter seus próprio sistema planetário;

·        os radiotelescópios ampliaram os limites do universo conhecido, e podem possibilitar a comunicação interestelar;

·        encontraram-se moléculas orgânicas em meteoritos, em outros corpos do sistema solar e nas nuvens interestelares;

·        o lançamento do satélite artificial soviético Sputnik, em 4 de outubro de 1957, inaugurou a era espacial, divulgando e popularizando a idéia de viagens interplanetárias;

·        desenvolveram-se teorias consistentes sobre a origem da vida fora de nosso planeta.

            Atualmente, a pesquisa pela vida extraterrestre é aceita definitivamente, desde a Conferência Internacional de Astronomia realizada em agosto de 1982, na Grécia, quando a União Astronômica Mundial aprovou o estabelecimento de uma nova comissão, destinada a reunir os astrônomos preocupados com a procura de vida extraterrestre. Esta comissão reuniu cientistas como o astrofísico Iosif Shklovski, o prêmio Nobel de química Linus Pauling e o astrônomo Carl Sagan.

            Esta comissão tem como objetivos:

·        detectar planetas ao redor de outras estrelas;

·        procurar transmissões de rádio, intencionais ou não, de origem extraterrestre;

·        procurar moléculas interestelares de natureza biológica;

·        desenvolver métodos que permitam evidenciar a atividade biológica fora do nosso planeta

·        coordenar esforços em todas estas áreas em nível internacional.

 

 

5.2. O que é vida ?

            A Terra é um planeta no qual a vida surgiu e evoluiu, para algo que chamamos de inteligência, e para algo mais, a civilização tecnológica. Essa civilização, representada pela humanidade, está agora apta para explorar seus arredores, como a Lua, Marte e outros planetas.

            Por isso mesmo, nos perguntamos: será que há planetas em torno de outras estrelas? Será que há vida nesses planetas? Será que essa vida fora da Terra, se existir, evoluiu e se desenvolveu, para constituir outras civilizações, como a nossa? Podemos entrar em contato com tais civilizações?

            Para começar a procurar respostas a essas perguntas, devemos procurar entender, primeiro, o que é a vida. Cada vez mais esta questão vem sendo focalizada no contexto da evolução do sistema solar e do Universo, se tornando mais importante. Nessa linha de pensamento, a vida deve resultar de uma natural evolução física, química e biológica da matéria inorgânica inicial. Este esquema sugere um possível caráter universal da origem da vida, e envolve ciências como a exobiologia, que trata do desenvolvimento biológico fora da Terra.

            Em primeiro lugar, precisamos caracterizar a vida, para que possamos reconhecer algo vivo quando examinado. Se considerarmos que a característica da vida é o crescimento, podemos considerar uma simples estalactite (um tipo de projeção rochosa que ocorre em cavernas) como viva, pois ela cresce de acordo com o acréscimo de minerais conforme o tempo passa. Se aceitarmos que um ser vivo é algo que processa elementos do meio ambiente para funcionar, ou seja, se alimenta, podemos considerar os automóveis como uma das formas de vida predominantes na Terra. Estas duas definições são obviamente simplistas e incorretas. Parece que caracterizar a vida é algo complicado, portanto precisamos de uma definição complexa do que seja a vida.

            Uma definição muito usada pelos biólogos e bioquímicos é: "um sistema químico auto-sustentado capaz de sofrer evolução darwiniana".

            Assim, consideramos três características fundamentais da vida:

            Os seres vivos são organismos. O crescimento e a manutenção através do metabolismo segue um esquema de organização.

            Os seres vivos se reproduzem. A auto-replicação ou reprodução se realiza através da duplicação da maquinaria celular.

            Os seres vivos são sujeitos à mutação e capazes de transferí-la a seus descendentes, dos quais alguns tem a chance e a sorte de sobreviver.

 

 

5.3. A química da vida

            No estágio atual que a Ciência atingiu, é possível afirmar que o aparecimento da vida não se deve a nenhum milagre, mas simplesmente ao fato de que as moléculas combinaram-se entre si ao longo de uma linha de menor resistência. A vida não poderia ter deixado de se formar nas condições da Terra primitiva, assim como o ferro não poderia deixar de se enferrujar quando exposto ao ar úmido. Em qualquer outro planeta que se assemelhe à Terra, física e quimicamente, o desenvolvimento da vida também seria inevitável, embora não necessariamente de vida inteligente. Ou seja, é aceita pela comunidade científica a origem bioquímica da vida, que nos diz que a matéria viva é semelhante à matéria não viva, cujas diferenças consistem apenas na maior complexidade na organização da matéria viva. Também é aceito o fato de que as moléculas auto replicantes, a base para a vida, se formam naturalmente a partir de moléculas mais simples.

            Em todos os seres vivos, a água é, de longe, a mais comum das moléculas. Imersas na água, encontram-se moléculas extremamente complexas, chamadas proteínas e ácidos nucleicos, que parecem caracterizar toda a vida que conhecemos. As proteínas são constituídas de longas associações de aminoácidos, enquanto que os ácidos nucleicos, como o ARN (ou RNA) e o ADN (ou DNA) são formados por grande número de nucleotídeos. Essas moléculas complexas têm uma estrutura básica, composta de principalmente de encadeamento de átomos de carbono. À maioria dos átomos de carbono unem-se um ou mais átomos de hidrogênio, e a outros unem-se combinações de átomos, entre os quais incluem-se átomos de oxigênio, nitrogênio, enxofre e fósforo.

            Expressando da maneira mais simples, podemos dizer que a vida, tal como a conhecemos, é constituída de derivados de hidrocarbonetos imersos em água.

            Poderia a vida ser formada de alguma outra coisa? Poderíamos encontrar outros tipos de moléculas que forneceriam a complexidade e a versatilidade da vida, alguma outra coisa que não a água, que garantisse as propriedades incomuns necessárias que servem como a base da vida?

            Os bioquímicos sugerem que a amônia líquida é a substância cujas propriedades mais se aproximam das da água,  que o silício é tetravalente e poderia substituir o carbono, que o flúor é um átomo pequeno como o hidrogênio, e podemos imaginar cadeias complexas de silício e oxigênio. Mas será que a vida baseada nesses compostos é possível? Talvez, mas só em condições muito especiais, ou até em condição nenhuma. Acontece que o átomo de silício tem mais massa que o de carbono, o que torna suas ligações químicas mais instáveis. Experiências tentando criar uma “química orgânica” do silício falharam. Parece que a vida baseada em silício é muito improvável. Tudo indica que o carbono e a água são os componentes favoritos para qualquer tipo de vida alienígena, mesmo porque são mais abundantes no universo. Assim, podemos esperar que a vida no cosmos seja composta, preferencialmente, por compostos de carbono, imersos em água. Mesmo assim, a vida extraterrestre, se for baseada no carbono, pode assumir formas muito diferentes das existentes na Terra.

 

 

5.4. Onde a vida poderia surgir

            O lugar aonde a vida poderia surgir e se desenvolver teria de ser necessariamente um planeta em órbita em torno de uma estrela, a qual funcionaria como fornecedora de energia. A nossa galáxia possui cerca de 400 bilhões de estrelas, em um universo que deve conter algo em torno de 100 bilhões de galáxias (ou até mesmo um trilhão, se incluirmos as galáxias anãs). Por causa disso, a maioria dos astrônomos acha que é inevitável que exista vida fora do sistema solar, embora até hoje não haja qualquer prova inequívoca e incontestável disso.

            No entanto, as outras galáxias estão incrivelmente distantes, o que torna a possibilidade de comunicação com uma civilização extragaláctica algo muito remoto (pelo menos enquanto a Teoria da Relatividade, segundo a qual nenhuma forma de energia ou qualquer tipo de influência pode viajar mais rápido que a luz, estiver correta, o que parece estar fora de questão). Assim, vamos considerar apenas nos bilhões de estrelas da nossa própria galáxia, o que ainda parece ser bastante coisa.

 

5.4.1 As estrelas adequadas

            Para começar, as estrelas podem ser classificadas conforme o seu tipo espectral, o que se refere à temperatura e cor de uma estrela, com as letras O, B, A, F, G, K e M (esta classificação está melhor explicada em outro capítulo desta apostila). A nossa estrela, o Sol, é classificada como sendo do tipo G, ou seja, uma estrela amarela.

            As estrelas do tipo M são anãs vermelhas, e correspondem a 70% de todas as estrelas da galáxia. A estrela Próxima Centauri, que tem esse nome por ser a estrela mais próxima do Sol e por se localizar na direção da constelação de Centauro, é uma estrela anã vermelha. Isso quer dizer que ela é 15.000 vezes menos luminosa que o Sol, e da Terra nem conseguimos vê-la a olho nu. Ironicamente, a estrela mais próxima do Sol é tão fraca que nem ao menos podemos vê-la.

            As estrelas anãs laranjas da classe K são 15% da população estelar da galáxia. São estrelas intermediárias entre as anãos vermelhas e o Sol.

            As estrelas anãs brancas, que são estrelas que explodiram e morreram, provavelmente vaporizando os planetas que poderiam ter tido, correspondem a 10% das estrelas, e não podem abrigar vida.

            Isto tudo nos deixa com apenas 5% de todas as estrelas de nossa galáxia, um grupo privilegiado ao qual o Sol pertence. Destes 5%, 4% são de estrelas G, amarelas, e suficientemente brilhantes e quentes, portanto são adequadas para a vida. O 1% restante é constituído de raras estrelas brancas (classe A), de muito raras gigantes azul-esbranquiçadas (classe B) e das raríssimas supergigantes azuis (classe O).

Na tabela a seguir, comparamos o Sol com algumas estrelas próximas.

As dez estrelas mais luminosas, das 100 mais próximas

ordem

nome

luminosidade (Sol=1)

tipo espectral

distância

(anos luz)

1

Sírius A

23,55

A1

  8,7

2

Altair

11,07

A7

16,5

3

Procyon A

  7,66

F5

11,4

4

Alfa Centauri A

  1,54

G2

    4,35

5

Eta Cassiopeiae A

  1,25

G0

19,1

6

Delta Pavonis

  1,08

G7

18,6

7

Sol

  1,00

G2

0

8

Tau Ceti

  0,45

G8

11,8

9

Alfa Centauri B

  0,44

K1

   4,35

10

70 Ophiuchi A

  0,43

K0

16,1

 

Tabela 5.1.

 

Analisando as estrelas mais próximas e comparando-as com o Sol, vemos que 93% das estrelas próximas são mais fracas que o Sol, e apenas 6% delas são mais fortes, o que quer dizer que o Sol é uma estrela que se situa acima da média.

            Como as estrelas abastecem a vida de energia, são as estrelas as primeiras coisas que devem ser consideradas em um sistema, na busca por inteligências extraterrestres. Assim, uma estrela precisa passar vários testes diferentes, antes de ser considerada um lugar promissor.

            Para garantir a maturidade e a estabilidade de uma estrela, ela tem que estar na seqüência principal. Estando na seqüência principal, as estrelas fundem hidrogênio e hélio nos seus núcleos, gerando luz e calor com regularidade. Isto elimina as anãs brancas e gigantes vermelhas, além das estrelas de nêutron, pulsares e buracos negros.

            É necessário também que a estrela possua o tipo espectral correto, porque ele determina a quantidade de energia que a estrela emite, e o tempo que vivem. Assim, as estrelas mais energéticas, dos tipos O, B e A falham pois emitem energia a taxas tão altas que duram pouco tempo e morrem. Uma tipo B como Regulus dura apenas 100 milhões de anos, por exemplo. Como a vida demorou bilhões de anos para se desenvolver, as estrelas O, B, A e até mesmo algumas do tipo F não vivem tempo suficiente. As estrelas do tipo M também falham, mas por motivos diferentes. Próxima Centauri é uma anã vermelha da seqüência principal e viverá por centenas de bilhões de anos. Porém, estrelas da classe M são muito fracas e muito frias, e podem ser descartadas, pois não podem sustentar a vida. Assim, sobram as estrelas adequadas: são as menores do tipo F, todas as do tipo G, e as maiores do tipo K.

            Por fim, é necessário que a estrela possua elementos pesados, como carbono, nitrogênio, oxigênio e ferro, necessários para a vida, pois só assim estes elementos estarão presentes nos planetas que acompanhariam estas estrelas. Como todas as estrelas, o Sol se compõe principalmente dos elementos Hidrogênio e Hélio, e também de 2% de sua massa em elementos pesados. Não parece muito, mas considerando a massa total do Sol, foi o suficiente para que restos desse material formasse planetas rochosos e metálicos como a Terra. Apenas estrelas de segunda ou terceira geração podem possuir elementos pesados, pois tais elementos não foram criados por ocasião do Big-Bang, mas sim em estrelas que posteriormente explodiram e espalharam estes elementos pelo espaço, material que posteriormente formou novas estrelas.

            Se uma estrela passar nestes, ela terá condições suficientes para sustentar vida. No entanto, a vida precisa de um planeta para habitar, que deve ser aquecido, rico em rochas e metais, e possuir água líquida em abundância, como a Terra.

5.4.2 Os planetas adequados

Também existem certas exigências que devem ser cumpridas pelos planetas, para que eles sejam considerados adequados para sustentar a vida. Por exemplo, os planetas no sistema solar podem ser gigantes gasosos, como Júpiter, provavelmente incapazes de gerar vida avançada, e planetas pequenos e rochosos, como a Terra, que apresenta superfície sólida. Portanto, consideramos como viáveis apenas os planetas pequenos, de composição rochosa e metálica, como nossa Terra, Marte, Mercúrio, Vênus e a Lua, além de outros satélites.

            Esse planeta rochoso deve estar localizado na "zona de vida" da estrela a qual orbita, que é a região que circunda a estrela na qual a temperatura alcança o ponto triplo da água. Este é o ponto no qual pequenas variações de temperatura e pressão são capazes de transformar a água em sólido, líquido ou gasoso, o que ocorre no nosso planeta, possibilitando a distribuição e reaproveitamento de água por todo o nosso ecossistema. Vênus está muito perto do Sol, e entrou em efeito estufa descontrolado, se tornando muito quente para a vida, e Marte está muito distante, possuindo apenas água congelada.

            Quanto às perguntas seguintes, as respostas dependem muito mais da Biologia do que da Astronomia, e se tornam muito mais difíceis de solucionar, uma vez que são muito mais complexas. Existem três perguntas principais. A primeira é: se tivermos um planeta ideal, como a Terra, orbitando uma estrela ideal, como o Sol, a vida primitiva se desenvolveria obrigatoriamente? A segunda: se a vida primitiva se desenvolver, ela evoluirá para formas de vida mais avançadas? E finalmente, se essas formas de vida evoluírem, a vida inteligente surgirá também? Não há garantias para nenhuma destas perguntas, pois não temos como estudar outros lugares aonde a vida se formou. Afinal, não conhecemos nenhum lugar, além da Terra, aonde a vida surgiu.

 

 

5.4.3. A nossa galáxia é povoada ?

            Se não sabemos se existem outras formas de vida ou outras civilizações em nossa galáxia, pelo menos podemos fazer estimativas com base em estatísticas, usando, por exemplo, a fórmula de Drake, exibida pelo cientista Frank Drake, mostrada a seguir:

Fórmula de Drake

                                   N = N« x fp x ne x f1 x fi x fc x fL

aonde:

            N         número de civilizações técnicas avançadas na Galáxia;

            N«      número de estrelas da Via Láctea;

            fp         fração de estrelas com sistema planetário;

ne        número de planetas, em um sistema, ecologicamente

adequados;

            fl          fração de planetas adequados nos quais a vida surgiu;

            fi          fração de planetas habitados nos quais evoluiu uma forma de

                        vida inteligente;

            fc          fração de planetas habitados por seres inteligentes, nos quais

                        desenvolveu-se uma civilização técnica comunicativa; e

            fL         fração da duração de vida planetária favorecida com uma civilização técnica.

 

            Os fatores N« e fp são razoavelmente conhecidos pelos astrônomos, mas do fator ne em diante, tudo é mais difícil de estimar. Os demais fatores da equação são muito incertos (principalmente o último, que trata da duração de uma civilização) porque se apoiam na Biologia, e até na Sociologia, e é impraticável extrapolar os dados que temos sobre a humanidade para uma civilização extraterrestre. Depois de examinar os fatores da equação de Drake, podemos estimá-los para conseguir uma estimativa do número total de civilizações desenvolvidas, hoje, em nossa galáxia, a Via Láctea.

            Vamos agora examinar estes fatores individualmente:

            N«, número de estrelas da Via Láctea; este fator é razoavelmente conhecido pelos astrônomos, pois pode ser inferido pelo movimento das estrelas em torno da nossa galáxia. Como a Via Láctea possui massa equivalente a 100 bilhões de vezes a do Sol (aproximadamente), e a massa do nosso Sol se situa acima da média, podemos considerar, um tanto quanto otimisticamente, a cifra de 400 bilhões como o número total de estrelas em nossa galáxia.

            fp, fração de estrelas com sistema planetário; nem todas as estrelas podem possuir planetas ao seu redor, pela simples razão de que muitas delas fazem parte de sistemas binários. Isso significa que a maioria das estrelas não está isolada no espaço como o nosso Sol, mas faz parte de sistemas de estrelas. Um exemplo é o sistema de Alfa Centauri. Alfa Centauri é um sistema de três estrelas, das quais uma tem massa similar à do Sol (Alfa Centauri A); outra possui massa um pouco menor (Alfa Centauri B) e a terceira é uma anã (Próxima Centauri, ou Alfa Centauri C). Quando as estrelas de um sistema múltiplo estão muito próximas, suas gigantescas massas influem na órbita dos planetas, tornando o sistema caótico. Se nosso Sol tivesse uma estrela companheira como Alfa Centauri B, Saturno não poderia nem ter existido, e Júpiter teria sido engolido por uma das estrelas ou ejetado para fora do nosso sistema. Estimativas sugerem que entre um terço e um quinto das estrelas vagueiam solitárias no espaço, acompanhadas por planetas, como o nosso Sol.

            ne, número de planetas, em um sistema, ecologicamente adequados; ao examinar uma estrela acompanhada de planetas, quantos planetas, em média, são do tamanho adequado (ou seja, terrestres), e se localizam à distância correta do Sol? No nosso sistema solar, parece haver dois, a Terra e Marte. No entanto, pode ser que o nosso sistema tenha tido sorte demais, e vamos adotar o valor de um meio para a estimativa pessimista.

            f1, fração de planetas adequados nos quais a vida surgiu; será que qualquer planeta, terrestre e à distância adequada, abriga necessariamente algum tipo de vida? Afinal de contas, pode ser que a maioria dos planetas seja pobre em compostos orgânicos; ou ser simplesmente pequeno demais para ter uma atmosfera significativa, como parece ter sido o caso de Marte. Assim, estimamos que este fator deve assumir valores entre um terço e um quinto.

            fi, fração de planetas habitados nos quais evoluiu uma forma de vida inteligente; sabemos, pela simples observação da vida em nosso próprio planeta, que é a inteligência não é privilégio de muitos. Sabemos que os primatas são razoavelmente inteligentes, e os golfinhos tem uma inteligência bastante significativa, pois aprendem com a experiência e chegam a vencer alguns humanos em testes simples de memorização e lógica, além de ser muito rápidos em diferenciar objetos pela forma ou cor. Fora isso, nenhuma espécie viva impressiona pela sua inteligência. Assim, podemos considerar que as possibilidades de um ecossistema independente gerar vida inteligente pode ficar entre uma em vinte e uma em oitenta.

            fc, fração de planetas habitados por seres inteligentes, nos quais desenvolveu-se uma civilização técnica comunicativa; para o desenvolvimento de uma civilização, não basta uma espécie ser inteligente. Ela deve ser capaz de manipular objetos com precisão. Os golfinhos, por exemplo, moram em um ambiente aquático, e são incapazes de manipular ferramentas, de conhecer o fogo, ou de construir qualquer coisa, e são incapazes de criar uma civilização, por mais primitiva que fosse. Mesmo os chimpanzés, que são capazes de manipular ferramentas, não construíram uma civilização. Este é um assunto extremamente complexo, e adotamos os valores de 1/5, otimista, e 1/10, pessimista.

            fL, fração da duração de vida planetária favorecida com uma civilização técnica; suponhamos que em um planeta, tenha surgido uma civilização, capaz de se comunicar pelo espaço. Esta civilização pode ter existido por algum tempo, e desaparecido, antes que a nossa tivesse surgido. Assim, para sabermos com quantas civilizações nós podemos entrar em contato, devemos saber quanto tempo uma civilização avançada pode existir. Existem muitos motivos pelos quais uma civilização como a nossa pode sucumbir: a queda de um grande asteróide pode devastá-la (extinção em massa), ou ela pode sufocar pela exaustão de seus recursos naturais (superpopulação), ou ela pode se deixar esmagar por sua própria tecnologia (hecatombe nuclear). Consideramos que a nossa civilização tecnológica existe desde o momento em que inventamos o instrumento capaz de nos proporcionar a comunicação entre as estrelas, ou seja, o radiotelescópio, há coisa de uns trinta anos atrás. Mas qual é a duração média de uma civilização dessas? Será que a maioria desaparece depois de pouco tempo? Ou será que a maioria supera os desafios que se apresentam, e sobrevive enquanto sua estrela é capaz de lhe fornecer energia (ou até mais, se essa civilização se expandir por outros sistemas estelares)? A verdade é que não temos a mínima idéia, nem mesmo para nossa própria civilização. Nesse caso, adotamos os valores de 5 milhões de anos para o caso otimista, e 500 anos para o pessimista, e os dividimos pela duração do nosso planeta (cerca de 5 bilhões de anos). Assim, os valores para fL são, respectivamente, de um milésimo e de um décimo de milionésimo.

            Assim, são mostrados abaixo dois cálculos, um otimista e outro pessimista, baseados no conhecimento atual que temos da possibilidade de vida extraterrestre.

            É necessário deixar bem claro que as cifras apresentadas são apenas palpites bem fundamentados, e podem estar completamente erradas. Qualquer um, inclusive o leitor, pode adotar seus próprios valores para os fatores da fórmula.

            Cálculo otimista

            N = 400.000.000.000 x 1/3 x 2 x 1/3 x 1/20 x 1/5 x 1/1.000

            N 1.000.000

 

            Cálculo pessimista

            N = 400.000.000.000 x 1/5 x 1/2 x 1/5 x 1/80 x 1/10 x 1/10.000.000

            N = 1

            Como se verifica facilmente, o grau de incerteza é tão grande, que o número de civilizações evoluídas tecnicamente, capazes de se comunicar através do abismo entre as estrelas, e que existam nesse momento, espalhadas pela galáxia, pode variar entre apenas uma (a nossa) e um milhão, o que deixa bem evidente que ainda sabemos pouco sobre o universo que nos rodeia. E mesmo que aceitássemos que existem um milhão de civilizações avançadas, à espera da oportunidade de se comunicar conosco, elas estariam à distância média de duzentos anos-luz uma da outra, uma distância bastante respeitável, o que exige extremo desenvolvimento tecnológico e persistência para efetivar a comunicação interestelar.

 

 

5.5. A procura pela vida extraterrestre

            A pesquisa pela existência de vida em outros lugares que não o nosso planeta começou pelo exame de meteoritos, provenientes do espaço exterior e que vieram a cair na Terra. Já em 1961, alguns destes meteoritos, ao serem examinados, mostraram possuir, no seu interior, compostos orgânicos. Mais recentemente, o meteorito Allende revelou possuir numerosos aminoácidos que não são encontrados em nenhuma forma de vida terrestre. Outras pesquisas demonstram que o meio interestelar é povoado por moléculas orgânicas de certa complexidade, espalhadas por toda a galáxia.

5.5.1 Vida no sistema solar

            O advento da era espacial trouxe consigo a pesquisa direta pela vida em outros corpos do sistema solar. A exploração da Lua confirmou as crenças anteriores, de que o nosso satélite era morto, por não possuir atmosfera, pela grande variação na temperatura de sua superfície e bombardeio contínuo de partículas do vento solar. Não foram encontrados traços de compostos orgânicos nas amostras lunares. Mercúrio é tão desolado quanto a Lua, e bem mais quente. Vênus não possui água e sua temperatura superficial é de 500 graus Celsius, condições muito desfavoráveis ao aparecimento da vida. Marte, no entanto, parece apresentar um ambiente mais favorável: possui temperatura superficial razoável, entre zero e cem graus Celsius negativos; possui uma atmosfera tênue, composta quase que somente de dióxido de carbono; e desde a visita, em 1962, da sonda Mariner 9 se sabe que Marte apresenta formações que lembram vastos leitos de rios secos e afluentes. Parece que Marte, no primeiro bilhão de anos de sua existência, apresentou oceanos de água líquida em sua superfície, talvez até alguns mares de pequena extensão; posteriormente, a baixa gravidade de Marte deve ter permitido que sua atmosfera original escapasse lentamente para o espaço, desativando o efeito estufa e fazendo com que sua temperatura baixasse para os níveis atuais. Atualmente, é um planeta árido e o que existe de água em Marte está congelado abaixo da sua superfície. Em 1976, as sondas automáticas Viking 1 e 2 pousaram em Marte e puderam examinar amostras de sua superfície, submetendo-as a testes. No entanto, estes testes falharam em descobrir qualquer composto orgânico, e parece que não existe vida em Marte. No entanto, pode ter existido alguma forma simples de vida quando existia água líquida em Marte, o que torna o planeta vermelho um importante alvo de pesquisas futuras.

            Em 1984, uma expedição descobriu pedaços de rocha na Antártida, misturados com o gelo, que vieram juntar-se aos 15.000 fragmentos de meteorito encontrados no continente gelado. Ao analisar sua constituição, descobriu-se que estas rochas vieram do planeta Marte, arremessadas para o espaço depois de algum impacto gigantesco, algumas das quais caíram na Terra. Uma década depois, cientistas, examinando as doze rochas encontradas e identificadas como de origem marciana, descobriram traços de vida unicelular no maior deles, o meteorito ALH 84001.

            Este meteorito, descoberto nas vastidões geladas de Allan Hills, pertenceu à crosta marciana, e deve ter se formado há 4 bilhões de anos. Sua origem foi confirmada porque, quando a rocha é aquecida, libera uma mistura de gases consistente com a composição da atmosfera de Marte. Há cerca de 3,6 bilhões de anos, bolhas de minerais chamados de carbonatos se formaram dentro de pequenas fissuras na rocha. Há 15 milhões de anos, algum asteróide ou cometa caiu em Marte arremessando material para fora do planeta, incluindo a pequena porção de material que viria a ser chamada de ALH 84001. Ela orbitou o Sol por cerca de 13.000 anos, quando caiu na Antártida, onde permaneceu até 1984. Desde então, até 1992, pensou-se que ele fosse um fragmento do asteróide Vesta, quando sua origem marciana foi comprovada.

            Richard Zare, um químico de Stanford, membro da equipe que examina as amostras, usou lasers e um detector extremamente sensível chamado de espectrômetro de massa para identificar moléculas chamadas de Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos (HPAs). Os HPAs resultam da combustão; são encontrados em resíduos de diesel queimado e em vários outros meteoritos. Mas eles também se originam da decomposição e fossilização de organismos vivos. Os HPAs estão profundamente incrustados nas fissuras da rocha, e sua concentração é muito superior à existente no gelo da Antártida. Estes dois fato sugerem fortemente que os HPAs provêm de Marte, e não do espaço exterior ou da Terra. Como os HPAs se concentram em torno das bolhas de carbonatos no seu interior, os pesquisadores os colocaram debaixo de outra maravilha da tecnologia: um microscópio eletrônico de transmissão com resolução ultra alta. Foram encontradas camadas de cristais envolvendo os carbonatos, cada cristal com diâmetro variando de 10 a 100 nanômetros (um nanômetro é equivalente a um bilionésimo de metro). Estes cristais têm a forma de cubos ou gotas, como os produzidos da Terra, por bactérias. Em outras palavras, os cristais se assemelham a depósitos de material formados por bactérias.

            Os pesquisadores David McKay e Everett Gibson, do Johnson Space Center, focalizaram grânulos envolvendo as bolhas de carbonato e encontraram formas tubulares com bordas arredondadas, de dimensões entre 20 e 200 nanômetros, que foram consideradas como microfósseis de Marte, ou seja, os próprios microorganismos marcianos, aprisionados quando as bolhas de carbonatos se formaram. A sua forma é semelhante às bactérias terrestres primitivas, mas as marcianas são cerca de 100 vezes maiores.

            Ainda não há unanimidade em torno destas descobertas, uma vez que é perfeitamente possível que estas estruturas sejam de origem não biológica, pois os próprios pesquisadores e a NASA anunciam que as evidências não são definitivas e ainda é necessária confirmação para os resultados que obtiveram. O próximo passo será obter fatias ultrafinas das estruturas tubulares (ou seja, os microfósseis) e procurar por estruturas semelhantes a membranas celulares ou até mesmo aminoácidos, os blocos de construção do DNA.

            Além de Marte, os asteróides também não parecem ser muito favoráveis à existência de vida, pois são, geralmente, blocos de rocha e gelo orbitando o Sol. Os planetas gigantes, como Júpiter e Saturno, apresentam enormes atmosferas, ricas em compostos orgânicos. As cores destas atmosferas são provavelmente devidas a estes compostos. É possível que algumas camadas de suas atmosferas apresentem temperaturas favoráveis, mas é difícil imaginar alguma forma de vida surgindo em um planeta gasoso, que nem ao menos tem superfície. Em Urano e Netuno, também gigantes gasosos, a temperatura é muito mais baixa, e no pequeno Plutão, aonde até o nitrogênio congela, parece impossível a existência de qualquer tipo de vida.

            O cenário parece melhorar quando enfocamos os maiores satélites dos planetas gigantes, como Io, Europa, Ganimedes e Calisto, de Júpiter, e Titã, de Saturno. Europa parece possuir uma camada de água líquida abaixo de uma crosta de gelo. Titã parece ser mais promissor, pois é o único satélite a possuir uma atmosfera significativa: sua pressão superficial é duas vezes superior à da Terra. Estas características fazem de Titã um mundo surpreendente e extraordinário, pois também possui grande quantidade e variedade de compostos orgânicos. Talvez Titã seja o local apropriado para o surgimento de uma forma de vida completamente diferente da existente na Terra. No entanto, estas especulações parecem ser esforços desesperados para encontrar um lugar habitável em nosso próprio sistema solar. A zona habitável em torno do nosso Sol inclui apenas um planeta, que é a nossa Terra.

5.5.2 Busca por planetas em torno de outras estrelas

            Para localizar planetas orbitando outras estrelas, podemos usar duas estratégias. A mais óbvia é identificar a luz que o planeta em questão reflete. No entanto, considerando que os planetas são pequenos, que a luz que refletem é muito pouca, e que esta luz é ofuscada pela luz de sua estrela, milhões de vezes mais brilhante, verificamos que ainda não possuímos equipamentos capazes de descobrir planetas dessa maneira. Temos de optar por outra estratégia.

            Sabemos, graças à teoria da gravitação, que os planetas giram em torno de nosso Sol porque são atraídos por sua enorme força gravitacional. Essa mesma teoria nos diz que os planetas exercem uma força gravitacional sobre o Sol, o qual, por ser muito maior que todos os planetas juntos, responde a essa força movendo-se só um pouco. Assim, os planetas e o Sol executam uma dança em torno de um ponto que fica entre eles, chamado de baricentro do sistema solar. Então, se um observador de fora de nosso sistema solar observar o Sol, perceberá que este muda de posição conforme o tempo passa, dependendo da posição e massa de todos os seus planetas.

            Chamamos esta estratégia de pesquisa indireta por outros planetas, e através dela é possível obter a massa, o tamanho do planeta e o de sua órbita, com base no tamanho e forma da trajetória oscilante da estrela.

            Mesmo assim, este é um trabalho muito difícil, pois é necessário medir o movimento das estrelas pesquisadas com grande precisão. Um exemplo dessa dificuldade é a pesquisa realizada por Peter van der Kamp, respeitado pela comunidade científica como um astrônomo meticuloso e bem versado nas técnicas de medir posições de estrelas. Van de Kamp afirmou que algumas das estrelas mais próximas mostram variações em suas posições, pequenas mas mensuráveis. A mais evidente é uma estrela anã vermelha, conhecida como estrela de Barnard, cujo movimento, segundo ele, revela a presença de pelo menos um planeta em órbita, quase tão grande quanto Júpiter. No entanto, a maioria dos astrônomos ainda acha pouco convincentes as provas de van de Kamp. As técnicas e equipamentos utilizados (no caso, fotografias, obtidas através do telescópio de Swarthmore, de médias dimensões) e a interferência da atmosfera terrestre levantam grandes dúvidas quanto à sua capacidade de obter dados exatos. É difícil medir as posições das estrelas com precisão suficiente para descobrir quaisquer movimentos provocados por um planeta.

            Enquanto isso, há uma técnica alternativa muito mais sensível, que mede os movimentos das estrelas em relação a nós. Segundo o efeito Doppler - Fizeau, um objeto luminoso que se aproxime de um observador apresentaria a tendência de ficar mais azulado, ao passo que se tornaria avermelhado caso se afastasse. Esse movimento seria causado pela influência gravitacional dos planetas que orbitariam esta estrela. Com essa técnica, seria necessário obter o espectro de luz de uma estrela distante e medir seus comprimentos de onda, para verificar se ela se movimenta em relação a nós, e quanto, para que possamos saber a massa e órbita dos planetas que porventura orbitem esta estrela. Por exemplo, se estivéssemos observando o nosso Sol à grande distância ao longo de seu plano orbital, veríamos o Sol se aproximar em nossa direção com uma velocidade de até 50 quilômetros por hora durante metade da órbita de Júpiter, e veríamos o Sol se distanciar durante a outra metade. O movimento do Sol seria percebido, denunciando a existência de Júpiter, mesmo que Júpiter não possa ser visto.

            Infelizmente, existe um obstáculo terrível para a pesquisa de planetas extrasolares, que é a limitação de tempo. Para identificar Júpiter no nosso exemplo, precisaríamos de décadas. Como Júpiter possui uma órbita de 12 anos em torno do Sol, demoraria pelo menos uma década para encontrá-lo, e mais outra década para confirmá-lo. Se buscássemos identificar Saturno, precisaríamos talvez de toda uma vida de pesquisas e observação constantes.

            Em julho de 1991, foi anunciada a descoberta de um planeta aonde este não deveria estar. O planeta, mais ou menos do tamanho de Júpiter, estaria na órbita de um pulsar distante, que deveria ter vaporizado qualquer planeta que o orbitasse quando evoluiu de estrela para pulsar, passando pelo estágio de supernova. Este planeta foi detectado pelo astrônomo britânico Andrew G. Lyne e seus colaboradores, que não estavam procurando planetas, mas apenas medindo a regularidade dos pulsares. Ao gravar seus dados, eles notaram mudanças regulares no tempo de chegada das pulsações que só poderiam ser provocados pelo movimento regular em resposta à atração de um planeta invisível. Seis meses depois do anúncio do novo planeta, Andrew Lyne discursou perante a Sociedade Astronômica Americana, dizendo que estava enganado. As mudanças aparentes nos tempos de pulsação eram provocados pela maneira pela qual ele e seus colaboradores corrigiam seus relógios para levar em conta o movimento da Terra em torno do Sol. A agitação provocada foi tão grande que obscureceu o anúncio, por um grupo independente de astrônomos, de um provável par de planetas em torno de outro pulsar distante. Eles verificaram cuidadosamente o seu trabalho para evitar erros como o cometido por Lyne, e parece bastante sólido e confiável.

            Em 1992, foi anunciada a descoberta de três planetas em torno do pulsar PSR 1257 + 12, que se situa a 2600 anos luz da Terra. O planeta A se situa a 2.000.000 de quilômetros do pulsar, possuindo um período de 25 dias e massa equivalente à da Lua. O planeta B se situa a 50 milhões de quilômetros, com período de 66,5 dias e massa 3,4 vezes à da Terra. E finalmente, o planeta C dista 75 milhões de quilômetros do pulsar, seu período é de 98 dias e sua massa, de 2,8 vezes a terrestre. Estes planetas podem ser tudo o que sobrou de um sistema solar cuja estrela explodiu e se transformou num pulsar, vaporizando os planetas próximos e arrancando as atmosferas dos planetas mais distantes, e tudo o que sobrou foram os seus núcleos, agora cinzas congeladas orbitando um pulsar.

            Em outubro de 1995, os astrônomos suíços Michael Mayer e Didier Queloz, do Observatório de Genebra, anunciaram a descoberta de um planeta orbitando a estrela 51 Pegasi, que dista 42 anos luz da Terra, uma estrela semelhante ao nosso Sol. Ao que parece, este planeta possui massa equivalente à metade da de Júpiter, e dista apenas a 7 milhões de quilômetros de sua estrela, sete vezes menos que a distância de Mercúrio ao nosso Sol. Este planeta orbita 51 Pegasi a cada 4,2 dias e deve possuir uma temperatura de 1300 graus Celsius, e provavelmente se constitui de uma bola metálica e rochosa, parcialmente derretida e com forte atividade vulcânica. Sua existência já foi confirmada por vários observadores independentes.

            Em janeiro de 1996, Geoffrey Marcy e Paul Butler, da Califórnia, descobriram dois novos planetas além do sistema solar, que orbitam as estrelas 70 Virginis (a 78 anos luz de distância) e 47 Ursae Majoris (a 44 anos luz de nós), ambas parecidas com o nosso Sol. Embora as duas estrelas sejam visíveis a olho nu, o brilho dos planetas é completamente ofuscado pelo brilho de suas estrelas, mesmo através do uso dos mais potentes telescópios. Marcy e Butler monitoraram um total de 120 estrelas por sete anos, utilizando um espectrógrafo montado em um telescópio de três metros do Observatório Lick, na Califórnia. Análises efetuadas através de computador revelam que a luz das duas estrelas torna-se, a intervalos perfeitamente regulares, ligeiramente mais azulada ou avermelhada, alternadamente, indicando que elas se movem para a frente e para trás em relação à Terra. Segundo o efeito Doppler - Fizeau, um objeto que se aproxime de um observador apresentaria a tendência de ficar mais azulado, ao passo que se tornaria avermelhado caso se afastasse. De acordo com Marcy, em cada caso os movimentos detectados descrevem uma curva quase perfeita, um movimento tão periódico que apenas um objeto invisível puxando a estrela para a frente e para trás pode explicar o fenômeno.

            Os pesquisadores calculam que o corpo orbitando 47 Ursae Majoris possui uma massa equivalente a 3,5 vezes a de Júpiter (mais de mil vezes a massa da Terra), e circula a estrela a cada três anos, a uma distância de duas Unidades Astronômicas (que é equivalente à distância que separa a Terra do Sol, ou seja, 150 milhões de quilômetros). Sua temperatura superficial deve ser de 90 graus Celsius negativos.

            Por outro lado, o objeto que orbita 70 Virginis possui uma massa de cerca de oito vezes a de Júpiter (mais de 2.500 a massa terrestre), orbita sua estrela à metade da distância da Terra e sua temperatura superficial é estimada de 80 graus Celsius, positivos.

            Atualmente, o ritmo de descobertas de planetas ao redor de estrelas semelhantes ao nosso Sol parece estar se acelerando, o que permitirá criar modelos mais adequados de formação de outros sistemas estelares.


Tabela dos planetas extrasolares

Sistema

 

Distância

(à Terra)

Ano descoberta

Massa

Período

Distânica

(da órbita)

PSR B 1257 + 12

300 pc

1992

3,4 t

66,5 d

0,36 UA

 

 

1992

2,8 t

98,2 d

0,47 UA

 

 

1994

0,015 t

25,3 d

0,19 UA

 

 

1996

100 t

170 a

40 UA

PSR B 0329 + 54

780 pc

1995

2,2 t

6160 d = 16,9 a

7,3 UA

 

 

1995

0,3 t

1105 d = 3,3 a

2,3 UA

51 PEGASI

14,7 pc

1995

0,6 J

4,2 d

0,05 UA

70 VIRGINIS

22 pc

1996

6,4 J

116,7 d

0,43 UA

47 URSAE MAJORIS

13,3 pc

1996

2,4 J

1090 d = 3 a

2,1 UA

55 CANCRI

13,4 pc

1996

0,8 J

14,8 d

0,11 UA

 

 

1996

> 5 J (?)

> 8 a (?)

4 UA (?)

HD 114 762

28 pc

1989

10 a 20 J

84 d

0,4 UA

Lalande 21 185

2,5 pc

1996

0,9 J

2100 d = 5,8 a

2,5 UA

 

 

1996

1,6 J

11.000 d = 30 a

10 UA

 

 

1996

 

 

 

PSR B 1620 - 20

3.800 pc

1996

< 12 J

100 a

38 UA

TAU BOOTIS

15 pc

1996

3,9 J

3,31 d

0,046 UA

UPSILON ANDROMEDAE

16,5 pc

1996

0,6 J

4,61 d

0,057 UA

CM DRACONIS

14,7 pc

1996

?

?

?

16 CYGNI

21,4 pc

1996

1,6 J

804 d = 2,2 a

0,6 - 2,7 UA

PSR 1828 - 11

3.620 pc

?

3 t

0,68 a

0,93 UA

 

 

?

12 t

1,35 a

1,32 UA

 

 

?

8 t

2,71 a

2,1 UA

RHO CORONAE BOREALIS

17 pc

1997

1,13 J

40 d

0,25 UA

HD 217107

64 al

1998

1,3 J

7,1 d

0,07 UA

HD 195019

121 al

1998

3,4 J

18,3 d

0,14 UA

Gliese 876/Ross 780

4,7 pc

1998

1,9 J

61 d

0,3 UA

14 HERCULIS

59 al

1998

3,4 J

1654 d

?

IOTA HOROLOGII

56 al

1999

2,2 J

320 d

0,93 UA

HD 75289

94 al

1999

0,42

3,5 d

0,04 UA

HD 209458

154 al

1999

0,69 J

3,5 d

0,04 UA

HD 130322

97 al

1999

1,1 J

10,7 d

0,08 UA

GJ 86

36 al

1999

4,9 J

16 d

0,11 UA

HD 192263

65 al

1999

0,76 J

24 d

0,15 UA

HD 210277

69 al

1999

1,28 J

417

1,15 UA

GJ 3021

57 al

2000

3,3 J

134 d

0,49 UA

HD 89744

127 al

2000

7,2 J

256 d

0,88 UA

HD 12661

121 al

2000

7,8 J

264 d

0,82 UA

 

Tabela 5.2.

Notas:

            t = massa da Terra                          J = massa de Júpiter (1 J = 318 t)

d = dia                                               a = ano

            UA = Unidade Astronômica (150 milhões de quilômetros)

            pc = Parsec (1 pc = 3,26 anos luz)                       al = ano-luz

 

5.5.3 Comunicação interestelar

            Foram levadas a termo muitas tentativas isoladas de busca de civilizações através de radiação eletromagnética (como o rádio), até que, em 12 de outubro de 1992, 500 anos após a chegada de Colombo no Novo Mundo, se iniciou o programa SETI (Search for ExtraTerrestrial Intelligence - Busca por Inteligência Extraterrestre), que contava, pela primeira vez, com forte apoio governamental. Neste dia, cientistas ativaram equipamentos, como scanners (equipamento de varredura) em radiotelescópios gigantes, as quais monitorariam estrelas semelhantes ao Sol, em busca de sinais de rádio reconhecíveis. Infelizmente, a alegria durou pouco: alegando falta de verbas e baixa probabilidade de sucesso, o congresso norte-americano cancelou as verbas para o projeto no começo de 1994, e desde então vem sido levado a cabo uma tentativa de manter o projeto, desta vez exclusivamente através da iniciativa privada, através de doações. Esta tentativa obteve êxito parcial, e o projeto prossegue na sua pesquisa, embora com objetivos mais limitados.

CAPÍTULO 6

Cosmologia

 

Antônio C. de Lucena

CAPÍTULO 6 - COSMOLOGIA

6.1. Aspectos introdutórios e históricos

6.1.1. Introdução à Cosmologia.

            A cosmologia é, provavelmente, um dos mais velhos, senão o mais velho, dos empreendimentos intelectuais da espécie humana e sua origem se perde na noite dos tempos.

            Precedeu a ciência e surgiu quando o homem primitivo fez suas primeiras tentativas vacilantes de compreender e explicar o mundo que percebia.

            Atualmente se entende por cosmologia (científica) o estudo científico, em larga escala, da origem, estrutura e evolução do Universo como um todo. O estudo da origem das estruturas visíveis do Universo, no sentido amplo da palavra (detectáveis seria mais apropriado), desde os imensos aglomerados de galáxias até o sistema solar, se situa nos domínios da Cosmogenia (ou Cosmogonia). Assim, a cosmogenia se incorpora naturalmente à Cosmologia.

            Alguns dos problemas mais importantes que são atacados pelas teorias cosmológicas são:

            ð Quando e como o Universo começou.

            ð Quando e como as galáxias se formaram e adquiriram a variedade que se observa.

            ð Quando e como as estrelas nasceram (e nascem).

            ð Quando e como os planetas nasceram (e nascem) e  como e quando a vida começou.

            Finalmente, a Cosmologia também indaga e estuda como evoluem todos estes objetos do Universo e qual será o seu futuro.

 

6.1.2 Aspectos históricos.

6.1.2.1. Introdução

            No decorrer da história da humanidade, pode-se verificar que a preocupação com a origem de tudo que existia, bem como de seu fim último, sempre foi uma preocupação da espécie humana. Assim, desde cedo, o homem procurou "explicações" para o que percebia no mundo ao seu redor. Conforme a natureza das explicações que tinha pode-se, a grosso modo, estabelecer as cosmologias com sendo:

            ð Místicas

            ð Mitológicas (Religiosas)

            ð Filosóficas

            ð Científicas

6.1.2.2. Cosmologias místicas.

            Foram, sem dúvida, as primeiras cosmologias a surgirem. Nesta época o homem concebia o Universo como uma atividade de espíritos, motivados por emoções e impulsos semelhantes aos dos seres humanos. Foi o que se poderia chamar de a idade da magia. A concepção do mundo era totalmente animista. Alguns resquícios dessas concepções são encontrados ainda hoje em dia, embutidos em algumas religiões.

            Até quando essa concepção dominou totalmente o pensamento humano é impossível de se determinar, mas pode-se, tentativamente, estabelecer com final de sua hegemonia a aurora da história, a cerca de 10.000 anos atrás, época em que a humanidade já havia alcançado certo estágio político, com as cidades - estados. Nesta época começaram a surgir concepções mais abstratas do Universo.

 

 

6.1.2.3. Cosmologias mitológicas.

            Nestas cosmologias, que poderiam ser chamadas de cosmologias de segunda geração, numa linguagem mais moderna, os espíritos cederam lugar aos deuses e deusas. A mágica evoluiu para o mito. É a idade da mitologia.

           Estas cosmologias podem, de uma certa forma, serem chamadas de pré-científicas, uma vez que procuravam responder às perguntas de quando, como, de onde e porque o Universo surgiu. Havia, nestas cosmologias, uma mistura de mitos com visões do mundo, mas o mais importante de tudo é que nessas cosmologias já se verificam as primeiras tentativas que se conhece de explicar o Universo através do pensamento sistemático.

            Assim, a cerca de 5.000 anos atrás (cerca de 3.000 a.C.), os babilônios, na antiga Mesopotâmia, e que já conheciam a tecnologia do estanho, explicavam o mundo como sendo um disco plano, coberto por uma abóbada desse metal, a qual Enlil, o deus supremo, abria e fechava, propiciando assim o dia e a noite. A figura 1 mostra tal concepção.

 

Figura 6.1. Concepção babilônica do mundo.

 

            Mais ou menos pela mesma época, os egípcios, no baixo Nilo (nordeste da África), concebiam o mundo como sendo formado por deuses, sendo os primeiros Geb (Terra) e Nut (Céu); da união de Geb e Nut teria nascido Shu (Ar). Sobre as costas de Nut navegavam as barcas de Rá (o Sol) e dos outros astros. A figura 2 ilustra esta concepção.

 

Figura 6.2. Concepção egípcia do mundo.

 

            Mais ou menos a 3.000 anos atrás, por volta de 1.000 a.C., na Grécia, a mitologia grega concebia o Universo de uma forma muito semelhante à concepção dos babilônios, mas com a diferença que a abóbada era de vidro, uma vez que os gregos já possuíam a tecnologia  do vidro, que por sua vez, lhes fora passada pelos fenícios. O disco da Terra repousava num enorme oceano, nas bordas do qual se encontrava o fim do mundo.

            Já na Índia, mais ou menos por esta mesma época, se concebia que a Terra estaria apoiada no casco de uma enorme tartaruga, que por sua vez se sustentava sobre quatro elefantes, que por sua vez se apoiavam em enormes serpentes que boiavam em um mar infinito. A figura 3 ilustra esta concepção.

 

Figura 6.3. Concepção indiana do mundo.

 

            Estas idéias ,para a maioria de nós, nos parecem hoje em dia absurdas mas, para os padrões da época, eram aceitáveis, devido as limitações então existentes.

            Nestes tempos, entretanto, a preocupação desses povos não era somente em explicar o mundo que percebiam. Assim, a cerca de 4.000 anos atrás, os feiticeiros babilônicos já haviam dividido o céu e começado a compilar os primeiros catálogos de estrelas, bem como a registrar os movimentos do Sol, da Lua e dos cinco planetas. Com seus estudos, se tornaram aptos a prever eclipses (do Sol e da Lua) bem como preparar calendários, que previam as estações do ano (fato muito importante para a agricultura) assim como as fases da Lua. De forma semelhante, outros povos antigos também começaram a estudar os céus, como os egípcios, os gregos e, no oriente, os indianos e os chineses.


6.1.2.4. Cosmologias filosóficas.

            Essas cosmologias, que surgiram na Grécia, a partir do século VI a.C., já poderiam ser chamadas de cosmologias pré-científicas e, com uma boa dose de boa vontade, até de cosmologias científicas, se considerarmos o termo "ciência" numa acepção mais ampla do que a atual.

            Tais cosmologias surgiram devido ao salto extraordinário dado pela humanidade no século VI a.C., com o surgimento da filosofia e da ciência gregas em plena era mitológica.

            Diferentemente dos babilônicos, cujos sábios eram sacerdotes e profetas, excelentes em representação simbólica e manipulação aritmética, os sábios gregos eram filósofos e cientistas, excelentes em geometria e representação dos objetos por analogias e simetrias. Por isso pode-se afirmar que na antiga Grécia é que se encontra a base da ciência ocidental.

            Assim, por volta do século VI a.C., com o desenvolvimento da geometria e da matemática, começaram a surgir visões menos fantásticas do Universo como um todo e da Terra em particular.

            Desta forma, em aproximadamente 600 a.C., Anaximandro (611-547 a.C.), filósofo grego, propôs ser a Terra um disco imerso no ar, circundado por capas esféricas de fogo. Passagens cilíndricas até as capas de fogo propiciavam a visão dos astros. A figura 4 retrata esta concepção.

 

 

Figura 6.4. Concepção do Universo, segundo Anaximandro.

            Mais ou menos em 560 a.C., Pitágoras (592-510 a.C.), o grande matemático grego, afirmou que a Terra era um corpo em órbita, tal qual todos os outros astros do céu. Seu Universo era geometricamente harmonioso, governado por leis matemáticas. Esferas, círculos e movimentos vorticosos eram básicos na sua concepção do Universo. Sua teoria também foi sustentada por seu discípulo Filolau (?-? a.C.). A figura 5 mostra a concepção pitagórica do Universo.

 

Figura 6.5. Concepção pitagórica do Universo.

 

            Na época de Platão (427-367 a.C.), mais ou menos no século IV a.C., havia surgido e se tornado popular o chamado "universo de duas esferas". Este universo consistia em uma Terra esférica, no centro do universo, cercada por uma esfera extrema de estrelas, com os planetas (inclusive o Sol e a Lua) se movendo em caminhos não determinados entre as duas esferas. Platão teria então proposto a seus discípulos o seguinte problema: "quais são os caminhos uniformes e ordenados dos planetas?" (os antigos gregos incluíam o Sol e a Lua entre os planetas). A figura 6 mostra a concepção do universo de duas esferas.

 

 

Figura 6.6. O universo de duas esferas.

 

6.1.2.5. Cosmologias científicas.

            Por volta de 400 a.C., Eudóxio, ou Eudoxos (408-355 a.C.), discípulo de Platão, teria dado a primeira grande resposta a esta pergunta.

            O universo, disse ele, pode ser representado por uma Terra esférica, colocada no centro do mesmo, cercada por esferas concêntricas e gigantes. A esfera mais externa gira diariamente em torno de um eixo e suporta as estrelas, enquanto que as esferas intermediárias giram com velocidades diferentes em torno de diferentes eixos inclinados em relação ao eixo da esfera das estrelas e suportam os planetas. Já se nota aqui uma cosmologia antropocêntrica, com o universo centrado na Terra. A figura 7 mostra a concepção de Eudóxio do universo.

            Para explicar os movimentos retrógrados dos planetas, o modelo de Eudóxio propunha que a órbita circular de cada planeta estava fixada sobre uma esfera, a qual tinha liberdade de girar. Cada esfera, transportando um determinado planeta, estava ligada pelos pólos a uma esfera secundária concêntrica exterior, que girava sobre um eixo diferente. Essa segunda esfera, por sua vez, estava ligada a uma terceira esfera, caso fosse necessário, e assim por diante. Dessa forma, para cada esfera planetária, havia diversas esferas não planetárias, e a trajetória de um planeta, vista da Terra, seria consideravelmente mais complexa do que a que seria possibilitada por uma única esfera.

Figura 6.7. O universo de Eudóxio.

 

            Assim, incluindo um número suficiente de esferas concêntricas giratórias, num total de 33 esferas, Eudóxio conseguiu explicar os movimentos aparentes dos planetas dentro dos limites de precisão possíveis de serem atingidos na época.

            O trabalho de Eudóxio foi realmente um marco, uma vez que pode ser considerado o primeiro no campo da astronomia científica. As especulações filosóficas deixariam de Ter significação na astronomia.

            Aristóteles (384 - 322 a.C.) , o último dos grandes filósofos especulativos a contribuir para a cosmologia, deu início a um verdadeiro modelo físico para o universo. Além de idealizar um esquema que permitia que as esferas de Eudóxio girassem tão bem na prática quanto na teoria, introduziu um ente físico como sustentáculo das órbitas; o cristal.

            Desta forma, além de considerar que as esferas de Eudóxio eram de cristal, introduziu em torno de cada esfera giratória não planetária de Eudóxio, mais uma esfera (também de cristal), o que elevou o número de esferas a um total de 55.

            Assim, no esquema de Aristóteles, a Terra, esférica, estava fixa no centro do universo e era cercada por nove esferas concêntricas transparentes (de cristal) principais, nas quais se localizavam respectivamente a Lua, Mercúrio, Vênus, o Sol, Marte, Júpiter, Saturno e as estrelas fixas, bem como uma esfera mais exterior, fixa, que Aristóteles entendia como sendo a esfera de Deus, que fazia as interiores girarem. A figura 8 mostra a concepção de Aristóteles para o universo.

Figura 6.8. O universo de Aristóteles.

            Apolônio (?-? a.C.), discípulo de Aristóteles, para corrigir pequenos desvios observados nas trajetórias dos planetas, inventou a teoria dos epiciclos para, segundo alguns autores, substituir as esferas concêntricas de Eudóxio e Aristóteles e, segundo outros, para aperfeiçoá-las. De qualquer modo, segundo Apolônio, cada planeta girava em torno de um ponto fixo na esfera planetária, em cima de uma órbita circular, ao mesmo tempo em que a esfera planetária associada girava em torno da Terra. A figura 9 mostra, de forma simplificada, a teoria de Apolônio para os epiciclos. Cada planeta teria um sistema próprio de epiciclos semelhante.

 

Figura 6.9. Teoria de Apolônio, para os epiciclos.

            Por volta de 240 a.C., Eratóstenes (276-193 a.C.) calculou a circunferência da Terra, e portanto o seu diâmetro, utilizando-se das medidas dos diferentes comprimentos da sombra ao meio dia em dois lugares separados entre si, mas aproximadamente no mesmo meridiano. A figura 10 mostra o esquema básico utilizado por Eratóstenes para calcular a circunferência (e daí o diâmetro) da Terra.

 

 

Figura 6.10. Esquema do método utilizado por Eratóstenes para calcular  a circunferência da Terra.

 

            A distância medida por Eratóstenes foi da ordem de 5.000 estádios e, apesar de não se conhecer com precisão o valor do estádio, aparentemente o mesmo era da ordem de uns 150 a 160 m, o que acarreta para a circunferência da Terra um valor de uns 39.000 km, valor este menos de 3% diferente do valor atualmente aceito, que é da ordem de 40.000 km.

            Apesar de não haver apresentado nenhum melhoramento com relação aos modelos cosmológicos da época, a importância do feito de Eratóstenes foi provar que a Terra era realmente uma esfera e, além disso, determinar o tamanho dessa esfera.

            Mais ou menos na mesma época, um gênio da antiga Grécia, Aristarco de Samos (310-230 a.C.), propôs uma teoria heliocêntrica, na qual defendia que o centro do universo era o Sol e que todos os planetas, inclusive a Terra, giravam em órbitas circulares em torno dele. Este modelo, entretanto, ainda retinha a idéia da esfera das estrelas fixas. Neste modelo a Terra, além de girar em torno do Sol, no intervalo de um ano, também girava em torno de seu eixo, em 24 horas, produzindo assim os dias e as noites.

            A teoria de Aristarco era muito radical para a época, apesar de ser muito mais simples que a teoria de Aristóteles ou a de Apolônio. Por isso os outros filósofos relutaram em aceitá-la e assim a teoria de Aristarco foi abandonada e só foi retomada uns 1.800 anos mais tarde por Copérnico, como veremos.

            Algumas décadas depois, mais ou menos pelo ano 200 a.C., um outro notável astrônomo da antigüidade, Hiparco (?-? a.C.), além de catalogar as estrelas e de melhorar em muito a precisão das medidas da época, através de instrumentos por ele mesmo inventados e/ou aperfeiçoados, também descobriu o fenômeno da precessão dos equinócios. Da mesma forma que Eratóstenes, o trabalho de Hiparco foi muito importante, apesar de não ter apresentado nenhum novo modelo para o universo, ou aperfeiçoado algum dos já existentes.

            Finalmente, alguns séculos mais tarde, por volta do século II d.C. Ptolomeu de Alexandria (90-160 d.C.), corrigindo os trabalhos de Aristóteles e de Apolônio, introduziu uma cosmologia geocêntrica que perdurou, sem sérias ameaças, durante quatorze séculos. Um dos principais problemas da cosmologia de Aristóteles era de que a mesma não conseguia explicar as variações nos brilhos aparentes dos planetas. A interpretação mais óbvia era que os planetas pareciam se aproximar e recuar em relação à Terra, ao invés de permanecerem em esferas fixas. Esta interpretação também parecia ser verdadeira para a Lua, que se coloca entre o Sol e a Terra, provocando eclipses do Sol; alguns eclipses do Sol são totais, enquanto que outros são parciais, porque a distância entre a Terra e a Lua varia. O objetivo de Ptolomeu era "mostrar que os fenômenos celestes se repetem através de movimentos circulares uniformes.".

            Ptolomeu conseguiu atingir o seu objetivo imaginando que o Sol se movia em torno da Terra, que permanecia fixa no centro do universo, sobre uma grande roda. Cada planeta, por sua vez, estava fixado sobre uma roda menor, ou maior, conforme o planeta. Para explicar os movimentos dos planetas, Ptolomeu valeu-se da idéia de epiciclos introduzida por Apolônio e a aperfeiçoou bastante. Assim, Ptolomeu introduziu epiciclos em cima de epiciclos, como forma para explicar os movimentos aparentes dos planetas. A figura 11(a) ilustra os princípios básicos da teoria de Ptolomeu, enquanto que a 11(b) mostra o conceito de vários epiciclos. Ao todo, Ptolomeu utilizava 39 rodas para explicar a sua teoria. Como tal sistema explicava razoavelmente bem os movimentos observados, segundo a precisão das observações da época, foi o sistema que se tornou preponderante por mais de 1.400 anos. Mesmo depois de Ptolomeu, outros filósofos propuseram novas teorias que não obtiveram sucesso. A tabela 1, a seguir, sumariza os grandes cosmólogos da antigüidade.

 

Figura 6.11. (a) Princípio da teoria geocêntrica de Ptolomeu. (b) Epiciclos.

 

Nome

Contribuição

Pitágoras

(580-500 a.C.)

Terra esférica giratória, orbitando em torno de um fogo central.

Platão

(427-367 a.C.)

Planetas em órbitas circulares, em torno da Terra estacionária.

Eudóxio

(408-355 a.C.)

Modelo matemático dos movimentos dos corpos celestes, com 33 esferas concêntricas girando em torno da Terra estacionária.

Aristóteles

(384-322 a.C.)

Um complicado modelo de funcionamento, com 55 esferas concêntricas, imutabilidade do firmamento.

Aristarco

(310-230 a.C.)

Sistema heliocêntrico: Terra giratória e Terra e planetas girando em torno do Sol.

Ptolomeu

(90-160 d.C.)

Sistema geocêntrico; aperfeiçoou a teoria dos epiciclos.

 

Tabela 6.1. Os principais cosmólogos da antigüidade e suas contribuições.

            O sistema de Ptolomeu foi a última grande realização da ciência grega (que já possuía muitas características da ciência moderna), que floresceu por 700 anos. Deve-se, entretanto, ressaltar que o universo aristotélico, concebido por  Ptolomeu, não incorporava muitas das realizações da ciência grega da época:

            ð recusava a noção de um universo atomista e sem limites.

            ð recusava a sugestão de Demócrito, segundo a qual a Via Láctea era um aglomerado de estrelas

            ð recusava a proposta de que a Terra girava diariamente em torno do seu eixo.

            ð recusava a proposta de Aristarco segundo a qual a Terra giraria diariamente em torno do seu eixo e anualmente em torno do Sol.

            Com a queda do império romano, no século V d.C., a ignorância baixou sobre a Europa e toda a especulação filosófica (e científica) foi praticamente extinta pelos bárbaros, cuja linguagem, em princípio não podia acompanhar os conceitos do mundo greco-romano.

            Já no início da Idade Média o universo havia sido novamente revertido a polarização mitológica entre céu e inferno, com a Terra sendo novamente um tabernáculo plano, retangular, cercado por um abismo aquático.

            Entretanto, mesmo nesta época, alguns escolásticos, como Boécio e Bede, estavam cientes da ciência grega, através dos comentários latinos de Cícero, Plínio e outros.

            Enquanto a Europa estava em seu nível mais baixo de ignorância, o que restara do antigo conhecimento havia sobrevivido principalmente em Bizâncio, Síria e Pérsia.

            Com a ascensão do Islão, no século VII d.C., os árabes criaram um grande império que se estendia da Índia ao Atlântico e no qual as artes e as ciências novamente floresceram. Os escolásticos emigraram para Damasco, Bagdá, Córdoba e outros centros da nova civilização.

            Em meados do século XI a idade negra (período compreendido entre o início da idade média e o final do século XI) havia começado a terminar, devido ao surgimento de novas idéias, tal como a forte crença de que era necessário entender a fim de acreditar.

            Surgiram então as escolas e universidades e nos séculos XII e XIII, durante o declínio do Império Islâmico (apressado no século XIV pela invasão mongol), os trabalhos de Aristóteles, Euclides, Arquimedes, Ptolomeu e muitos outros do mundo antigo foram traduzidos para o latim, primeiramente a partir do árabe e depois diretamente do grego.

            São Tomás de Aquino, no século XIII, mostrou como o cristianismo poderia ser compatibilizado com o universo aristotélico, com modificações relativamente pequenas. Os seres humanos retiveram a imortalidade da alma, mas o universo adotado perdeu a eternidade, uma vez que havia sido criado por Deus.

            Por volta do século XIV o universo medieval tinha atingido o seu ápice. Era totalmente antropocêntrico, santificado pela religião, sancionado pela filosofia e racionalizado pela ciência. Foi talvez a forma de cosmologia mais satisfatória até hoje conhecida na história. Nunca antes ou até então tinha a cosmologia servido de modo tão notável às necessidades quotidianas das pessoas comuns. Era, simultaneamente, sua religião, sua filosofia e sua ciência.

6.1.3. As origens da moderna Cosmologia científica.

            Apesar do conforto espiritual que a cosmologia do século XIV trazia para as pessoas de um modo geral, por parte de certos pensadores algumas críticas ou mesmo insatisfações começaram a surgir em relação à física de Aristóteles e à astronomia (cosmologia) de Ptolomeu.

           Assim o monge franciscano Roger Bacon (1214-1294) enfatizou que o método científico de se obter o conhecimento consistia em se fazer observações, usar matemática e testar os resultados das previsões feitas através de experiências, e não na leitura dos velhos textos. Colocado desta forma podemos, portanto, admitir que em Bacon se encontra, senão a origem das idéias modernas do método científico, pelo menos a sua explicitação clara.

           Da mesma forma, no século XIV, o bispo Nicolau de Oresme (?-?) afirmava que o movimento só pode ser percebido quando um corpo altera sua posição em relação a outro. Ele também recusava a velha argumentação de que a Terra não podia girar e mostrou que a teoria de Heráclides simplificava enormemente a estrutura dos céus.

           Com a descoberta de certos textos atomistas no século XV, começou a fermentar na Europa uma revolução científica, que se iniciou com críticas a finitude e ao centro do universo. Assim a extremidade cósmica já havia intrigado Lucrécio (97-55 a.C.), poeta latino, que escreveu "é um fato observado que uma coisa é limitada por outra. O mar limita a terra e as terras limitam o mar.". Para os que acreditavam na finitude do universo, propôs  o  seguinte  enigma: “o que acontece quando uma lança é atirada através da extremidade cósmica?".

           De forma semelhante o cardeal Nicolau de Cusa (1401-1464) entendia que sendo o universo uma criação de Deus, que era infinito e não localizado, também deveria ser não limitado, sem fim e sem centro.

           Neste ponto chegamos ao que se pode chamar de o nascimento da cosmologia renascentista, que já é, sem sombra de dúvida, o que se pode chamar de uma cosmologia científica.

           O primeiro artífice dessa cosmologia foi Nicolau Copérnico (1473-1543), já no século XVI. Assim, em 1543, ano de sua morte, é publicado o livro "De Revolutionibus Orbium Coelestium" (Das Revoluções das Esferas Celestes) onde Copérnico, cristalizando as tendências do pensamento astronômico da época, que já tinha sido antecipado pela ciência grega a quase 2.000 anos atrás, propõe um universo heliocêntrico. A figura 12 mostra, de forma esquemática, a concepção básica do universo de Copérnico.

           Copérnico conseguiu mostrar que o movimento dos planetas, bem como da Terra, em torno do Sol, assim como o movimento da Lua em torno da Terra, que por sua vez girava, dando uma volta sobre seu eixo em 24 horas, proporcionava uma explicação mais simples e elegante para os movimentos observados. Copérnico, como é natural, não conseguiu se livrar de todos os preconceitos de seu tempo. Assim, o universo copernicano, com o Sol no seu centro, possuía órbitas circulares e era finito em tamanho, uma vez que Copérnico reteve o conceito de esfera das estrelas fixas.


 

Figura 6.12. A concepção básica do universo de Copérnico.

            A crença em órbitas circulares forçou Copérnico a manter alguns dos epiciclos de Ptolomeu, para explicar os movimentos aparentes dos planetas. Entretanto, o sistema heliocêntrico explicava de forma muito mais satisfatória os aspectos mais óbvios dos movimentos dos planetas do que o sistema ptolomaico, de forma que, apesar das dificuldades, começou a ganhar força após a sua publicação.

            Digges (1564-1595) fez uma importante contribuição ao sistema de Copérnico e que consistiu em remover a esfera das estrelas fixas e dispersar as estrelas através de um espaço ilimitado.

            Giordano Bruno (1548-1600), ciente dos trabalhos de Copérnico e de Digges e influenciado por Lucrécio, espalhou os novos conceitos pela Europa, pagando com a vida por tal ato.

            O próximo grande avanço surgiu como resultado dos trabalhos de Tycho Brahe (1546-1601). Embora ele se recusasse a aceitar o sistema de Copérnico, realizou as mais precisas medições astronômicas até então, medições estas imbatíveis até hoje se feitas sem o auxílio de telescópios.

            A principal contribuição de Tycho para a cosmologia, afora as medidas precisas, foi demonstrar que os cometas estavam muito mais distantes do que a Lua (ao contrário do que se acreditava na época) e que descreviam órbitas bastante alongadas. Esta descoberta lançou muito descrédito sobre a noção aristotélica de esferas celestes fixas, permanentes e sólidas.

            O grande passo seguinte foi levado a cabo por Johannes Kepler (1570-1630), assistente de Tycho. Baseando-se nas minuciosas observações de Brahe, principalmente nas referentes ao movimento do planeta Marte, Kepler descobriu que os planetas se movem na verdade em órbitas elípticas, com o Sol ocupando um dos focos da elipse (primeira lei de Kepler). A outra descoberta de Kepler, que na verdade, cronologicamente, foi a primeira, e que hoje  é considerada como sendo a segunda lei de Kepler, é que os planetas aumentam de velocidade quando se aproximam do Sol e diminuem quando dele se afastam. Kepler demonstrou que essa mudança de velocidade correspondia a uma linha imaginária unindo o Sol ao planeta e que cobria áreas iguais, dentro da elipse, em tempos iguais.

            Seu último grande feito, atualmente expresso como sendo a terceira lei de Kepler, é que o quadrado do período orbital de cada planeta é proporcional ao cubo de sua distância média ao Sol.

            Afora as enormes contribuições que fez para a cosmologia, Kepler conseguiu também libertar o sistema solar dos grilhões da teoria dos epiciclos. A figura 13 mostra, de forma esquemática, as três leis de Kepler.

Figura 6.13 As três leis de Kepler.

(a) Lei das órbitas (lei das elipses). (b) Lei das áreas (c) Lei dos períodos (lei harmônica)

            Até este estágio a teoria heliocêntrica era vista apenas como um modelo eficiente para explicar o funcionamento do céu. Não se acreditava, de um modo geral, que ela tivesse realidade física e a Terra ainda não havia sido destronada de seu lugar no centro do universo físico. Entretanto, no decorrer do século XVII, a cosmologia heliocêntrica paulatinamente passou a ganhar aceitação total. Galileu Galilei (1564-1642) foi o pioneiro desse avanço científico, pois estabeleceu firmemente as bases do método científico além de inovar métodos de observação e experimentação. Galileu também utilizou o telescópio, que havia sido inventado pelo holandês Hans Lippershey (1587-1619), para identificar os quatro grandes satélites de Júpiter, o que possibilitou uma analogia com o sistema Terra - Lua e outros corpos celestes. A descoberta das fases de Vênus ajudou a demonstrar que Vênus se move em torno do Sol e a descoberta das manchas solares ajudou finalmente a por abaixo a doutrina aristotélica da imutabilidade dos céus.

            Além disso, Galileu demonstrou que a mancha esbranquiçada que constitui a Via Láctea, quando vista por um telescópio, se mostrou ser uma miríade de estrelas, muito fracas para que o olho humano pudesse as resolver individualmente.

            O próprio Galileu não deu uma grande contribuição para a cosmologia em si, mas suas descobertas abriram o caminho para que outros as seguissem.

            Foi com Isaac Newton (1642-1727), que proporcionou uma nova percepção dos movimentos planetários, que a cosmologia finalmente se transformou numa ciência moderna. Considerando a força necessária para manter a Lua em sua órbita com aquela necessária para que um corpo caísse na superfície da Terra, quando solto livremente um pouco acima desta, Newton demonstrou que a força de atração gravitacional entre dois corpos variava inversamente ao quadrado da distância entre eles  e que era proporcional ao produto de suas massas. Desta forma Newton juntou, num único arcabouço teórico, tanto a mecânica terrestre quanto a mecânica celeste. Mais ainda, com as três leis do movimento e a lei da gravitação universal, todas descobertas por ele, Newton foi capaz de deduzir matematicamente as três leis de Kepler para o movimento planetário. 

            Newton também generalizou as suas leis, de modo a explicar a interação gravitacional entre quaisquer pares de partículas no universo.

            A universalidade da lei da gravitação de Newton foi finalmente firmemente estabelecida no século XVIII por William Herschel (1738-1822) que descobriu que estrelas binárias, orbitando uma em torno da outra, obedeciam a mesma lei de gravitação que os planetas do sistema solar. A descoberta do planeta Urano tornou Herschel famoso mas sua maior contribuição à cosmologia foi o fato de ele ter observado as manchas de luz difusas ou nebulosas.

            Herschel, com grande intuição, considerou estas nebulosas como "universos isolados", proposição esta já anteriormente apresentada por Thomas Wright (1711-1786) e Emmanuel Kant (1724-1804), entre outros. Foram as observações de  Herschel, entretanto, que transformaram a astronomia extragaláctica num ramo independente da astronomia. Além disso Herschel também defendeu a idéia de que a Via Láctea era também um universo ilha isolado, em forma de disco, com o Sol ocupando uma posição central.

            A tabela 2 a seguir sumariza as contribuições dadas pelos cosmólogos do renascimento.

Nome

Contribuição

Nicolau Copérnico

(1473-1543)

Cosmologia heliocêntrica

Tycho Brahe

(1546-1601)

Observações astronômicas precisas

Johannes Kepler

(1570-1630)

Leis dos movimentos planetários

Galileu Galilei

(1564-1642)

Descoberta dos satélites de Júpiter, das fases de Vênus e das manchas solares.

Isaac Newton

(1642-1727)

Leis do movimento e da gravitação universal. Unificação da mecânica terrestre com a mecânica celeste.

William Herschel

(1738-1822)

Descoberta de Urano. Observação das nebulosas. Teoria sobre a Via Láctea

 

Tabela 6.2. Principais cosmólogos do renascimento e suas contribuições.

6.1.4. A moderna cosmologia científica

            Com o avanço da revolução científica que se iniciou no século XVI com Copérnico e seguiu adiante com os trabalhos de outros cientistas, já citados brevemente no item anterior, a física teve um grande avanço. Como vimos, a revolução científica pulverizou o antigo cosmos e lançou seus fragmentos no espaço infinito. Entretanto, com o avanço da física um fato paradoxal ocorreu. A necessidade de se ter uma cosmologia desapareceu. Em outras palavras, a física parecia não necessitar de uma cosmologia.

            Assim, por volta do século XIX, que foi o grande século do avanço da física, muitos cientistas começaram a perceber que a cosmologia não somente era inútil para a física, como também, o que era pior, era incompatível com as grandes leis da física clássica. Este fato importante e indiscutível era ilustrado pelo paradoxo de Olbers: "Se o universo é homogêneo e infinito, então um raciocínio geométrico simples mostra que o  céu, todo, deveria ser, no mínimo, tão brilhante quanto a superfície de uma estrela.". Colocado em outras palavras, a noite deveria ser tão brilhante como o dia. Como isto não é o caso, a física clássica não somente não necessitava da cosmologia como de um certo modo a rejeitava (como veremos, na teoria da relatividade geral, não existe o paradoxo de Olbers, bem como alguns outros paradoxos não citados).

            Entretanto, com a publicação, em 1916, da Teoria Geral da Relatividade por Albert Einstein (1879-1955), tal cenário se modificou. Isto porque uma certa necessidade lógica interna da teoria conduziu Einstein a recolocar novamente o problema cosmológico.

            O primeiro modelo cosmológico da nova teoria foi o universo estático de Einstein, obtido por este ao resolver as equações de sua teoria. Para isto, Einstein teve que incluir, de uma forma arbitrária, um novo termo nas suas equações, termo este que recebeu o nome de constante cosmológica. Einstein foi obrigado a fazer isso porque, na época, se acreditava que o universo era estático. Entretanto, os dias de um universo estático estavam contados.

            No final da década de 20 o grande astrônomo observador Edwin Hubble (1889-1953), utilizando-se de técnicas refinadas, conseguiu medir a distância para as galáxias próximas, bem como a sua velocidade de movimento em relação à Via Láctea. Hubble descobriu que as galáxias distantes (não pertencentes ao chamado atualmente grupo local) sistematicamente se afastavam da Via Láctea e que a velocidade com que se afastavam era diretamente proporcional a distância, isto é, quanto mais distantes, maior a velocidade de afastamento. Este fenômeno veio a se constituir na chamada Lei de Hubble. Desta forma se constatou que o universo se expandia e portanto não se tornava necessário, nas equações da TGR, a constante cosmológica.

            Em 1922 Alexander Friedmann (1888-1925) e em 1927 Georges Lemaitre (1894-1966), trabalhando de forma independente, resolveram as equações da TGR sem a constante cosmológica e obtiveram um universo em expansão. É importante se notar que isto ocorreu antes que Hubble tivesse publicado os resultados de seus estudos e que Friedmann e Lemaitre não conheciam os trabalhos de Hubble. Desta forma, a teoria de um universo em expansão teve um caráter preditivo, que foi mais tarde confirmado observacionalmente. Assim pode-se afirmar que ambos, tanto Friedmann quanto Lemaitre foram os criadores da Teoria da Grande Explosão (TGE), conhecida por seu nome em inglês, Big Bang.

            Em 1932, Einstein e um astrônomo holandês Willem De Sitter desenvolveram também uma cosmologia expansionista. Este modelo ficou conhecido como o universo de Einstein - De Sitter.

            A partir daí outros modelos foram criados, quase todos eles incorporando uma grande explosão como sendo o início do universo, bem como alguns poucos em que isto não acontecia. Entre estes últimos um que merece nota é o chamado modelo do Estado Estacionário. Este modelo foi desenvolvido por Hoyle, Gold e Bondi e hoje em dia está praticamente descartado.

            A tabela 3 sumariza as contribuições dadas pelos principais cosmólogos dos tempos modernos.

Nome

Contribuição

Albert Einstein

(1879-1955)

Teoria Geral da Relatividade. Modelo estático de universo. Modelo expansionista do universo (junto com De Sitter)

Willem De Sitter

(1872-1935)

Modelo estático de universo (vazio). Modelo expansionista de universo (junto com Einstein).

Alexander Friedmann

(1888-1925)

Primeiro modelo de universo expansionista. Criador da TGE.

Georges Lemaitre

(1894-1966)

idem.

Edwin Hubble

(1889-1953)

Determinação das distâncias até as galáxias. Descoberta observacional da expansão do universo.

 

Tabela 6.3. Principais cosmólogos dos tempos modernos e suas contribuições.

 

6.1.5 Os pontos cruciais da cosmologia moderna.

            Como veremos, a Teoria da Grande Explosão, a TGE, é a teoria mais aceita pela maioria dos cosmólogos atuais, senão em sua forma original, pelo menos em sua forma geral. A Teoria do Universo Inflacionário (TUI) atualmente está se impondo de forma bastante vigorosa, mas esta teoria nada mais é do que um aperfeiçoamento da TGE, já que explica, de uma forma menos restritiva, alguns aspectos não explicados satisfatoriamente pela TGE original, de forma que se pode dizer que a TUI é, de certa forma, uma TGE.

            Dentro do que melhor se conhece atualmente pode-se esperar para o futuro que o desenvolvimento da cosmologia irá, provavelmente, se dirigir no sentido de esclarecer cada vez mais a TGE, sendo pouco provável, mas não impossível, que nos desviemos drasticamente de tal caminho.

            De qualquer forma, existem hoje em dia alguns pontos cruciais que devem ser respondidos e praticamente toda a pesquisa atual se concentra na procura de tais respostas. Estes pontos são:

 

            ð O instante inicial.

            A singularidade transcende os limites da física atual.

            ð Teoria sobre a formação das galáxias.

            Ainda falta uma teoria totalmente satisfatória para explicar a formação das galáxias. As galáxias se formaram antes do que as primeiras estrela ou ocorreu o contrário?

            ð Condições do estado inicial.

            O estado inicial foi irregular e caótico ou foi regular e ordenado?

            ð Condições da expansão.

            A expansão inicial foi isotrópica ou foi anisotrópica e a distribuição da matéria foi homogênea ou não homogênea?

 

            ð Tamanho do universo.

            O universo é finito ou infinito?

 

            ð Futuro do universo.

            O universo se expandirá para sempre ou um dia chegará em que a expansão se deterá e o universo começará a implodir?

6.2. Fatos observacionais e princípios cosmológicos

6.2.1 Introdução

            Vimos, no parágrafo anterior, como as idéias sobre a origem e evolução do nosso Universo surgiram, no decorrer da história da humanidade, entre os diversos povos.

            Neste e no próximo item veremos, de forma sucinta e simplificada, os principais aspectos da moderna cosmologia científica.

            Procuraremos apresentar os principais fatos observacionais obtidos pela moderna astronomia. Também apresentaremos os princípios cosmológicos, que podem ser inferidos destes fatos.

            A seguir apresentaremos a idéia básica da cosmologia da Grande Explosão (Big Bang em inglês) e veremos que a mesma é, atualmente, a que melhor explica os fatos observacionais.

            Finalmente teceremos alguns breves comentários sobre a cosmologia do Universo Inflacionário que, atualmente se encontra em grande evolução e que engloba a teoria da Grande Explosão.

6.2.2 Fatos observacionais.

            O Universo, quando observado em larga escala, apresenta algumas características importantes. Entre elas, temos:

 

1. Homogeneidade.

 

            O Universo, quando observado em larga escala, se apresenta homogêneo, isto é, em todas as partes, em escala suficientemente ampla, a densidade da matéria é aproximadamente constante.

            Isto é obtido pelo estudo sistemático de um grande número de galáxias, visíveis em chapas fotográficas (modernamente, através de sistemas com câmeras eletrônicas, com os sinais resultantes gravados em computadores digitais). Este estudo revela que a freqüência de ocorrência das galáxias é praticamente a mesma em qualquer direção que se observe.

            De forma simplificada, a figura 14 mostra o que se observa em qualquer direção em que se observe enquanto que a figura 15 (a) mostra o que se observaria, por exemplo, em uma determinada direção e a figura 15 (b) o que se observaria em uma outra direção, caso o universo não fosse homogêneo.

 

 

Figura 6.14. Aparência da distribuição das galáxias no espaço quando se observa em qualquer direção.

 

 

Figura 6.15. Aparência de um universo não homogêneo.

(a) Observando numa direção. (b) Observando em outra direção.

            Obviamente, em pequena escala, o universo é claramente não homogêneo, já que a matéria não se distribui uniformemente entre o Sol e os planetas, por exemplo. A explicação de porque o universo é homogêneo em grande escala, mas não o é em pequena escala é um dos problemas da cosmologia.

 

2. Isotropia.

 

            Em larga escala o universo se apresenta isótropo, isto é, em todas as direções que observarmos o Universo tem aproximadamente a mesma aparência.

            Isto quer dizer que não se encontra preponderância de um tipo de estrutura, por exemplo, galáxias elípticas, em uma determinada direção em detrimento de outras.

            Assim, de forma simplificada, a figura 16 (a) mostra o que se observa, por exemplo, em uma determinada direção, enquanto que a figura 16 (b) mostra o que se observa na direção diametralmente oposta. Praticamente se observa a mesma estrutura básica. Já a figura 17 (a) mostra o que se veria numa determinada direção e a 17 (b) o que se veria numa outra direção qualquer, caso o universo não fosse isotrópico.

            Da mesma forma que para a homogeneidade, a isotropia só é perceptível em grande escala. Em pequena escala o universo é altamente anisotrópico.

 

Figura 6.16. Isotropia do universo.

(a) Aparência do universo quando observado em larga escala em uma determinada direção.

(b) Idem quando observado em outra direção.

 

 

Figura 6.17. Aparência de um universo anisotrópico.

(a) Observando numa direção.

(b) Observando em outra direção.

 

            Estes dois fatos, em conjunto, traduzem o chamado princípio cosmológico, que é a hipótese básica de trabalho de toda a moderna Cosmologia. Este princípio pode ser enunciado de uma forma simples como segue:

            "Nossa amostra local do Universo em nada difere  de qualquer outra  das regiões mais distantes e inacessíveis."

            Ao lado destes dois fatos observacionais, existem ainda dois outros fatos observacionais muito importantes nas concepções cosmológicas atuais. São eles:

            ð a expansão do Universo.

            ð a radiação cósmica de fundo.

            Estes dois fatos, como veremos, são o principal sustentáculo da teoria do Big Bang e são fatos que qualquer teoria alternativa necessariamente têm que explicar para não ser descartada desde o início.

            3. A Expansão do Universo.

            Na década de 20, o astrônomo norte-americano Edwin Hubble observou que as galáxias distantes se afastavam da nossa com velocidades tanto maiores quanto maiores eram as suas distâncias.

            Este fato permitiu que ele estabelecesse a lei que hoje toma o seu nome:

v = H . r

            onde: v = velocidade de recessão (km/s)

                        H = constante de Hubble  (km/(s.Mpc))

                        r = distância da galáxia (Mpc)

            Nesta expressão, v pode ser determinado com grande precisão.  Já o mesmo não pode ser feito com r, o que implica que mesmo hoje em dia, o valor de H não é conhecido com grande precisão. O valor mais aceito hoje em dia se situa na faixa de 50 a 100 km/(s.Mpc).

            A figura 18 ilustra, de forma simplificada este fato.

            Neste ponto uma analogia bidimensional ajuda a compreender melhor o que foi dito. Na figura 19, se admite que o universo inteiro se resume a superfície do balão (por isso a analogia é dita ser bidimensional, já que uma superfície é um espaço de duas dimensões), enquanto que as galáxias seriam as "pintas" nesta superfície. Conforme o balão é inflado, as pintas se afastam umas das outras, com velocidade tanto maior quanto maior for a distancia (medida por sobre a superfície do balão) entre elas. De qualquer pinta que se escolher se observa a mesma coisa: todas as outras pintas parecem se afastar dela, e com velocidade tanto maior quanto mais distante se encontram.

 

Figura 6.18. A lei de Hubble.

 

 

Figura 6.19. Analogia bidimensional de um universo em expansão.

 

            É importante se notar que, da mesma forma que para qualquer uma das pintas da analogia acima mostrada, a nossa galáxia não ocupa nenhuma posição privilegiada, já que todas as galáxias parecem se afastar dela.  O mesmo seria observado de qualquer galáxia em que estivéssemos.

 

            4. A Radiação Cósmica de Fundo.

 

            Esta radiação, que nada mais é do que uma radiação de microondas, que parece vir com igual intensidade de todos os pontos do Espaço, foi descoberta por acaso em 1964, por dois cientistas dos Laboratórios da Bell, nos EUA, Penzias e Wilson.

            Esta radiação é praticamente idêntica a que seria emitida por um corpo negro a temperatura de 2,7 Kelvin, e por isso é conhecida como a radiação de 3 Kelvin.

            O pico de intensidade desta radiação ocorre no comprimento de onda de radiofrequência (Lmax = 9,6 x 10-4 m, onde Lmax é o comprimento de onda em que ocorre a maior intensidade de radiação). A existência desta radiação implica que o universo deve ter sido muito mais quente do que é atualmente no passado.

            A figura 20 ilustra o fato desta radiação vir aproximadamente com a mesma intensidade de todas as direções.

Figura 6.20. A radiação cósmica de fundo.

 

            Deve-se observar que a Terra não é privilegiada. O mesmo se observaria em qualquer outro ponto do universo.

 

5. Outros aspectos observacionais.

 

            Existem ainda outros aspectos observacionais além dos anteriormente mencionados. Assim podemos citar:

            1. A idade do Universo.

            2. A abundância do Hélio e do Deutério no Universo.

            Todos estes fatos corroboram a hipótese da grande  explosão.

6.2.3. Os Princípios Cosmológicos.

            Toda a moderna Cosmologia científica relativista, que é o melhor a que o homem pode chegar até o momento, se baseia em algumas premissas básicas.

            Mais fundamentais do que as premissas adotadas na Cosmologia, não devemos nos esquecer das premissas básicas da ciência.  Assim, em ciência, se acredita que o Universo como um todo é passível de ser entendido pela mente humana. Além disso, a ciência acredita que ele é essencialmente simples. Pode-se perceber facilmente que estes princípios fundamentais da ciência são simples atos de fé.

            Voltando às premissas cosmológicas, conforme o grau de abrangência das mesmas, podemos a grosso modo destacar três:

            ð o princípio cosmológico de Copérnico.

            ð o princípio cosmológico perfeito.

            ð o princípio cosmológico antrópico.

Estes princípios podem ser colocados como segue:

           

1. O Princípio Cosmológico de Copérnico.

 

            Este princípio, que na realidade é uma extensão moderna do princípio estabelecido (não muito explicitamente) por Copérnico, afirma que "o nosso ponto de localização no Universo não difere em nada de qualquer outro ponto do Espaço".

            Com base neste princípio bem como na observação de que o Universo é bastante isotrópico, isto é, tem praticamente a mesma aparência em qualquer direção que se olhe (em larga escala), pode-se concluir que o Universo é também homogêneo, pois se não o fosse haveria alguma anisotropia.

            Assim, como conseqüência do princípio cosmológico de Copérnico, admite-se que o Universo é homogêneo e isotrópico quando visto de qualquer ponto do Espaço.

            Este princípio geral é a base para a teoria cosmológica mais aceita hoje em dia: a teoria da Grande Explosão (Big Bang).

 

2. O Princípio Cosmológico Perfeito.

 

            Este princípio, que serviu de base para a teoria do Estado Estacionário (Steady State), que hoje em dia está praticamente descartada, é bem mais restritivo do que o princípio cosmológico de Copérnico.

            Este princípio afirma que o Universo deve apresentar um aspecto semelhante, isto é, é homogêneo e isotrópico quando visto de qualquer ponto do Espaço e em qualquer instante do tempo, ou seja que o Universo é eternamente imutável.

 

3. O Princípio Cosmológico Antrópico.

 

            Este princípio advoga, em relação ao tempo, o ponto de vista  exatamente oposto ao do princípio cosmológico perfeito, uma vez que afirma que, embora o Universo atualmente pareça o mesmo quando visto de qualquer ponto do espaço, o visualizamos num tempo privilegiado.

            Essa era privilegiada é presumida em razão da necessidade do surgimento de condições especiais, favoráveis à evolução da vida. Assim, por exemplo, se o Universo fosse muito mais quente e/ou muito mais denso do que é agora, as galáxias não se formariam; ou se a força da gravidade fosse muito diferente do que o valor observado, os sistemas planetários não se formariam ou caso se formassem, seriam inadequados para a vida tal como a conhecemos.  Em resumo, o Universo poderia ser muito mais irregular e desordenado do que realmente é. O princípio cosmológico antrópico afirma que se ele o  fosse, as condições seriam inadequadas à vida.

            Dessa maneira, na qualidade de observadores, habitamos um Universo muito especial, e apenas esse Universo é homogêneo e isotrópico. 

            Apesar de não haver nenhuma teoria cosmológica que se apoie diretamente no princípio cosmológico antrópico, a argumentação antrópica, num certo sentido, é fundamental, pois procura explicar o princípio cosmológico de Copérnico que, como vimos, é básico para todas as teorias cosmológicas viáveis.

6.3. Teorias cosmológicas modernas

6.3.1. Introdução

            Neste item trataremos, de forma sucinta e simplificada, das teorias cosmológicas modernas, com ênfase na Teoria da Grande Explosão (Big Bang) que é, atualmente, a teoria mais aceita, em linhas gerais.

            Inicialmente faremos um apanhado geral sobre alguns conceitos importantes relativos a geometria do espaço.

            A seguir apresentaremos os diversos modelos cosmológicos modernos, procurando compara-los entre si. Também mencionaremos o princípio básico de uma teoria que hoje possui um interesse praticamente que só histórico, que é a Teoria do Estado Estacionário. Esta teoria foi a grande rival da teoria da Grande Explosão na década de 50.

            Com os modelos mais plausíveis, faremos considerações gerais sobre a visão cosmológica que emerge da teoria da Grande Explosão.   Finalmente, mencionaremos brevemente a chamada Teoria do Universo Inflacionário que como veremos pode ser considerada um aperfeiçoamento da teoria da Grande Explosão.

            Como veremos, existem diversos modelos de universo possíveis dentro da Teoria da Grande Explosão (TGE). No item 3.3.3 veremos os principais aspectos destes modelos. Conforme será visto, todos estes modelos se baseiam na Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein. São, por essa razão, chamados de modelos relativistas e portanto a TGE é uma teoria relativista.

            Existem, entretanto, modelos relativistas que não contemplam um início para o universo, isto é, são modelos sem uma grande explosão inicial. Estes modelos, conforme se acredita hoje em dia, são muito pouco prováveis de serem os verdadeiros, uma vez que não conseguem explicar de forma satisfatória certos fatos observacionais que são, dentro do que melhor se conhece, naturalmente explicados pelos modelos que podem ser derivados dentro da TGE. Entretanto, é bom ressaltar, improvável não quer dizer impossível. Assim é possível de que o nosso universo não tenha tido sua origem numa grande explosão, mas isso é pouco provável, em vista do que se conhece atualmente.

6.3.2 A geometria do espaço

6.3.2.1 A curvatura do espaço

            Um dos problemas fundamentais da cosmologia diz respeito a natureza do espaço. Dois dos modelos padrão do Big Bang admitem que o espaço é curvo. O que significa isto? No que se segue faremos uma tentativa para explicar estes conceitos.

            Para nós, que somos seres de três dimensões espaciais (e 1 temporal) é impossível visualizarmos um espaço curvo de três (4) dimensões.

            Para podermos ter alguma idéia de como isto pode ser, devemos nos basear em analogias, isto é, em situações semelhantes de mais fácil percepção. No nosso caso, a analogia que melhor se ajusta aos nossos objetivos é uma analogia bidimensional.

            Desta forma podemos considerar uma superfície qualquer como sendo um espaço de duas dimensões.

            Nesta analogia, um plano é, como o próprio nome diz, um espaço plano de duas dimensões. Sua geometria é dita ser Euclidiana, uma vez que em um plano todos os postulados de Euclides são válidos. O plano é infinito e ilimitado e é dito ser um espaço aberto. De forma análoga, um espaço tridimensional (quadridimensional) plano é aquele no qual vale a geometria euclidiana.

            Continuando com nossas analogias, o espaço representado pela superfície de uma esfera é um espaço curvo. Sua curvatura é dita ser positiva. No caso do plano, a curvatura é dita ser nula, ou zero. O conceito de curvatura é um conceito, no caso de espaços com dimensões superiores a duas que só pode ser entendido em toda a sua totalidade pelo conhecimento da Teoria Geral da Relatividade. Para as finalidades que temos em vista, entretanto, é suficiente se dizer o acima exposto. Retornando ao caso do espaço representado por uma superfície esférica, verifica-se que tal espaço é finito e ilimitado, já que não existem sobre ele barreiras que impeçam deslocamentos em qualquer direção e sentido, uma vez que ao se partir, de um ponto qualquer na superfície de uma esfera, numa direção e sentido quaisquer, eventualmente se retornará ao ponto de partida. A geometria de um espaço esférico é dita ser a geometria Riemanniana, já que foi o matemático alemão Bernard Riemann que estudou este tipo de espaço. De forma análoga, o espaço de três (quatro) dimensões no qual vale a geometria Riemanniana é dito ser um espaço esférico.

            Já que verificamos que um espaço bidimensional com curvatura zero é um plano e um com curvatura positiva é uma esfera, podemos naturalmente inquirir sobre o que será um espaço bidimensional com curvatura negativa. Infelizmente não é possível se representar integralmente, como foi feito para o espaço bidimensional esférico, um tal espaço no nosso espaço usual de três dimensões. Por outro lado, uma superfície em forma de sela representa, de forma limitada, um tal espaço. Tais espaços tem a sua geometria dita ser uma geometria Lobatchewskyiana, já que foi o matemático russo Nicolai Lobatchewsky o primeiro a estudá-las. De forma análoga ao espaço plano, este espaço é infinito e ilimitado. Este tipo de espaço é, as vezes, referido com um espaço hiperbólico. Como antes, dizemos que um espaço cuja geometria é lobatchewskyiana é um espaço hiperbólico, tenha ele duas ou mais dimensões.

A figura 21 mostra, de forma esquemática, a concepção de tais espaços.

 

Fig. 6.21. Espaços Bidimensionais. a) Espaço Plano. b) Espaço Esférico c) Espaço Hiperbólico

 

            Através de generalizações os matemáticos são capazes de estender estes conceitos aplicados ao caso de superfícies bidimensionais a espaços de qualquer número de dimensões, inclusive ao nosso espaço usual de três dimensões.

            Daí resultam três tipos diferentes de espaço:

            ð o espaço esférico, que corresponde, em duas dimensões, à superfície de uma esfera. Este espaço e finito e ilimitado ou é um espaço fechado, como também se diz. Sua geometria é a Riemanniana.

            ð o espaço plano, que corresponde, em duas dimensões, ao plano. Este espaço é infinito e ilimitado ou é um espaço aberto, como também se diz. Sua geometria é a Euclidiana.

            ð o espaço hiperbólico, que corresponde, em duas dimensões, à superfície de uma sela. Este espaço é infinito e ilimitado ou seja, é um espaço aberto. Sua geometria é a Lobatchewskyiana.

            A tabela 4 sumariza as principais características desses espaços.

Espaço

Curvatura

Extensão

Geometria

Plano

Nula

(=0)

Infinito e ilimitado (Aberto)

Euclidiana

Esférico

Positiva

( > 0 )

Finito e ilimitado (Fechado)

Riemanniana

Hiperbólico

Negativa

( < 0 )

Infinito e ilimitado (Aberto)

Lobatchewskyiana

 

Tabela 6.4. Tipos de espaços e suas propriedades.

 

 

6.3.2.2 Horizontes

            Um conceito muito importante para a cosmologia moderna é o conceito de horizonte observável ou simplesmente horizonte, quando não houver possibilidade de confusão.

            O conceito de horizonte não é um conceito muito simples, de modo que uma analogia será de grande utilidade. Para isto vamos novamente nos reportar à analogia do balão que está sendo inflado.

            Imaginemos que o universo é como a superfície de um balão que está sendo inflado gradualmente. As galáxias seriam então pintas na superfície do balão. Numa destas galáxias, a Via Láctea, se encontra a Terra. Um observador na superfície do balão somente poderá enxergar uma fração da superfície do balão. É importante neste ponto não se confundir  a analogia com o nosso horizonte comum. O horizonte que estamos nos referindo é o horizonte observável e a distância do observador até o horizonte, distância esta contada sobre a superfície do balão, nada mais é do que o espaço que a luz pode percorrer, com a velocidade de 300.000 km/s, desde o início do universo.

            Desta forma nós, da Terra, não podemos enxergar objetos que se encontrem além do horizonte observável, uma vez que a luz emitida por estes objetos não teve ainda tempo suficiente para nos alcançar. A figura 22 mostra, de forma simplificada a idéia.

 

Figura 6.22. Horizonte observável

 

            Na figura 22 (a) temos o início dos tempos (t = 0). O universo observável era nulo.

            Na figura 22 (b), após decorrido um tempo t = t1, (t1 > 0) do início da expansão, o universo se expandiu, de forma que um observador colocado em A pode enxergar até uma distância AB, sendo AB = c.t1, onde c é a velocidade da luz. Se diz que o horizonte observável para o observados A é a calota hachurada de raio AB, contado sobre a superfície da esfera. A galáxia G1, que se encontra dentro do horizonte observável do observador A é visível para ele, enquanto que as galáxias G2 e G3, que estão além do seu horizonte, não o são.

            Na figura 22 (c), após haver decorrido um tempo t = t2, com t2 > t1, o horizonte observável do observador A se expandiu. O raio da calota agora é AC = c.t2, e a galáxia G2, que antes era inacessível ao observador A, agora passa a ser visível, enquanto que a galáxia G3 continua inacessível, uma vez que o tempo t2 ainda é insuficiente para que ela entre no horizonte do observador.

            Na figura 22 (d), por um raciocínio similar, teremos que a galáxia G3, em algum tempo t3, com t3 > t2, também entrará no horizonte observável do observador A.

            Retornaremos a este assunto posteriormente, quando estivermos examinando os modelos de universo.

 

 

6.3.3. A Teoria da Grande Explosão (Big Bang)

6.3.3.1 Evidências da Grande Explosão.

            A tese central da teoria da Grande Explosão é a de que, há 20 bilhões de anos atrás, aproximadamente, dois pontos quaisquer do universo observável estariam arbitrariamente juntos. A densidade da matéria neste instante seria infinita. Neste instante teríamos a chamada singularidade, na qual as leis conhecidas da física não são aplicáveis (inclusive as da TGR). A temperatura neste instante também seria infinita. A partir deste instante o universo iniciou o seu desenvolvimento, com a densidade e a temperatura caindo com o decorrer do tempo até atingir os valores atuais, após decorrido um tempo de uns 20 bilhões de anos.

            Existem algumas evidências de que se essa história não é de todo correta, pelo menos não deverá estar totalmente errada. Vamos passar a examinar as principais evidências.

 

1. A idade do universo.

 

            Pode-se demonstrar que dentro da teoria do Big Bang a idade do universo é dada aproximadamente por

            Idade = 1/H                           (H é a constante de Hubble)

            se o universo for aberto ou por

            Idade = 2/(3H)

            se o universo for fechado.

 

            Os valores acima mostrados dão, na realidade os limites superiores para a idade do universo, conforme o tipo.

            Com o valor usualmente aceito para a constante de Hubble teremos uma idade de uns 20 bilhões de anos no primeiro caso e de uns 13 bilhões de anos no segundo. Se o nosso universo é aberto ou fechado é um problema até hoje ainda não resolvido e sobre o qual se investe uma grande quantidade de pesquisa, tanto teórica quanto observacional.

            Todas as outras evidências de tempo de existência do universo (pelo menos o melhor que se pode realizar até agora) indicam que o universo tem uma idade compreendida entre 15 a 20 bilhões de anos.

            Sob este aspecto um valor compreendido entre 50 km/(s.Mpc) e 70 km/(s.Mpc) é o mais razoável para H.

            Os outros indicadores de tempo utilizados são:

            ð datação radioativa de rochas terrestres e lunares (4 bilhões de anos)

            ð Idem para meteoritos (4,5 bilhões de anos)

            ð modelos de evolução galáctica (urânio e seus isótopos (10 bilhões  de anos)

         ð estudo da idade das estrelas (15 bilhões de anos)

         ð relação velocidade distância (10-20 bilhões de anos)

 

            Desta forma, pelos valores, vemos uma certa convergência na estimativa de 15 a 20 bilhões de anos para a idade do universo.

 

2. A radiação de fundo das microondas cósmicas.

 

            A existência de uma radiação de fundo, no valor encontrado é, sem dúvida, uma das maiores evidências observacionais em favor da teoria do Big Bang. A teoria prevê a existência de uma radiação de fundo que vem igualmente de todas as direções do espaço e que, após uns 20 bilhões anos deve ser praticamente idêntica a de um corpo negro a uma temperatura de aproximadamente três Kelvin. A radiação detectada vem igualmente de todas as direções do espaço e é praticamente igual a de um corpo negro a 2,7 Kelvin.

 

3. Abundância do Hélio e do Deutério.

 

            Da mesma forma que para a radiação de microondas, a teoria do Big Bang prevê uma época de nucleossíntese. Assim, a teoria prevê que a maior parte da matéria gerada na grande explosão consistia praticamente de hidrogênio com uma pequena parcela de hélio e de lítio, principalmente. Também se formaram alguns isótopos do hidrogênio, como o deutério e o trítio. As abundâncias previstas para o hidrogênio e o hélio são de aproximadamente 75% e 25%, respectivamente. Estes valores combinam muito bem com os valores observados. O deutério e um núcleo "delicado" e não poderia ser gerado no interior das estrelas. Desta forma , as evidencias são todas a favor de que o deutério existente seja o primordial, e também neste caso os valores observados combinam bem com os valores previstos.

 

6.3.3.2. Modelos Cosmológicos.

            Todos os modelos cosmológicos que são viáveis atualmente se baseiam na Teoria Geral da Relatividade de Einstein, que foi publicada em 1916. A TGR é uma teoria razoavelmente complicada, que faz uso de um complexo aparato matemático, ao contrario da Teoria Restrita da Relatividade (TRR) cujo aparato matemático, apesar de não ser elementar, se encontra usualmente dentro do aprendido nas universidades. Desta forma, nos ateremos somente aos fatos essenciais dos diversos modelos cosmológicos que são plausíveis atualmente.

            Veremos a seguir os principais modelos propostos para o universo. Os modelos que nos interessam, isto é, que são elaborados dentro da TGR são:

            ð o modelo de De Sitter

            ð o modelo de Einstein

            ð o modelo de Einstein - De Sitter

            ð o modelo de Friedmann - Lemaitre

            ð o modelo de Lemaitre

            ð o modelo de Eddington - Lemaitre

            ð o modelo do Estado Estacionário

 

            É importante se observar que quando estes modelos foram propostos, com exceção do sexto e do sétimo modelos, a expansão do universo não era conhecida.

            O modelo de De Sitter, que é um modelo que não contempla uma grande explosão como sendo o início do universo, fornece como resultado um universo estático, no qual não existe a chamada constante cosmológica. O inconveniente fundamental deste universo é que ele precisa ser vazio, isto é, destituído de toda a matéria para ser possível. Como este não é, obviamente, o caso, este modelo foi abandonado.

            O modelo de Einstein, que também é um modelo que não contempla uma grande explosão para o início do universo, fornece um universo estático, como antes, porém com a presença de matéria. Porém, para obter este resultado, isto é, um universo estático com a presença de matéria, Einstein foi obrigado a incluir em suas equações um termo extra, que ele chamou de constante cosmológica, que tem a característica de uma força repulsiva e cujos efeitos só são sensíveis em enormes dimensões.

            Neste ponto é importante notar  que as equações da TGR, em sua forma original, isto é, sem a introdução da constante cosmológica, de certa forma se "recusavam" a fornecer como resultado um universo estático preenchido com matéria.

            Este modelo permaneceu como sendo plausível até o momento em que se descobriu a expansão do universo, quando então o mesmo foi posto de lado.

            Os próximos dois modelos, o de Einstein - De Sitter e o de Friedmann - Lemaitre, que na realidade são três, já que o modelo de Friedmann - Lemaitre se subdivide em dois, são modelos que contemplam uma grande explosão para o início do universo e não incorporam a constante cosmológica. Como estes modelos são, atualmente, os mais plausíveis, deles nos ocuparemos com mais detalhes mais adiante.

            O modelo de Lemaitre é o único modelo que contempla uma grande explosão para o início do universo e também incorpora a constante cosmológica. É um modelo plausível para o universo, se bem que não tão popular quanto os dois (três) anteriores, de forma que, apesar de não ter sido descartado completamente pelos cosmólogos atuais, também não é muito considerado.

            O modelo de Eddington - Lemaitre é um modelo que não contempla uma grande explosão para o início do universo e incorpora a constante cosmológica. Este modelo foi originalmente desenvolvido como uma tentativa de acomodar uma estrutura como o universo estático de Einstein dentro da descoberta da expansão cósmica. No universo estático de Einstein, o equilíbrio entre as forças de atração newtoniana entre as partículas de matéria e a força de repulsão devida a constante cosmológica era muito precário. Devido a uma má interpretação, Eddington foi levado a acreditar que, quando a matéria começasse a se condensar em galáxias, a força de repulsão se tornaria preponderante, de modo que o universo começaria a se expandir. Hoje se sabe que ocorreria exatamente o oposto, isto é, quando a matéria começasse a se condensar, a força de atração é que se tornaria preponderante e o universo implodiria ao invés de se expandir. Desta forma este modelo também foi abandonado.

            Finalmente, o modelo do estado estacionário, que foi o grande rival da TGE na década de 50, hoje em dia também se encontra abandonado.  Como nos ocuparemos dele com mais alguns detalhes mais adiante, não faremos maiores comentários por aqui.    

 

1. O modelo de Einstein - De Sitter

            O modelo de Einstein - De Sitter é a mais simples das cosmologias do Big Bang. Não incorpora a chamada constante cosmológica, que Einstein introduziu de forma mais ou menos artificial no seu modelo anterior (o modelo de Einstein) para dar conta da não expansão do universo, uma vez que na época em que este modelo foi elaborado a expansão do universo não era conhecida. Como o modelo não incorpora a constante cosmológica o resultado natural é produzir um universo em expansão. Nestes e nos próximos modelos que examinaremos se perde a analogia simples com a física newtoniana que nos é mais familiar, por ser mais "intuitiva". Entretanto, algum sentimento ainda pode ser obtido. Para as finalidades que temos em vista, basta que saibamos que nas equações matemáticas da relatividade geral que descrevem o modelo, existe uma determinada constante, cujo valor é ainda desconhecido, e que chamaremos de k. Do valor desta constante surgem os diversos modelos de universo.

            No modelo de Einstein - De Sitter o valor dessa constante é admitido ser igual a zero. Como conseqüência o espaço é plano, infinito, ilimitado e expande-se continuamente. A geometria do espaço é a euclidiana. A figura 23 mostra a analogia bidimensional do modelo de Einstein - De Sitter.

Fig. 6.23. Analogia bidimensional do universo de Einstein - De Sitter.

            Neste modelo o universo surgiu a partir de uma grande explosão, a partir de um estado em que tanto a densidade da matéria - energia quanto a temperatura eram infinitas, estado este conhecido como a singularidade. Na singularidade as leis da física, inclusive as da TGR, não se aplicam. Mesmo hoje em dia não temos uma teoria física que seja capaz de explicar a singularidade. Acredita-se ser necessária uma teoria quântica de gravitação, uma espécie de fusão entre a teoria quântica e a TGR para explicá-la.

            Neste tipo de universo, apesar de o espaço ser infinito e se expandir, o horizonte também se expande, e o faz a uma velocidade maior do que aquela do universo. Desta forma, cada vez mais galáxias vão se tornando visíveis conforme o tempo passa. Entretanto, nunca chegará o dia em que o universo estará totalmente contido dentro do horizonte observável.

 

2. O modelo de Friedmann - Lemaitre.

 

            Este modelo, da mesma forma que o anterior, contempla o início do universo como tendo ocorrido em uma grande explosão. O modelo de Friedmann - Lemaitre, que na realidade são dois, como veremos, é, atualmente, o que maior crédito possui dentro dos modelos cosmológicos que incluem o Big Bang. Foram desenvolvidos independentemente, em sua forma original por Alexander Friedmann, um matemático russo, por volta de 1922, e por Georges Lemaitre, um matemático (e clérigo) belga por volta de 1927. Da mesma forma que o modelo anterior, em nenhum desses dois modelos intervém a constante cosmológica. Vamos passar a examinar cada um dos modelos:

 

            A) O modelo de F-L aberto.

            Este modelo é obtido considerando-se k menor do que zero, isto é, negativo. Com isso o universo torna-se hiperbólico, infinito ,ilimitado e expande-se continuamente. A geometria de tal universo é a geometria hiperbólica ou lobatchewskyiana. A figura 24 mostra a analogia bidimensional do universo de F-L aberto.

 

 

Fig. 6.24. Analogia bidimensional do universo aberto de Friedmann - Lemaitre.

            Da mesma forma que para o modelo do item precedente, neste modelo o universo também surge de uma grande explosão. As mesmas observações feitas com respeito ao horizonte observável feitas para o caso anterior também valem aqui.

 

            B) O modelo de F-L fechado.

 

            Este modelo é obtido considerando-se k maior do que zero, isto é, positivo. Como conseqüência o modelo resultante indica um universo esférico, finito, ilimitado e que se expande até um valor máximo e depois se contrai até implodir novamente em uma singularidade semelhante a inicial. A geometria de tal universo seria a geometria esférica ou riemanniana. A figura 25 mostra a analogia bidimensional de tal universo.

 

Fig. 6.25. Analogia bidimensional do universo de Friedmann - Lemaitre fechado

               

            De forma semelhante aos casos anteriores este universo também surgiu numa grande explosão.

            O horizonte observável, entretanto, se comporta de forma diferente que para os modelos anteriores. Neste caso, num tempo finito, no futuro, todo o universo virá eventualmente a se encontrar dentro do horizonte. Se isto vai acontecer quando o universo ainda estiver se expandindo ou se somente após ter se iniciado a contração depende das velocidades relativas da expansão e da velocidade da luz, bem como do tempo necessário para que o mesmo se expanda até o seu volume máximo.

 

 

 

3. O modelo de Lemaitre.

 

            O modelo de Lemaitre, além de contemplar uma grande explosão para o início do universo, ao contrario dos três modelos anteriores,  também incorpora a constante cosmológica.

            Neste modelo o universo inicia numa grande explosão padrão e começa a se expandir. Com o decorrer do tempo a expansão, de início vigorosa, começa a diminuir de ritmo, de modo a quase se anular. Antes que isso ocorra, entretanto, os efeitos da constante cosmólogica começam a se fazer presentes e o universo começa a aumentar novamente o ritmo da expansão, a partir daí expandindo-se para sempre. Em qualquer momento o espaço é esférico, finito e ilimitado e expande-se para sempre. Sua geometria é a esférica (Riemanniana).

            Neste modelo a idade do universo é muito maior do que 1/H.

            A figura 26 ilustra, em seqüência de (a) até (e) o comportamento deste modelo.

 

 

Figura 6.26. O modelo de Lemaitre.

(a)   Início dos tempos (t = 0); (b) Expansão inicial;

(b)   (c) e (d) Fase quase estática (e) Retomada da expansão.

       

4. O modelo do Estado Estacionário.

 

            Este modelo, ao contrario dos anteriores, não contempla um início para o universo. Ele será discutido brevemente aqui devido ao fato de ter sido o maior rival do Big Bang até mais ou menos 1965. Este modelo foi proposto por Hoyle, Bondi e Gold no fim da década de 40 e resistiu até 1965, como já foi dito, quando o descobrimento da radiação de fundo das microondas cósmicas, previstas pelo Big Bang desacreditou o modelo, uma vez que o mesmo não fornecia uma explicação para elas.

            Neste modelo o valor de k é igual a 0. A geometria do espaço é euclidiana, portanto o espaço é plano. O espaço também é infinito e ilimitado, sendo também estacionário, mas não estático.

            Esta teoria teve sua origem no fato de que, na década de 40, a teoria sobre a expansão do universo era perfeitamente aceita pelos cientistas, o mesmo já não acontecendo com a teoria do Big Bang. Desta forma, no final da década de 40 (mais ou menos por volta de 1947) surgiram vários cientistas com idéias contrárias a hipótese da Grande Explosão. Entre estes se encontravam Fred Hoyle, Hermann Bondi e Thomas Gold.

            Gold fez uma hipótese arrojada: se era possível se aceitar que, segundo a teoria do Big Bang, toda a matéria tenha surgido do nada em uma única vez no passado, porque não acreditar que ela surge o tempo todo, gradativamente. Se a matéria fosse criada constantemente, ela preencheria o espaço esvaziado pela expansão e assim o universo permaneceria apresentando sempre o mesmo aspecto. Após os cálculos, chegou-se a conclusão que a taxa com que a matéria deveria ser criada para preencher o vazio deixado pela expansão era da ordem de 0,001 átomo de hidrogênio por metro cúbico por ano. Mesmo assim, em virtude das dimensões do universo (horizonte visível), isso daria uma criação de massa da ordem de 1035 kg/s. Essa criação faria com que houvesse uma pressão contínua sobre a matéria preexistente, causando com isso a expansão do universo.

            Dos modelos que contemplam o Big Bang não foi possível, até hoje, se estabelecer qual deles realmente representa o nosso universo ou se nenhum deles o faz. O mesmo vale para os modelos que não contemplam um Big Bang, que como vimos, são pouco prováveis de serem os modelos corretos para o nosso universo.

            Dentro do que melhor se conhece, aparentemente o nosso universo é o representado pelo modelo aberto de Friedmann - Lemaitre, mas isso não é uma questão fechada, uma vez que se dedica uma grande quantidade de trabalho teórico e observacional para se determinar certos parâmetros do nosso universo, entre os quais se pode destacar o mais importante que é o da densidade da matéria cósmica.

            Este aspecto é importante uma vez que se pode calcular qual deve ser a densidade atual da matéria cósmica necessária para fechar o universo, isto é, evitar que ele se expanda eternamente.

            Este valor foi calculado e é da ordem de 4,5 x 10-30 g/cm3. Assim, se a densidade real do universo for menor do que este valor, então o universo e hiperbólico e portanto aberto. Se a densidade real for igual a esse valor, o universo será plano, mas ainda será aberto (será marginalmente aberto, como se costuma dizer). Entretanto, se a densidade real for maior do que este valor, então o nosso universo será fechado, isto é, chegará um tempo em que a expansão do universo cessará, para logo em seguida começar a se contrair e implodir novamente na singularidade.

            A tabela 5 resume as principais características desses universos.

Modelo  k

Espaço

Geometria

Extensão

Destino

E-DS = 0

Plano

Euclidiana

Infinito e ilimitado

Expande-se para sempre

F-L aberto  < 0

Hiperbólico

Lobatchewskyiana

Infinito e ilimitado

Expande-se para sempre

F-L fechado > 0

Esférico

Riemanniana

Finito e ilimitado

Expande-se e entrará em colapso

Lemaitre > 0

Esférico

Riemanniana

Finito e ilimitado

Expande-se para sempre

 

Tabela 6.5. Resumo das principais características dos modelos prováveis de universo.

 

A figura 27 mostra de forma gráfica os modelos abordados.

Nesta figura o eixo vertical mostra, numa escala arbitraria, o afastamento de dois pontos quaisquer do universo em função do tempo, representado no eixo horizontal. Pode-se verificar que o valor 1/H dá um valor limite superior para a idade do universo, no caso dele ser do tipo E-DS ou um dos modelos F-L. No caso dele ser um modelo de Lemaitre, a idade do universo é muito maior do que 1/H.

 

Fig. 6.27. Modelos de universos.

a - modelo de Einstein - De Sitter; b - modelo de Friedmann - Lemaitre aberto

c - modelo de Friedmann - Lemaitre fechado; d - modelo de Lemaitre

 

 

6.3.3.3. Cronologia da Formação do Universo segundo a Teoria da Grande Explosão

            Veremos neste item a cronologia da formação do universo, segundo a teoria do Big Bang. Esta cronologia é válida independentemente de qual seja o modelo adotado, isto é, vale igualmente, em linhas gerais, tanto para o modelo de E-DS quanto para os modelos aberto e fechado de F-L.

            Como vimos, no tempo zero, segundo a TGE, havia uma singularidade, isto é, um ponto material com uma densidade e uma temperatura infinitas e ao qual as leis da física, como as conhecemos não se aplicam, uma vez que não podemos extrapolar as leis físicas conhecidas para estas condições extremas. Se acredita ser necessária, como já foi dito, uma Teoria Quântica da Gravidade, ou seja uma fusão da atual Teoria Quântica com a TGR, coisa ainda não conseguida, para se explicar a singularidade.

            Desta forma, para tempos compreendidos entre o instante zero e o instante dado por 10-43 segundos, período este conhecido como a Era de Planck, nada se pode afirmar atualmente. A partir desse instante se pode começar a descrever o que aconteceu à luz da TGE. Neste ponto, conforme o autor, se notam algumas discrepâncias com respeito aos tempos e aos valores de densidade e temperatura que caracterizam o início e o fim de determinadas eras, bem como a própria subdivisão em eras.

            O que se segue, portanto, é um apanhado médio entre diversas referências, de modo que os parâmetros associados devem ser encarados com alguma reserva.

            Assim ao final da Era de Planck, a temperatura tinha caído de um valor infinito no tempo zero para um valor de 1032 Kelvin e a densidade tinha caído de infinito para 1097 kg/m3.

            No intervalo de tempo que vai de 10-43 segundos até aproximadamente 10-5 segundos temos a chamada Era Hadrônica. Durante este intervalo teriam se formado os hádrons, que são as partículas pesadas, entre as quais contamos os prótons e os nêutrons. Ao final dessa era a temperatura teria caído para algo em torno de 3,0 x 1012 Kelvin e a densidade para um valor de 1019 kg/m3.

            No período de tempo que vai de 10-5 segundos até aproximadamente 2 segundos, chamada de Era Leptônica, formaram-se os léptons, entre os quais o elétron e o seu neutrino. No final dessa era a temperatura teria caído para uns 2,0.1010 Kelvin e a densidade teria atingido um valor da ordem de 1010 kg/m3.

            Aos 2 segundos começa o que se chama de Era da Radiação, que se estende até aproximadamente uns 10.000 anos. A partir de 2 segundos, com a temperatura caindo, quando são atingidas temperaturas inferiores a 1010 Kelvin, ocorre a nucleossíntese primordial.

            Neste período de uns três minutos formam-se o hidrogênio (H), o deutério (D), que é um isótopo do hidrogênio, o helio-4 (He-4) e o lítio-7 (Li-7), interrompendo-se por aí os processos de formação dos elementos, uma vez que a temperatura já havia caído bastante e não havia mais energia disponível para a formação de núcleos mais pesados. Neste instante a temperatura havia caído abaixo de 109 Kelvin e a densidade tinha caído a um valor da ordem de 105 kg/m3. Todos os demais elementos foram formados nos núcleos estelares. A nucleossíntese primordial é um dos mais importantes resultados da TGE, porque a abundância de He4 prevista pela teoria (uns 25%) é bastante próxima da observada.

            A partir de 10.000 anos até mais ou menos 300.000 anos tem-se a Era da Matéria: a matéria tornou-se dominante no universo. Como a temperatura era ainda muito alta, a matéria se encontrava em estado ionizado, permanecendo neste estado enquanto a energia média dos fótons, que depende da temperatura, era maior do que a energia necessária para ionizar os átomos. Como havia uma grande interação entre a matéria e a radiação, durante esta era o universo era opaco à radiação. Ao final dessa era a temperatura já havia caído a um valor da ordem de 4.000 Kelvin e a densidade havia caído a valores da ordem de 10-13 kg/m3.

            Ao final de 300.000 anos iniciou-se a chamada Era da Recombinação ou Era do Desacoplamento.  A temperatura ainda era alta o suficiente para manter uma grande parte da matéria em estado ionizado, mas ocasionalmente já apareciam átomos tal qual os conhecemos. O universo foi se tornando rapidamente transparente à radiação. Com a temperatura caindo cada vez mais abaixo dos 4.000 Kelvin, os átomos foram se formando em grande número , tal que ao cabo de aproximadamente 1.000.000 de anos, quando a temperatura já havia caído bem abaixo dos 4.000 Kelvin, o processo estava praticamente concluído.    

            A partir dai temos:

Bilhões de anos após o Big Bang

Evento

1-2

Começa a formação das galáxias

3

Começa a aglomeração das galáxias

4

Nossa protogaláxia entra em colapso

4,1

Formação das primeiras estrelas

5

Formam-se os quasares e as estrelas da população II.

10

Formação das estrelas da população I

15,2

Formação da nossa nuvem estelar originária.

15,3

Colapso da nebulosa protosolar.

15,4

Formação dos planetas. Solidificação das rochas

15,7

Craterização intensa dos planetas.

16,1

Formação das mais antigas rochas terrestres.

17

Formação da vida microscópica na Terra.

18

Desenvolve-se uma atmosfera rica em oxigênio.

19

Formação da vida macroscópica

19,400

Vestígios dos fósseis mais antigos.

19,550

Primeiras plantas terrestres.

19,600

Peixes

19,700

Samambaias

19,750

Formação de montanhas.

19,800

Répteis

19,850

Dinossauros. Flutuação dos continentes.

19,950

Primeiros mamíferos.

19,998

Homo Sapiens

20,000

Hoje

 

Tabela 6.6.

 

6.3.4 A Teoria do Universo Inflacionário.

            A TGE apresenta um cenário bastante consistente com a grande maioria dos resultados observacionais atuais. Entretanto, como não poderia deixar de acontecer com qualquer teoria científica, existem algumas questões para as quais as respostas não são satisfatórias, quando existem. A principal delas se refere ao que aconteceu entre os instantes t = 0 e t = 10-43 segundos (a Era de Planck). Como já foi dito, ainda não se conseguiu uma teoria capaz de explicar o comportamento do universo durante este período de tempo.

            Além dessa, existem algumas outras questões referentes aos primórdios da história do universo que a TGE padrão tem dificuldades em explicar. Assim, dentro da TGE padrão certas condições que são necessárias terem ocorrido para que o nosso universo se apresentasse atualmente como o observamos, não tem explicação satisfatória e tem que serem admitidas como condições iniciais. Algumas destas questões, que serão somente expostas aqui, e para as quais somente se tem respostas satisfatórias se forem admitidas determinadas condições iniciais, bastante arbitrárias, são:

            ð O problema da singularidade;

            ð O problema da planura;

            ð O problema do horizonte;

            ð O problema da homogeneidade e da formação das galáxias;

            ð O problema da unicidade.

 

            Só para citar os mais notáveis.

            A Teoria do Universo Inflacionário (TUI) tenta traçar um cenário de como o universo se desenvolveu dentro do período compreendido entre 10-35 segundos  e aproximadamente 10-32 segundos.  Adicionalmente a TUI explica, de uma forma bastante consistente, a algumas outras questões que não são respondidas satisfatoriamente pela TGE, quando o são, e, o que é mais importante, o comportamento do universo dentro da TUI coincide, para tempos superiores a 10-32 segundos, aproximadamente com o previsto pela TGE.

            Como a TUI é muito mais complicada do que a TGE e, para aprecia-la, mesmo que superficialmente, teríamos que nos aprofundar em questões relacionadas aos fundamentos matemáticos e físicos da TGE, o que está fora do escopo deste trabalho, fica aqui registrado somente as informações acima mencionadas.

Para aqueles que tiverem um interesse maior pelo assunto, o artigo de Guth e Steinhardt, na bibliografia, traz um bom apanhado sobre as concepções básicas da TUI.

BIBLIOGRAFIA

CAPÍTULO 1 - A Descoberta do Cosmos

 

BAKULIN, P.I, KONONOVICH, E.V., MOROZ, V.F. Curso de Astronomia General. Moscou, MIR, 1987. 568 p.

 

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HICKEL, Gabriel R. História da Astronomia. V Curso de Introdução à Astronomia, Florianópolis, GEA, 1990.

 

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CAPÍTULO 2 - Estrelas

 

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CAPÍTULO 3 - Meio interestelar

 

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CAPÍTULO 4 - Galáxias

 

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CAPÍTULO 5 - A Vida no Cosmos

 

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CAPÍTULO 6 - Cosmologia

 

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MEIRELLES Filho, C., SODRÉ Júnior, L. , PEREIRA, V.J.S. Cosmologia. in: Curso de extensão universitária-Introdução à    Astronomia e Astrofísica. São Paulo, IAG-USP, 1988, 14p.

 

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SILK, Joseph. O Big Bang. Brasília, Un. Brasília, 1985. 379 p.

 

STOTZ Neto, Adolfo. Cosmologia. In: Curso Além do Sistema Solar, Estrelas, Galáxias e Cosmologia. Florianópolis, GEA,             1991. 33 p.

 

WEINBERG, S. Os Três Primeiros Minutos. Rio de Janeiro, Guanabara Dois, 1980. 162 p.

 

ZEILIK, Michael & SMITH, Elske P. Introductory Astronomy and Astrophysics. New York, Saunders, 1987. 503 p.

 

 

 

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