1986

Enfim chega o Cometa Halley

O Cometa Halley é um cometa brilhante de período intermediário que retorna às regiões interiores do sistema solar a cada 76 anos, aproximadamente. Sua órbita em torno do Sol está na direção oposta à dos planetas e tem uma distância de periélio de 0,59 unidades astronômicas; no afélio, sua órbita estende-se além da órbita de Netuno. Foi o primeiro cometa a ser reconhecido como periódico, descoberta feita por Edmond Halley em 1696. O cometa foi registrado pela primeira vez em 240 a.C. e mostrou-se visível a olho nu em todas as suas 30 aparições registradas. Nos anos 374, 607, 837 e 1066, apresentava um brilho maior do que a mais brilhante das estrelas do hemisfério celestial norte. A aparição de 1066 ficou registrada nas tapeçarias de Bayeux. O brilho do cometa, quando está no periélio, tem sido interpretado como uma indicação de que este perde aproximadamente 3×10^11 kg de gás e poeira em cada aparição; este valor representa cerca de 0,1% da sua massa total.

Edmond Halley

Cometa Halley em 1910

As partículas de poeira maiores compõem um grupo de meteoros que é atraído pela Terra duas vezes por ano. Isto tem como consequência as chuvas de meteoros Eta Aquáridas, no final de abril, e Oriónidas, no final de outubro. A massa deste fluxo de meteoros indica que o cometa está na meia-idade: foi capturado pelo campo gravitacional de Júpiter, que o obrigou a descrever a órbita atual mais ou menos 200.000 anos atrás, numa época em que seu núcleo tinha aproximadamente 19 km de diâmetro.

Este núcleo agora tem mais ou menos 11 km de diâmetro e dentro de 300.000 anos terá desaparecido completamente. O sucesso da predição de Edmond Halley do retorno de seu cometa em 1759 foi considerado como uma prova sensacional da lei da gravitação de Newton. Em 1910, uma série de notícias a respeito do cianogénio, gás letal presente na cauda do cometa, criou um clima de pânico à escala global.

Curiosamente, o que está na origem de todo o alarido são descobertas científicas fidedignas. Pela primeira vez, os astrônomos identificaram os elementos químicos de um cometa, incluindo os componentes venenosos, e a informação saltou para a Imprensa. Houve tentativas de explicar que, mesmo ao aproximar-se mais da Terra – na noite de 18 para 19 de Maio -, o cometa não envenenaria ninguém, mas o estrago estava feito.  O que aconteceu a partir daí foi uma bola de neve de superstições, especulação e exploração comercial e religiosa. Ainda que longe da histeria disseminada pelos Estados Unidos, Portugal não escapou ao medo semeado pelos jornais. E como o medo de alguns é sempre um bom negócio para outros, rapidamente houve quem lucrasse, e muito, com o suposto envenenamento por cianogênio.Das mentes criativas dos contemporâneos da penúltima passagem do Halley saíram máscaras para escapar aos gases, comprimidos que prometiam ser um antídoto ao veneno, vestuário protetor e uma parafernália de mezinhas para salvar da morte anunciada nos céus. O Halley passou, indiferente às profecias, e continuou a sua órbita.

No ano de 1986, a humanidade tinha 28 anos de era espacial e uma frota de espaçonaves foi enviada para observá-lo, inclusive a sonda Giotto em julho de 1985. Estavam também planejadas que duas missões do halley espacial [1] a STS-51-L que resultou na destruição do Challenger e a STS-61-E observariam o cometa a partir da órbita terrestre baixa. A STS-61-E seria a próxima missão a decolar após o final do voo do Challenger. Agendada para Março de 1986, transportaria o observatório ASTRO-1, uma plataforma de estudo do Halley [1]. A missão foi cancelada e o Astro-99, com uma nova circunferência de telescópios, somente foi ao espaço no final de 1990EM 1986 o cometa Halley passaria  pelo periélio em 9 de Fevereiro de 1986, e teria-se que esperar o mesmo de distanciar do sol para poder ser observados com maior facilidade. Pelos cálculos dos integrantes do GEA – Grupo de Estudos de Astronomia  da UFSC, a melhor data para observação da população em geral seria no dia 25 de março, devido ao ângulo de sua calda e afastamento do Sol.

No Brasil e na cidade a euforia para ver o cometa estavam em alta, praticamente todas as semanas havia encartes e no jornal “O Estado” oferecendo binóculos e lunetas, produtos este até então despercebidos pela população local em óticas e nas lojas Hermes Macedo. Isto fica também muito evidente junto ao pessoal do Grupo que frequentemente recebia no Planetário da UFSC interessados em adquirir um equipamento correto para ver o cometa.

Propaganda no Jornal O Estado | 29 de março de 1986

O Grupo se reúne no Planetário da UFSC no dia 14 de fevereiro para montar a programação  de palestras do primeiro semestre e avaliar a informações recebidas sobre a passagem do cometa Halley pelo periélio e delibera a seguinte programação para o primeiro semestre de 1986:

21/02 História da astronomia (Adolfo) 28/02 Júpiter (Lucena) 07/03 Urano, Netuno e Plutão (Arildo) 14/03 Cartas celestes (Avelino) 21/03 Física atômica e nuclear (Pinho) 28/03 Objetivos e tarefas da astronomia (Lucena) 04/04 Física atômica e nuclear (Luís) 11/04 O Sol (Juceli e Leonardo) 18/04 Estrelas duplas e variáveis (Avelino) 25/04 Nebulosas (Avelino) 02/05 Nebulosas (Avelino)09/05 Evolução das estrelas (Juceli e Leonardo) 16/05 Atmosferas planetárias (Narcizo) 23/05 Cosmologia (Arildo) 30/05 Cosmologia (Arildo) 06/06 Movimento aparente das estrelas (Nilton) 13/06 Aglomerados (Avelino) 20/06 Saturno (Adolfo) 27/06 Superfícies equipotenciais (Nilton).

A medida que o Cometa  se afastava do Sol poderia ser visto mais cedo e mais brilhante atingindo pelo cálculos o dia 11 de abril como mais favorável. Na palestra do dia 07 de março ficou combinado que se o tempo colaborasse seria feita a primeira tentativa de observação do Halley. No dia 13 de março as 04:00h da manhã, o GEA partiu com quatro membros para o Morro da Lagoa região leste da Ilha de Santa Catarina. Em um carro foram eu e Celso Pereira no carro do Antônio Lucena e Avelino Alcebíades Alves. O céu estava parcialmente nublado, e temperatura agradável típica de uma noite de verão litorânea.

Ao chegarmos ao topo da Morro podemos notar que já não éramos os primeiros, famílias inteiras com binóculos e lunetas e outros curiosos disputávamos espaços privilegiados. Acredito que cerca de 50 pessoas ou mais,  já estavam próximas ao Mirante do Morro da Lagoa, observando o céu na direção leste semiencoberto. Mas muitos foram recompensados, pois entre algumas aberturas foi possível observá-lo bem como sua calda próximo  das 06:00h da manhã.           

13 de março de 1986 às 04:00h da manhã 

 Imagem do Halley | 13 de março de 1986

Como não consegui observá-lo não pude estimar a sua magnitude aparente, mais muitos curiosos segundo a imprensa saíram satisfeitos do Mirante por terem visto mesmo que por alguns instantes um Halley nebuloso e já poderiam contar para os seus filhos e netos, que assim como seus avós tinham visto também o cometa descoberto por Edmund Halley. As melhores estimativas estavam sendo previstas para meados de abril, mas as melhores registros fotográficos foram feitos por Avelino Alcebíades Alves,  através de seu telescópio newtoniano no dia 17 de março, que emplacou uma bela foto no Jornal  e a seguinte manchete no jornal “O estado”: “Astrônomo Festeja Foto do Halley”. Avelino fez a foto em sua casa no bairro da Agronômica onde residia,  com uma maquina marca Kapza tipo caixote, utilizando-se de um filme ASA 125, com três menitos de exposição. Avelino explica que a máquina estava acoplada ao seu telescópio newtoniano com espelho de 100mm. A mesma  apresentando o núcleo denso  do cometa e foi obtida quando mesmo encontrava-se na constelação do Sagitário.

Foto de Avelino Alcebíades Alves feita em sua casa no bairro da Agronômica

A medida que  se chegava ao fim de março e início de abril o Halley era visto mais cedo, porém o seu brilho também  se mostrou mais fraco do que esperado, devido ao seu afastamento do Sol e da posição de sua calda que estava perpendicular ao ao observador do hemisfério Sul terrestre. Houve noites no mirante do Morro da lagoa que haviam cerca de 400 pessoas mas praticamente o astro se confundia com as estrelas mais brilhantes do céu decepcionando todos os presentes.

Logo vieram as perguntas de quem seria culpa por um fiasco tão grande? Da imprensa? Dos astrônomos que não souberam estimar o brilho do Cometa? Do comércio que queria vender binóculos e lunetas? Talvez um conjunto de culpados quem sabe, mas que teve um ponto positivo que foi dar início ao Grupo de Estudos de Astronomia da UFSC. 

Na sexta feira anterior a ao dia primeiro de agosto  de 1986 o Grupo se reúne para confeccionar o calendário de palestras do segundo semestre que fica sim composta: 01/08 Generalidades sobre Astronomia (Steiner); 08/08 Saturno (Adolfo); 15/08 Asteróides (Ilson); 22/08 Chuvas de meteoros (Avelino); 29/08 Vento solar (Leonardo); 05/09 Superfícies equipotenciais (Nilton); 08-12 e 15-19/09 Curso 1 – Curso Livre de Introdução à Astronomia; 26/09 Mecânica celeste (Nilton); 03/10 Mecânica celeste (Nilton); 10/10 Buracos brancos e buracos negros (Pinho);17/10 Evolução das estrelas (Adolfo); 24/10 Entrega de certificados do curso; 31/10 Estrelas de raios X (Pinho); 07/11 Estrelas duplas (Lucena); 14/11 Estrelas duplas (Lucena); 21/11 Quasares (Pinho); 28/11 Estrelas variáveis (Lucena); 05/12 Palestra sobre o Sistema Solar para o público em geral; 12/12 Tamanho do universo (Nilton).

No dia 29 em uma assembléia extraordinária antes da uma palestra, foi oficializada a fundação do Grupo de Estudos de Astronomia,  com data retroativa a 02 de Dezembro de 1985. Por iniciativa de Newton Tesserolli, que tinha interesse em transformar o Grupo em uma entidade sem fins lucrativos, foi sugerido a confecção de lavrada uma ata de fundação e também delegado a Ele a confecção do estatuto, que foram aprovados por aclamação. A assembléia decide então considerados como sócios fundadores, todos os sócios até a presente data: Avelino Alves, Nilton cunha, Antônio Lucena, Arildo Souza, Adolfo Stotz, Ilson Wilmar, Oscar Lobo, Newton Tesseroli, Luiz Alberto Pinho, Luiz Cláudio, Sérgio Schmiegelow, Claudemir Marcos Rodetski, Edison Otto, Tânia Maria de Souza, Milton Felício Nóli, Celso Pereira, José Geraldo Mattos, José Erci Narcizo e  Nelson Antônio Losi.

Primeiro Logotipo do GEA | Créditos: Ivan Martins

Também foi decido naquela noite que a data de fundação seria retroativa a 02 de dezembro de 1985, dia Internacional da astronomia, uma vez que o Grupo já vinha se reunindo sistematicamente desde 1984. Após a fundação Newton Tesseroli da os primeiros passos para legalização do Grupo, faz o cadastro Junto a Receita Federal a entrar com pedido de lei municipal para reconhecimento da utilidade pública. A primeira diretoria ficou assim constituída: Presidente Nilton de Oliveira Cunha; Vice Presidente Avelino Alcebíades Alves; Secretário Arildo João de Souza; Tesoureiro Adolfo Stotz Neto; Coordenador de Observações Avelino Alcebíades Alves ; Coordenador de Programação Antonio Conedera de Lucena; Conselheiro Newton Tesserolli; Conselheiro Milton Felício Nolli; Conselheiro Luis Cláudio Garcia Fernandes; Suplente José Alberto Pinho. No mês de setembro entre os dias  08 e  19  é proferido o primeiro curso de introdução à astronomia ministrado pelo Grupo de Estudos de Astronomia denominado: “Primeiro Curso Livre de Introdução à Astronomia”, o título no caso, aproveitando o embalo da época da abertura militar neste caso transportado para astronomia.
 

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